Descoberta da Antártica, um assunto controverso
Quem descobriu o Brasil? E quem descobriu a América? Qualquer criança aprende no ensino médio. Livros oficiais registram que, no primeiro caso, teria sido Cabral; no segundo, Cristóvão Colombo. Descoberta da Antártica, único continente com três descobridores.
Descoberta da Antártica
Segundo a Britânica, “Muitas nações, grandes e pequenas, desempenharam papéis importantes na descoberta e exploração da Antártica. Quem viu o continente pela primeira vez é controverso. O líder da expedição russa Fabian Gottlieb Thaddeus von Bellingshausen, o inglês Edward Bransfield e o americano Nathaniel Palmer reivindicam os primeiros avistamentos em 1820.
Bellingshausen avistou uma borda de gelo continental em 20 de janeiro; dois dias depois, Bransfield avistou uma terra que os britânicos consideraram mais tarde uma parte continental da Península Antártica; e em 18 de novembro Palmer viu inequivocamente o lado da península continental do Estreito de Orleans.”
Fabian Gottlieb von Bellingshausen
Thaddeus von Bellingshausen, 1778 – Estônia, Império Russo – 1852, explorador que liderou a segunda expedição para circunavegar a Antártica (1819 a 1821) cujo nome homenageia o Mar de Bellingshausen, uma porção de mar a oeste da península Antárctica, entre a ilha Alexandre I e a ilha Thurston.
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Edward Bransfield, 1795-1852, capitão inglês e explorador antártico, também faz parta da história da descoberta da Antártica. Em 1820, navegou do Chile para as Ilhas Shetland do Sul, ao norte da Península Antártica.
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Depois de reivindicar a ilha King George (onde o Brasil tem sua base) para a Inglaterra, se aventurou para o sul, avistando e mapeando porções do continente antártico. Acredita-se que tenha sido o primeiro a avistá-lo.
Bransfield também foi homenageado pela toponímia local. Seu nome batizou o Estreito de Bransfield, porção de mar que tem, ao norte as ilhas Sethland do Sul, e ao sul, a península antártica.
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Nathaniel Brown Palmer, Connecticut, Estados Unidos, 1799 – 1877. Foi um capitão baleeiro, considerado o codescobridor da Antártica. Também foi homenageado. A atual Península Antártica era chamada de Península Palmer.
Hoje, na Antártica, uma das muitas bases norte-americanas chama-se Palmer, localizada na Ilha Anvers. E também há a ‘Terra de Palmer’.
Três em um?
Pois é, a Antártica é o único continente que tem três em um. Mas não é só. Diz a Britânica que “muito antes dos geógrafos europeus da Idade Média e do Renascimento conjecturarem sobre a mítica Terra Australis, uma lenda maori fala de uma canoa polinésia da Nova Zelândia, sob o comando de um Ui-te-Rangiora, que navegava pelo menos tão ao sul quanto o oceano congelado.”
Mas, apesar de vir da Britânica, instituição acima de qualquer suspeita, a história da canoa polinésia não passa de…lenda, como diz o texto. Tirando a fantasia, para os americanos mais aguerridos, a descoberta é atribuída a Palmer; já os russos ou os ingleses animosos, atribuem o feito aos seus conterrâneos.
Independente de quem viu primeiro o quê, a história da descoberta da Antártica é fantástica. E vale ser mais conhecida.
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Toponímia na Antártica
Esta é outra questão controversa no continente. Muitos países adotam um nome próprio para os mesmos locais. Mas há exceções. A península, que já se chamou Palmer, desde 1966 houve consenso e passou a chamar-se Península Antártica.
Apesar disso, sua parte norte é conhecida como Graham Land, pelos britânicos; e a sul, Palmer Land, pelos norte-americanos…Todos homenageiam seus heróis.
Os americanos, o caçador de focas e explorador; os britânicos, em homenagem à expedição geofísica e de exploração levada a cabo entre 1934 e 1937.
Um mapa revelador da história da descoberta da Antártica
Basta uma olhada atenta ao mapa para ver os nomes daqueles que tiveram papel relevante, seja na descoberta, seja na exploração do ‘último continente’.
E são nomes que fazem brilhar os olhos dos que gostam de exploração com e maiúsculo: Ross Sea, em homenagem ao inglês James Ross; Amundsen Sea, para lembrar a façanha do norueguês que venceu Robert Scott na corrida à Antártica, depois tornando-se o primeiro a chegar aos dois polos; Weddel Sea, em homenagem ao escocês James Weddel; Estreito de Gerlache, para lembrar o belga Adrien de Gerlache, o primeiro a invernar na Antártica.
