Reserva Biológica de Santa Isabel, Espírito Santo
Reserva Biológica de Santa Isabel: Entenda
Reserva Marinha, ou “Rebio marinha,” para os íntimos, é uma das 12 categorias de Unidades de Conservação do Brasil. De acordo com o ICMBio a “Rebio” faz parte do grupo das Unidades de Conservação de “proteção integral”, ou seja, o grupo mais restritivo. ”
Nelas, como regra, só se admite o uso indireto dos recursos naturais, isto é, aquele que não envolve consumo, coleta, dano ou destruição, com exceção dos casos previstos na Lei do Sistema Nacional de Unidades de Conservação (SNUC).”
OPINIÃO DESTE SITE
O cidadão comum não pode sequer visitar este tipo de Unidade de Conservação, o que considero uma aberração.
Se a área tem valor em termos de biodiversidade, a primeira coisa que deveria acontecer é sua abertura aos brasileiros para que conheçam, entendam, admirem e aprendam a defendê-la e preservá-la.
Mas, como disse o grande Tom Jobim, “o Brasil não é para amadores”… por isto, de acordo com o ICMBio “a visitação pública é proibida, com exceção da de caráter educacional, segundo o definido em Plano de Manejo da unidade.
A pesquisa depende de autorização prévia do Instituto Chico Mendes e também está sujeita às condições e restrições por ele estabelecidas.”
Características:
Bioma : Marinho Costeiro.
Criação: Dec nº 96.999 de 20 de outubro de 1988
Localização: litoral norte de Sergipe, municípios de Pirambu e Pacatuba.
Área: 5.547,42 hectares
Tipo: Proteção Integral.
Objetivo: “preservar a natureza, livrando-a, o quanto possível, da interferência humana”.
Plano de Manejo: não há plano de manejo
Objetivos da Reserva Biológica de Santa Isabel
Proteger a fauna local e áreas de desovas de tartarugas marinhas; proteger lagoas, dunas, restingas, manguezais e florestas remanescentes; favorecer a manutenção das condições de vida das comunidades e acesso aos serviços ambientais (água, praia limpa, meios de vida, lazer, etc).
Reserva Biológica de Santa Isabel e Litoral de Sergipe
A primeira coisa que se impõe, é comentar que o litoral de Sergipe é quase sempre esquecido quando se fala ‘nas belezas’ do litoral brasileiro.
Puro engano. O que acontece ali é muito parecido com a costa do Rio Grande do Sul, também pouco famosa pela beleza natural. Em ambos os casos, basta atravessar a faixa de areia para você se deparar com uma planície costeira espetacular. Em outras viagens já visitei o litoral sergipano de norte a sul. Desta vez estive na parte norte.
A parte Sul é muito bonita, inclusive as praias. E a divisa entre Sergipe e Bahia, o rio Real, é espetacular. Vale a pena ser mais explorado. Quanto ao litoral norte, ele é formado basicamente por apenas uma enorme linha de praia que vai mudando de nome conforme surgem as cidades, ou acidentes geográficos.
E assim segue até à foz do rio São Francisco. Por causa da vazão do rio, as águas deste setor são, na maioria do tempo, de cor marrom, influenciadas pelo despejo do Velho Chico.
A planície costeira é espetacular
Já a planície costeira é espetacular. Formada por dunas, restingas, coqueirais e lagoas. O conjunto é maravilhoso. Vale a pena fazer uma viagem de carro, beirando a praia (sempre pela estrada, é proibido trafegar na praia justamente pela quantidade de ninhos espalhados), até Ponta dos Mangues, pequena cidade às margens do São Francisco. Você verá paisagens de tirar o fôlego.
De estranho nesse trajeto, apenas os cavalos de ferro, enormes estruturas de extração de petróleo que se vê de tempos em tempos. Como se sabe, Sergipe foi um dos primeiros estados do país a extrair o mineral, seja na parte terrestre ou marinha.
Reserva Biológica de Santa Isabel: artesanato contribui para amenizar êxodo
Fizemos a viagem acompanhados pelo chefe da UC, Paulo Faiad, através da única via que existe: um estradão de terra com cerca de 50 quilômetros.
A estrada começa pouco ao norte de Pirambu, local de sede da UC, e segue até Ponta dos Mangues. No trajeto é possível conhecer o trabalho de artesanato feito por mulheres e filhos de pescadores. Vale conhecer a Associação de Artesanato e Apicultura dos povoados de Tigre e Junça.
Com o objetivo de complementar renda, essas pessoas desenvolvem um trabalho tecendo objetos com a Taboa, abundante na região, que são uma beleza.
Cestas, bolsas, vasos, chapéus, uma infinidade de itens. As peças são vendidas em feiras fora, e dentro de Sergipe, e têm contribuído para diminuir o êxodo de jovens que não veem futuro na pesca ou na agricultura.
Aberração brasileira: 12 tipos de Unidades de Conservação
Voltando à estrada, e ao deslumbrante cenário da planície costeira de Sergipe, eu disse ao Paulo que não me conformava com os 12 tipos de Unidades de Conservação do Brasil, muitas delas restritivas, impedindo sua visitação, ou o desenvolvimento do ecoturismo, e do turismo de aventura. Como proibir que o brasileiro comum conheça áreas tão espetaculares como essa, indaguei?
