Fundação Florestal decide agir na Ilha Anchieta depois de 39 anos
Demorou. Como tudo que diz respeito ao litoral, é assim que acontece, quando, e se, acontece alguma ação do poder público em relação ao bioma marinho. Não à toa, já se tornou bordão neste site a expressão o litoral está ao deus-dará. É inacreditável a omissão. Um dos mais belos e ricos litorais do planeta não mobiliza o grande público, muito menos os responsáveis. Basta um olhar mais atento para vermos a especulação imobiliária detonando metro a metro, com obstinado rigor, a zona costeira. Construções em cima de manguezais, restingas destruídas, concreto nos costões, entre outros, estão se tornando o padrão não só em São Paulo mas em todo o País. Agora, depois de exatos 39 anos, a Fundação Florestal, responsável por todas as ‘áreas protegidas’ paulistas, finamente decide agir na Ilha Anchieta. Devemos comemorar?
A introdução de espécies invasivas
De acordo com cientistas a maior causa de perda de biodiversidade no mundo é o desaparecimento de habitats. A segunda, a introdução de espécies invasivas. Sem predadores naturais, elas se proliferam e tomam o lugar da fauna nativa.
No Brasil temos casos emblemáticos. Um deles foi a invasão do mexilhão dourado que entrou no País via a água de lastro de algum navio oriundo da Ásia. Ele dominou o lago Guaíba e, depois, tomou conta de rios da Argentina, Brasil (São Francisco), e ameaça chegar até a Amazônia.
Outro caso, foi a chegada do peixe leão, espécie do Indo-Pacífico, em águas de Fernando de Noronha. Ou a invasão do coral sol, igualmente natural dos Oceanos Índico e Pacífico que está se alastrando em todo o Sul e Sudeste e Nordeste do País, inclusas todas as ilhas paulistas.
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Criado em 1977, o Parque Estadual Ilha Anchieta ‘protege’ a segunda maior ilha do Litoral Norte do Estado de São Paulo, com 828 hectares, 17 km de costões rochosos, sete praias e uma cobertura vegetal de Mata Atlântica.
Apesar do objetivo de resguardar a biodiversidade, em 1983 a Fundação Parque Zoológico introduziu mais de cem animais exóticos de 15 espécies diferentes. Entre elas, capivaras, saguis, tatus, quatis e cutias. Algumas não resistiram ao novo habitat outras, entretanto, se multiplicaram de forma impressionante.
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Quando fiz meu primeiro documentário sobre Anchieta, em minha estreia na TV Cultura, exatos 17 anos atrás, fiquei espantado com a proliferação das espécies e as consequências. O problema não é exclusivo. Grande parte das ilhas brasileiras sofre do mesmo mal desde a época da descoberta. A diferença é que naquela época ninguém sabia o que seria “ecologia”.
Cobrança ao presidente da Fundação Florestal, Mário Mantovani, em vão
Já escrevi inúmeros posts sobre isto. E cobro o diretor da Fundação, Rodrigo Levkovicz e, da mesma forma, seu presidente, Mário Mantovani. Em vão. Quando já perdia a esperança, eis que nossos diligentes funcionários decidem agir!
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Fundação Florestal quer controlar as populações de capivaras e saguis da Ilha Anchieta
Demorou demais para acordarem de seu sono letárgico. Contudo, enquanto dormiam a população de aves pequenas quase desapareceu da Ilha Anchieta. Os saguis adoram comer ovos de passarinhos. No passado, quando ia para lá, antes mesmo da criação do parque, me encantava a quantidade de saíras coloridas, e tiês-sangue, com sua cor exuberante em meio ao verde.
Ou da vegetação que se tornou almoço e jantar de centenas de capivaras que a consomem há 39 anos com apetite voraz. Ao fazê-lo, impedem a regeneração da vegetação muito maltratada ainda antes da ilha se tornar parque. ‘Assim,’ diz a matéria, ‘impactam também a fauna que de algum modo depende das plantas para sobreviver, como por exemplo animais frugívoros, animais que nidificam e/ou se alimentam em árvores.’
É por estes motivos que não se vê mais passarinhos na ilha. Zero! E nada da FF agir. Agora, informa o Tamoio News, ‘a FF pretende começar um trabalho de manejo reprodutivo de capivaras e saguis-do-tufo-preto no Parque Estadual Ilha Anchieta (PEIA).’
Duas licitações que juntas somam valor de R$ 890.404,96
‘Para isso, abriu duas licitações que juntas somam valor de R$ 890.404,96 com a finalidade de contratar empresas que prestem serviços técnicos de captura, castração e marcação dessas espécies.’
Finalmente, diz o Tamoio News, ‘o controle populacional das capivaras e saguis está na pauta da próxima reunião do Conselho Consultivo do PEIA, que será realizada no dia 19 de outubro, com início às 09h e término às 12h, de forma online.’
Antes de mais nada, se tivessem feito isto 20 anos atrás, ou mesmo 10 anos, em vez de gastarem quase um milhão de nossos impostos, teriam investido menos da metade. Mas, como são dinheiros públicos, e nossos gestores, ‘diligentes’, demoram 39 anos para, finalmente, agir.
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Este ato, ou falta de, sinaliza igualmente o fim agonizante do PSDB. Lembremos que hoje a FF é gerida por este partido político. O mesmo que já teve em seus quadros figuras legendárias como Franco Motoro, que tombou a Serra do Mar, e Mário Covas, que abraçou a causa do Tietê, entre outras questões ambientais.
Mas que, depois destes titãs, enveredou pela política rasa, com governadores nanicos que contribuíram para o lamentável fim do partido e sua hegemonia em São Paulo.
Que o próximo eleito lembre-se de que, para os paulistas, cuidar de fato do meio ambiente é, sim, muito importante.