E mais, o francês Dumond d’Urville também virou nome de um mar, a sudoeste do continente, e assim por diante.
Uns mereceram, outros não?
Entretanto, outros, que são tão notáveis quanto os primeiros na conquista da Antártica, como James Cook ou Ernest Shackleton, não receberam a mesma homenagem, ou quase.
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O nome do monstro sagrado do ‘período heroico’ acabou batizando uma pontinha irrelevante de gelo, a leste, a Shackleton Ice Shelf. Mas James Cook não foi lembrado, apesar de seus esforços…
Este post tem como objetivo lembrar aqueles que se distinguiram na descoberta e exploração do continente hoje dedicado à pesquisa.
Terra Australis Incógnita
“Estamos no século IV a.C. e, nas alamedas sombreadas do Liceu de Atenas, Aristóteles caminha com seus discípulos, debatendo um tema bastante óbvio para os intelectualmente curiosos: a natureza esférica da Terra, em contraposição à tese do planeta em forma de disco chato elaborada pelos gregos antigos dos tempos homéricos.”
“Os argumentos de Aristóteles se baseiam na observação dos fatos: as constelações mudam quando se viaja para o Norte ou para o Sul e durante um eclipse a sombra da Terra projetada na Lua sempre apresenta a forma curva.”
A esfericidade da Terra
‘A esfericidade da Terra’, conclui Aristóteles, ‘está provada pela evidência de nossos sentidos’. Consequentemente – devido ao senso de equilíbrio, ordem e simetria dos gregos -, deveria haver também uma massa de terra ao sul, a fim de contrabalançar a massa de terra ao norte.”
Este é o primeiro parágrafo da obra-prima da literatura de viagens do ex-projetista de barcos, Alan Gurney, Abaixo da Convergência.
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Um pirata que ‘desdenha o Tratado das Tordesilhas’
Sim, a suposição da existência da Antártica existe desde quatro séculos antes de Cristo. Mas só muito tempo depois, começa efetivamente a descoberta, por diversos exploradores, piratas e até caçadores de focas, do que viria a ser a Antártica.
Na próximo capítulo, falamos de um pirata que ‘desdenha o Tratado das Tordesilhas’ e atravessa o Estreito de Magalhães em 16 dias.
A partir deste ponto, leitor, sempre que um trecho estiver entre aspas, saiba que trata-se do livro mencionado.
Sir Francis Drake
Saltamos para 1578, pouco mais de 50 anos depois que o nauta lusitano Fernão de Magalhães, na primeira circunavegação do globo, descobriu o estreito que leva seu nome. Então, um segundo e ousado navegador decidiu repetir o feito…
Como diz Gurney, ‘o belicoso e barbudo arquétipo do guerreiro elizabetano desdenha o Tratado de Tordesilhas e atravessa o estreito de Magalhães’. E, sem o saber, passa a fazer parte da história da descoberta da Antártica.
Depois de entrar no Pacífico, ventos e tempestades o arremessam para sudoeste. Quando os ventos amainam, Drake segue para o noroeste e aporta na ilha onde fica o cabo Horn, ou próximo a ela.
Ele afirma que é o homem que se encontra mais ao sul do mundo inteiro: O cabo ou promontório extremo (…) fica a 56º (…), de onde não se vê terra firme ou ilha em direção ao sul, e sim o encontro dos oceanos Atlântico e Pacífico numa imensa e livre amplidão…
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Drake não sabia, mas acabava de abrir ‘a estrada’ que levaria os intrépidos pioneiros à Antártica, o Estreito de Drake, a porção de mar que liga o extremo da América do Sul ao Continente Gelado.
James Cook, o Círculo Polar Antártico e o oceano austral
Navegador, explorador e cartógrafo inglês, James Cook (1728 – 1779) no ano de 1769, a bordo do HMS Endeavour, foi escolhido para levar os membros da Royal Society para observar o trânsito de Vênus na primeira expedição científica pelo Pacífico.
A viagem foi um tremendo sucesso. Cook não só ajudou na observação, como descobriu o que chamou de Ilhas da Sociedade, na Polinésia Francesa, e mapeou a Nova Zelândia. De quebra, descobriu a costa da Austrália.
