Estuário Santos-São Vicente pede socorro: está afogado em microplástico
Resultados preliminares de um estudo que está sendo realizado no Estuário de Santos-São Vicente são desanimadores para a vida marinha no litoral paulista. O ecossistema está sendo afogado em milhões de micropartículas de plástico. Análises de sedimentos coletados em vários pontos mostram alta concentração de microplástico no fundo do Sistema Estuarino.
A média é de 30 mil partículas de plástico por grama de sedimento. Em alguns pontos, os pesquisadores encontraram até 80 mil microplásticos por grama. O estudo é conduzido pela organização sem fins lucrativos Instituto EcoFaxina. E tem como parceiros o Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares (Ipen) e a Universidade Estadual Paulista (Unesp).
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“O ideal seria não ter plástico, tampouco microplástico. Eles não deveriam estar presentes nos ecossistemas. Principalmente, nos mais frágeis, como os manguezais, que precisam ser preservados (Saiba mais). Mas essa média de 30 mil é extremamente alta. Mostra que o Estuário de Santos-São Vicente está totalmente contaminado por microplástico”, diz William Rodriguez Schepis, diretor-presidente do EcoFaxina. Microplásticos, como o próprio nome já explica, são pedaços microscópicos de plásticos. Esses fragmentos medem até cinco milímetros. Mas foram encontrados nos sedimentos do Estuário microplásticos com menos de 0,25 milímetros. É o que revela o estudo iniciado em 2018 e que deverá ser concluído no primeiro semestre de 2020.
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O caminho do microplástico até o ser humano
Descartados no meio ambiente, materiais plásticos como sacolas de supermercados, embalagens, garrafas pets, canudos e copos plásticos, entre outros, se degradam sob a ação do sol e da água. Mas a decomposição pode levar centenas de anos. Enquanto isso, eles se quebram cada vez mais em minúsculas partículas. A Organização das Nações Unidas (ONU) estima que existam mais de 51 trilhões de microplásticos nos oceanos. Eles se acumulam no fundo das águas, explica Schepis, que também é biólogo marinho. Assim, contaminam organismos filtrantes, como ostras e mexilhões. Além de serem ingeridos por peixes, siris e caranguejos, entre outras espécies que alimentam diariamente milhões de pessoas mundo afora. Daí, contaminam os seres humanos.
Poluição por microplástico atinge todo o litoral paulista
Não há estudos ainda que comprovem todos os malefícios para a saúde das pessoas. Mas pesquisas indicam que populações que comem muito pescado e frutos do mar concentram muito microplástico no organismo. Em média, segundo algumas pesquisas, uma pessoa come até 121 mil microplásticos por ano. “No próprio Estuário de Santos-São Vicente temos a Vila dos Pescadores, além de outras comunidades que se alimentam basicamente de peixes e frutos do mar. Elas pescam para a sobrevivência, mas vendem também o excedente.” Segundo Schepis, a poluição do Sistema Estuarino de Santos-São Vicente não fica restrita apenas a essas duas cidades da Baixada Santista. Ela atinge todo o litoral paulista. Ou seja, a contaminação vai muito além, levada pelas correntezas.
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“No litoral paulista, a grande fonte de poluição é o Estuário de Santos e São Vicente, que deveria estar preservado e sendo fiscalizado. As principais origens de plásticos nas praias são os rios e estuários, que sofrem com descartes irregulares de lixo. Com as marés, eles são levados para os oceanos, que devolvem parte nas praias. Esses resíduos plásticos chegam aos estuários e rios por precariedade na coleta e reciclagem de lixo e também por falta de saneamento básico”, observa Schepis. Microplásticos também estão presentes em cosméticos e tecidos sintéticos, que chegam aos rios, mares e estuários, principalmente, por falta de tratamento de esgoto. Uma vez que são expelidos na lavagem de roupas e em banhos.
Baixada Santista, mais de 80 mil sem saneamento básico
O biólogo lembra que mais de 80 mil pessoas vivem em palafitas nas cidades de Santos, São Vicente, Cubatão e Guarujá. “São comunidades sem atendimento na área de saneamento.” O que transforma o Estuário em praticamente um lixão a céu aberto. Conforme Schepis, o estudo faz parte da tese de doutorado da estudante do Ipen Giovanna Gimiliane. Em setembro, ela apresentou os resultados parciais em workshop durante a 2ª Conferência Portuguesa sobre o Lixo Marinho, em Portugal. “É um estudo representativo. Foram coletados sedimentos do fundo de vários lugares do Estuário, desde o canal do porto (de Santos) até o canal de São Vicente, Ilha Barnabé, Canal Piaçaguera, Largo Pompeba e Casqueiro.” Ainda assim, Santos é referência em saneamento básico no Brasil.
Águas das praias estão contaminadas por microplásticos
Por essa abrangência, o estudo revela que os microplásticos, além do plástico visível, estão presentes ainda nas águas das praias. A solução é garantir que 100% do esgoto seja coletado e tratado e coleta e reciclagem de lixo. Bem como consumo e descarte conscientes pelos cidadãos. Enquanto isso não acontece, outra solução é a retirada do plástico que chega ao Estuário. Desde 2009, o próprio EcoFaxina tenta sensibilizar o poder público para a coleta e destinação adequada dos plásticos que chegam aos manguezais da Baixada Santista. A entidade tem um projeto de recuperação do Estuário, que prevê a retirada de resíduos sólidos e destinação adequada do lixo.
Projeto para coletar plásticos do Estuário
Schepis diz que o projeto envolve postos de trabalho e geração de renda à comunidade local, especialmente a que vive em palafitas. Esses trabalhadores seriam capacitados para coleta, triagem e recuperação dos manguezais. Denominado Sistema Ambiental de Coleta de Resíduos, ele ainda não saiu do papel por problemas burocráticos, diz Schepis. O projeto inclui a contenção desse plástico por meio de ecobarreiras a serem implantadas no Estuário, nas marés cheias. Após a contenção, os resíduos seriam coletados em barcos e levados a um galpão de triagem, a ser construído. Lugar onde os resíduos coletados podem ser selecionados e encaminhados à reciclagem, compostagem e aterros sanitários, de acordo com a triagem.
Projeto financiado por empresas
O galpão também poderá servir como um ecoponto para atender as cidades do entorno. Com investimento inicial de R$ 600 mil, o EcoFaxina já tem investidores privados para financiar o projeto. São especialmente empresas que precisam se enquadrar na Política Nacional de Resíduos Sólidos. Mas ainda depende que a área pública cedida para o seu funcionamento conste no contrato da instituição com a Prefeitura de Santos. “É uma questão de segurança jurídica”, diz o biólogo. A área para construção do galpão e funcionamento do projeto fica às margens do Estuário, na Vila Manoel, em Santos. Foi cedida pela União. “O poder público não tem gastos nesse projeto, que será totalmente financiado pela iniciativa privada. A contrapartida do poder público é apenas a área, além da destinação final dos rejeitos”, explica Schepis.
Fontes: https://www.atribuna.com.br/cidades/estudo-p%C3%B5e-estu%C3%A1rio-de-santos-e-s%C3%A3o-vicente-em-alerta-1.79331; https://www.institutoecofaxina.org.br/blog; https://www.aplixomarinho.org/workshopmicroplasticos.