Delegação da Comunidade Europeia para a pesca: uma farsa
Aos poucos o jornal inglês The Guardian tem se tornado o mais importante do mundo nas questões ambientais. O jornal participa ativamente do debate sobre as questões climáticas, mas não se restringe a elas. É um dos que mais abrem espaço para os esquecidos (pela mídia) oceanos e seus inúmeros problemas. E não se acanha, ao contrário, em denunciar as maracutaias da Comunidade Europeia que se pretende uma ‘perfeição’ em termos ambientais. A UE adora dar lição de moral, contudo, debaixo do tapete há sujeira, mentira, e desfaçatez.
Delegação da UE para pesca é uma farsa
A matéria do Guardian sobre esta farsa ganhou o mundo. Diversos veículos e mídias sociais repercutiram, ou mesmo reproduziram, a denúncia. Consideramos essencial dar visibilidade a esta farsa, especialmente porque o Parlamento Europeu aprovou uma lei que obriga empresas a comprovarem que produtos não venham de áreas desmatadas de nenhum lugar do mundo, num óbvio movimento para barrar as exportações do agronegócio brasileiro. Nem assim a mídia tupiniquim dá espaço às inúmeras baixarias da UE nos oceanos do planeta.
Antes de mais nada, vamos nos lembrar que os oceanos e seus recursos são um bem da humanidade. Nenhum país, ou grupo de países, tem mais direito que outros. Esta, por sinal, é a grande dificuldade da governança deste espaço que corresponde a 70% de nosso planeta.
Comunidade Europeia e China na vanguarda da extinção da vida marinha
Contudo, um bloco, a Comunidade Europeia, e um país, a China, têm se sobressaído na dilapidação dos recursos vivos, ou seja, peixes e frutos do mar. A China, depois de esgotar os cardumes em sua ZEE passou a fazê-lo no mar territorial de países mais pobres, especialmente da África e América do Sul.
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Recentemente, mostramos como a UE dilapida cardumes de atum no Índico, em detrimento dos países pobres da África e Ásia. Além disso, suas frotas de pesca são mortais, equipadas com os mais modernos recursos da tecnologia que não dão a mínima chance aos cardumes. Entre outros absurdos, a UE aprovou o uso de redes de arrasto elétricas!
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Agora veio a gota d’água que faltava. Segundo o Guardian Mais da metade da delegação da UE de um órgão crucial de reguladores do estoque de atum é composta por lobistas da indústria pesqueira.
A maracutaia da União Europeia
As questões da pesca, assim como da governança dos oceanos, têm suas discussões em fóruns mundiais. Um deles, talvez dos mais importantes, seja o IOCT, ou Indian Ocean Commission (Comissão do Atum do Oceano Índico), um braço da ONU.
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Grécia proibirá pesca arrasto de fundo em áreas marinhas protegidasPesca sem controle no Brasil diminui populações de recifes de coraisMarinha do Chile destaca submarino para vigiar pesca ilegalA comissão tenta colocar um pouco de ordem na caótica pesca mundial do atum, neste caso, no Índico. Trata-se de uma indústria de US$ 4 bilhões, segundo o jornal inglês. O Guardian descobriu que na última reunião anual da IOTC a delegação de 40 membros da UE era composta por pelo menos 24 lobistas da indústria da pesca listados como “conselheiros”.
Raposas para cuidar do galinheiro!
Ou seja, a União Europeia coloca raposas para cuidar do galinheiro! E tem a cara de pau de fazê-lo em um fórum mundial sob patrocínio da ONU.
‘A porcentagem de lobistas na delegação oficial da UE vem aumentando desde 2015, quando o atum albacora foi declarado sobrepescado por cientistas da IOTC. Um relatório de janeiro da Bloom, uma ONG francesa, calculou que o número anual de lobistas industriais dentro da delegação da UE mais do que dobrou nos últimos anos, passando de uma média de oito em 2015 para 18 em 2021.’
O Guardian ouviu Jess Rattle, chefe de investigações da Blue Marine Foundation: “A UE abandonou totalmente esse sentimento em favor da pilhagem dos estoques já sobreexplorados do Oceano Índico, com a certeza de que, uma vez que todos os peixes tenham desaparecido, sua frota altamente desenvolvida pode simplesmente se mudar para outro oceano, ao contrário dos muitos estados costeiros deixados para trás, com nada.”
Navios de pesca que usam a bandeira de Seychelles
Contudo, a baixaria da UE não se resume apenas aos delegados travestidos. Sabendo que precisa apoio de outros países nestes fóruns, a UE tem 13 navios de pesca que usam a bandeira de Seychelles. Já explicamos este expediente deplorável no post Navios com bandeira de conveniência, número explode.
Assim, em fevereiro aconteceu uma votação da IOTC proposta pela Indonésia para proibir por 72 dias os “dispositivos de agregação de peixes”, conhecidos como FADs, ou seja, Fish Aggregating Devices, usados por embarcações sobretudo europeias. Decisão adotada pela Comissão do Atum do Oceano Índico (IOTC).
Além do dispositivo ser mortal, captura desproporcionalmente juvenis de atum, ele contribui para a morte da vida marinha em geral. O jornal explica: ‘Os FADs são grandes jangadas flutuantes que atraem peixes ao projetar uma sombra. Isto facilita a captura de grandes quantidades de atum pelas embarcações. De maneira idêntica, contribuem para a sobrepesca de albacora porque atraem juvenis, bem como tartarugas, tubarões e mamíferos em risco de extinção que são apanhados quando os dispositivos são cercados por redes de cerco.’
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‘Os dispositivos, normalmente feitos de plástico, também poluem o oceano e pequenas ilhas quando perdidos ou descartados.’
Contudo, no início de abril a UE se opôs à medida ‘isentando-se efetivamente das restrições’. Em outras palavras, adotou a mesma cara dura da China. Seychelles, pela prática das ‘bandeiras de conveniência’, foi atrás. Do mesmo modo votaram Comores, Omã, Filipinas e Quênia, acrescenta o Guardian.
“Suas objeções podem ser vistas como uma forma de neocolonialismo da UE”, disse Rattle. “Esta medida foi votada na IOTC, não apenas por maioria, mas por maioria de dois terços. Ao se opor e provocar objeções de seus estados vassalos, a UE está deixando claro que continuará a pescar da maneira que deseja, independentemente. Isso é vergonhoso.”
Assim age o bloco europeu nos mares do planeta. Afinal, que moral eles têm?