Poucos anos depois, nova viagem. Em 1772, Cook parte para uma circunavegação no comando das naus Resolution e Adventure. Durante este périplo marítimo atingiu a mais alta latitude ao sul alcançada até então (70°10”S), cruzando pela primeira vez o Círculo Polar Antártico. Era parte da missão descobrir o continente que se supunha existir desde quatro séculos antes de Cristo.
Durante a viagem, Cook navegou pelo que batizou de ‘oceano austral’, nome não contestado por nenhuma nação com interesse na Antártica. Esta foi a derradeira parte da ‘estrada’ aberta no final do século anterior por seu conterrâneo, o pirata queridinho da rainha Elizabeth, Francis Drake.
Cook não foi feliz na descoberta, por mais que se esforçasse. Mas se convenceu de sua existência. E chegou bem próximo.
Segundo Alan Gurney, ao atingir o ponto mais ao sul (70°10”S),”Os tripulantes do Resolution não sabiam, mas a costa da Antártica estava a cerca de 90 milhas.”
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Em seu diário de bordo, escrito em 6 de fevereiro de 1775, Cook vaticinou: Acredito firmemente na existência de uma extensão de terra próxima ao polo, que é a origem da maior parte do gelo espalhado por todo este vasto oceano austral.
Os caçadores de focas e os baleeiros, 1785
Nos aproximamos do derradeiro capítulo da descoberta da Antártica. Desta vez o foco são caçadores de peles de foca, e baleeiros.
“No verão de 1785, William Rotch, comerciante de óleo de baleia, mandava notícias a seu irmão Francis no novíssimo país dos Estados Unidos da América. Rotch fora para Londres para apresentar ao governo britânico uma proposta inusitada.”
“A guerra da Independência havia sido desastrosa para a indústria baleeira americana, ele queria levar para a Grã-Bretanha toda a indústria baleeira de Nantucket e, junto, a competência americana no que dizia respeito à caça de baleias para benefício do Estado britânico.”
“Ele acabara de ler o relato de Cook sobre suas viagens, e o que atraiu sua atenção foi uma menção a peles. Aparentemente, os marinheiros ingleses tinham vendido peles de foca para a China ‘pelo altíssimo preço de 100 dólares cada.”
Foi o que bastou para aquela mente comerciante.
Companhia Britânica das Índias Orientais
“A companhia Britânica das Índias Orientais detinha o monopólio do comércio com a China: exportava para lá mercadorias e especiarias, além de ópio contrabandeado da Índia, e trazia chá…Francis Rotch passara a maior parte dos anos da guerra de Independência nas Ilhas Falklands (ou Malvinas? Saiba mais) no comando de uma frota baleeira.”
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“Sabia existirem na região milhares de focas fornecedoras de peles…em 1784 um navio zarpara em busca de peles de focas e leões-marinhos; o barco regressou a Nova York com sua carga em 1786, negociando 13 mil peles de focas por 6500 dólares. A notícia de lucros tão fabulosos espalhou-se rapidamente.”
Semi extermínio nas décadas seguintes a 1875
“Durante as décadas seguintes, os caçadores de focas se espalharam das ilhas Falklands para a costa da Patagônia e Geórgia do Sul…Uma vez descoberta uma praia com focas, os caçadores trabalhavam até que não restasse nenhuma viva.”
“O mesmo aconteceu com os elefantes-marinhos e suas reservas de gordura, em camadas que podem chegar a mais de 12 centímetros.”
Encerrado o massacre, desciam mais ao sul…
Elefantes-marinhos produzem o óleo
“Derretida a gordura, os elefantes-marinhos produzem o óleo procurado pelos caçadores, como a gordura das baleias. Segundo os caçadores, um barril de gordura produzia um barril de óleo. Pelos padrões modernos, esses atos são imperdoáveis.”
“Mas no final do século 18, e início do 19, o óleo de elefante-marinho e o da baleia lubrificavam máquinas, iluminavam as ruas de vilas e cidades, bem como as lamparinas de casas. A sociedade dependia do óleo (como a nossa ainda depende do petróleo…).”
Ilhas Shetland do Sul, Antártica, na segunda metade do século 19
Elas ficam a 60 milhas da Península Antártica, e cerca de 500 do cabo Horn; e passam a fazer parte do que chamamos de Antártica.
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“Quando a segunda metade do século 19 chegava ao fim, essas ilhas ainda não haviam sido descobertas.”
Mas, a esta altura, as focas e elefantes-marinhos do extremo da América do Sul, e das ilhas Geórgia do Sul, já haviam sido dizimadas. Era preciso ir mais longe para continuar a matança.
Máquinas, e iluminação de cidades, não param. Foi por isso que baleeiros e foqueiros passaram a fazer parte da história da descoberta da Antártica.
Fevereiro de 1819: a ilha Livingston é descoberta
“Em fevereiro de 1819, um pequeno navio de 25 metros de comprimento e 8 metros de boca (largura) armado como brigue de dois mastros, de nome Williams, comandado por seu capitão, o ex-baleeiro William Smith, de Northumberland, Inglaterra, viajava pela América do Sul.”
“Smith conduzia o navio em direção a Valparaíso, pela rota do cabo Horn, com uma carga mista de ferro fundido e forjado, algodão, e outros. Vendavais constantes vindos de Oeste obrigaram-no a rumar para o Sul antes de dobrar o cabo, em busca de ventos mais amenos.”
“Pouco depois da madrugada de 19 de fevereiro, avistaram terra adiante, a cerca de seis milhas. Smith estimou a latitude em 62ºS. Ele batizou a terra com o nome de seu navio e hoje em dia a extremidade da ilha Livingston é chamada de ponta Williams.”
O comandante não sabia, mas acabava de descobrir a segunda maior das Ilhas Shetland do Sul…
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Ilha Deception, descoberta em 1820 por William Smith
No ano seguinte, depois de reparar o casco de seu pequeno navio de madeira, Smith parte novamente para sua terceira viagem à volta do Horn.
“Desta vez ele estava decidido a encontrar sua terra.” E rumou para o Sul, mais uma vez. Em 15 de outubro, avistou terra a nove milhas de distância. Era a ilha Decepction a cerca de seis milhas de sua descoberta anterior.”
Não por acaso, Deception se tornaria um importante centro de processamento, e o mais mortífero, de baleias na Antártica. Hoje é dos locais mais visitados por turistas em cruzeiros, ou viagens privadas (Saiba mais sobre Deception e a matança de baleias).
“Chegara o momento de retomar seu curso para Valparaíso, e entregar seu carregamento. Podia também relatar sua descoberta com certo grau de satisfação. Ninguém, nem mesmo oficiais da Marinha Real, poderia duvidar da veracidade e do valor evidente de suas descobertas. Smith não perdeu tempo em reportar suas descobertas à Marinha Real.”
Ainda em 1820, a descoberta da ilha King George
Depois de um certo tempo, a Marinha decidiu fretar o navio Williams para nova viagem em direção às ilhas descobertas. E colocou no comando “um certo Edward Bransfield…”
“As instruções para Bransfield eram para verificar se as Shetland do Sul eram ilhas ou se faziam parte de um continente; medir latitudes e longitudes…observar o caráter dos habitantes, se houvesse, e finalmente tomar posse de todas as descobertas…”
“Em 16 de janeiro de 1820, chegaram à ilha Livingston…de lá navegaram para o nordeste…Na altura de 22 de janeiro haviam passado pelo lugar do desembarque anterior de Smith, rodeado o promontório Norte, costeado o curto litoral leste da ilha e entrado em uma ampla baía na costa sul.”
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“Ali desembarcaram e Bransfield plantou um mastro com bandeira britânica, enterrou moedas do reino numa caixa de metal e reivindicou a soberania britânica. A ilha foi chamada de King George (já mencionada neste texto).”
Mais um que, sem querer, entrou para a história da descoberta da Antártica.
O caçador de focas, Nathaniel Palmer chega na Antártica
“No dia seguinte ao do hasteamento da bandeira por Bransfield, outro navegador aportou na ilha Rugged (a oeste de Livingston). Era o brigue americano Hersilia, de 131 toneladas…”
“Partira de Stonungton em julho de 1819, sob o comando de um experiente caçador de focas, James Sheffield, um de seus oito proprietários. O segundo imediato era Nathaniel Palmer, de vinte anos de idade…em viagens posteriores, Palmer ganharia um lugar na hagiografia polar americana…”
“Em apenas 16 dias de matança e esfolamento, os americanos zarparam com 8868 peles. Poderiam levar ainda mais, porém o sal havia se esgotado.”
Assim, quase por acaso, Edward Bransfield e Nathaniel Palmer também entram para o rol dos descobridores da Antártica.
Bellingshausen, 27 de janeiro
“Enquanto os caçadores de focas tratavam de seus interesses, Bransfield partiu de King George no dia 27 de janeiro rumo ao sudoeste…No mesmo dia, a 1400 milhas a leste e 420 mais próximo ao polo sul, dois navios militares russos cruzavam o Círculo Antártico e rumavam para o Sul sob flocos de neve, em um clima gélido e sombrio.”
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“O tempo melhorou e os russos puderam fazer observações solares. Estavam na latitude 69º 21’S. Segundo o comandante da expedição, adiante do navio estendia-se ‘uma extensão contínua de gelo, que estava coberto por colinas geladas‘. O que os russos viram era a plataforma de gelo da orla desta parte da Antártica. Na verdade, era a primeira visão da Antártica.”
Assim foram as descobertas das ilhas periféricas da Antártica, e do próprio continente, por intrépidos marinheiros, sejam eles comerciantes, ou baleeiros e caçadores de focas, e exploradores como Bellingshausen.
E justifica a inédita divisão entre três descobridores, cada um por seus motivos, mas simultaneamente.
William Smith, 29 de janeiro
“Por volta de 29 de janeiro, o Williams já percorrera 80 milhas do litoral destas ilhas de aparência desolada, avistara terra (a Ilha Deception) logo envolta em nevoeiro, voltando-se para o sul dessa ilha logo puderam ver melhor as cadeias de montanha da Península Antártica que atingem pouco mais de 2 mil metros.”
“Como registrou um dos guarda-marinha em seu diário, era ‘a visão mais sombria que se possa imaginar, e a única alegria despertada pelo panorama era a ideia de que pudesse ser o continente austral tão longamente procurado’. Bransfield o batizou de ‘Terra da Trindade parcialmente coberta de neve’ e assim registrou em seu mapa. O guarda-marinha estava correto: na verdade o que via era parte da Antártica, alguns dias depois de os russos a terem avistado.”
Palmer, 21 de março
“Poucas semanas após o regresso do Williams a Valparaíso, o Hersília, em 21 de março de 1820, chegava a Stonington com seu carregamento de peles de foca – vendidas a 22 146,49 dólares – e com a eletrizante notícia de um paraíso para os caçadores ao Sul do Cabo Horn.”
A antártica emerge; as focas e elefantes-marinhos, naufragam…
Com estas descobertas simultâneas, Terra Australis Incógnita finalmente sai do limbo, no rastro dos mamíferos marinhos que nele mergulham profundamente. Não foram extintos por milagre.
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Meio milhão de animais mortos
“O extermínio das focas das Shetland do Sul durante esses poucos meses é assustador. James Weddel estimou em 320 mil o número de peles levadas da ilha em duas estações, além de 940 toneladas de óleo de elefantes-marinhos.”
“Como a matança era indiscriminada, ele calculou também que mais de 100 mil filhotes morreram devido à morte de suas mães…Mais de 200 mil peles de foca chegaram ao mercado londrino depois da temporada 1820-1, trazidas por menos da metade da frota de caçadores. O total de focas mortas pode ter chegado a meio milhão, segundo cálculos conservadores.”
“No verão subseqüente, o da temporada 1821-2, somente 40 caçadores retornaram às Shetland do Sul. Era o golpe final contra as focas-de-pelo, que foram virtualmente exterminadas das ilhas.”
As coincidências não param; conheça o destino dos protagonistas
“Sabemos o destino das focas-de-pelo (Elas conseguiram se regenerar, assim como elefantes-marinhos. A mesma sorte não tiveram algumas espécies de baleias, como a Azul).”
“Mas o que aconteceu aos homens cujas rotas cruzaram-se na Antártica durante aqueles poucos meses? William Smith morreu na miséria em um asilo para indigentes, esquecido e obscuro. Bransfield e Bellingshausen, os dois oficiais da marinha, faleceram no mesmo ano de 1852; o primeiro em situação confortável, deixando à viúva uma pensão anual de de 50 libras; o russo como almirante e governador de Kronstadt.”
História da descoberta da Antártica
A história da descoberta da Antártica está longe de terminar com esta primeira pincelada. Este capítulo procurou por luz sobre os três descobridores, e aqueles que os antecederam abrindo o caminho.
Em nova matéria, publicada em breve, falaremos dos outros nomes mencionados, e dos homens que se destacaram no que se convenceu chamar de ‘período heroico’, um dos mais belos e dramáticos da exploração geográfica humana.
Fonte: Abaixo da Convergência – Expedições à Antártica 1699 – 1839, de Alan Gurney. Companhia das Letras.