A Lei do SNUC- Sistema Nacional de Unidades de Conservação- mostrengo jurídico
A Lei do SNUC, de Julho de 2000, pode ter sido criada com as melhores intenções mas é apenas mais um mostrengo jurídico que, em vez de ajudar, atrapalha. Ao longo das visitas que tenho feito descobri inúmeras incoerências, e várias UCs que tentam mudar de categoria, quando seus chefes percebem as armadilhas em que caíram. É inútil.
Não conseguem uma recategorização mesmo com apoio das chefias, ambientalistas locais e, especialmente, das comunidades onde foram inseridas. Não admira a imensa quantidade de conflitos criados em cada local onde existe uma UC. O povo não entende, os políticos, prefeitos e vereadores, muito menos. A reclamação é generalizada e, na maioria das vezes, com total razão.
Ainda assim, o ICMBio faz ouvidos moucos.
UCs lutam para mudar de categoria
Entre as que procuram mudar de categoria estão a Rebio do Arvoredo, em Santa Catarina, ESEC Tupiniquins, ao sul de São Paulo, a estrambólica Arie do Ameixal, também no sul de São Paulo.
UCs no exterior
Em outros países onde pesquisei sobre áreas protegidas existem apenas Parques Nacionais, ou, no caso das áreas marinhas, as MPAs, sigla para Marine Protected Area.
E cada uma delas tem suas regras em função de suas especificidades. Em outros textos já abordei essa questão dos 12 tipos. Cheguei a escrever que seis seriam mais que suficientes. Mudei de opinião. Hoje defendo no máximo duas.
Reserva Biológica de Santa Isabel e a Carcinicultura
Infelizmente, a praga também está disseminada em Sergipe. A diferença é que neste estado ainda não existem grandes empresas explorando a criação de camarões. Aqui ela é praticada por pequenos proprietários.
Ainda assim, os problemas ambientais são os mesmos: poluição, corte de mangues, conflitos sociais com aqueles que exploram os manguezais, etc.
Reserva Biológica de Santa Isabel e a especulação Imobiliária
Sergipe não foge à regra comum a todos os estados costeiros. O estradão de terra, mencionado acima, está prestes a ser pavimentado. Só por isso os preços de terrenos mais que triplicaram. E começa o assédio aos posseiros. Uma das pessoas que entrevistei contou que um antigo prefeito comprou um terreno por 30 mil reais.
Ao chegar a informação da pavimentação, o mesmo terreno foi vendido por 350 mil. O novo proprietário já recusou ofertas no valor de um milhão. E não cedeu…É a especulação que dá as cartas no litoral.
TAMAR, exemplo do litoral
Em Ponta dos Mangues há mais uma base do TAMAR. Este é um dos projetos de maior sucesso da costa brasileira. Um trabalho épico que começou no final dos anos 70 por inspiração de Maria Tereza Jorge Pádua, na época trabalhando no IBDF (Instituto Brasileiro de Desenvolvimento Florestal).
No mundo existem sete espécies de tartarugas marinhas, cinco frequentam o litoral brasileiro e estão ameaçadas de extinção. Quatro espécies, Cabeçuda, de Pente, Oliva e de Couro, desovam em praias de nosso litoral.
De acordo com o site do Tamar “A tartaruga-verde (Chelonia mydas) está menos exposta, pois desova principalmente nas ilhas oceânicas (Atol das Rocas, Fernando de Noronha e Trindade), onde a ação predatória do homem é mais controlada, o que contribui com a estabilidade da sua população.” Segundo o mesmo site, “de cada mil tartarugas apenas duas conseguem atingir a maturidade.”
Quando fico desanimado com a situação de semiabandono do litoral brasileiro, do pouco caso do público com a vida marinha, e da ridícula situação das poucas Unidades de Conservação da zona costeira, lembro do caso das tartarugas.
Quando comecei a frequentar o mar, em 1967, era muito raro ver uma tartaruga no mar. Como elas desovam em praias, seus ovos eram facilmente localizados e se tornavam alimento para estas populações.
Depois do excepcional trabalho de conscientização dos nativos/pescadores pelo pessoal do Tamar, aos poucos a situação mudou. Hoje, é raro eu sair para o mar e não ver ao menos um par de tartarugas.
Situação da Reserva Biológica de Santa Isabel
Como em todas as outras unidades federais faltam recursos, pessoal e equipamentos. Atualmente a UC conta com três analistas ambientais, um técnico e um auxiliar de escritório (ambos em idade de aposentadoria). Como equipamentos a unidade tem duas caminhonetes, uma moto um quadriciclo, e um bote de borracha com motor de 50 hp.
Perguntei ao Paulo qual equipe, e equipamentos, ideais para que possa cumprir plenamente suas funções. A resposta é desanimadora porque não acredito que consiga: ao menos 10 analistas ambientais, mais um barco, dois quadriciclos (para andar na praia e áreas alagadas é fundamental), e mais um carro. E além disso, melhoras na sede para que possa alojar com um mínimo de conforto os pesquisadores que lá trabalham.
Regularização fundiária na Reserva Biológica de Santa Isabel
Em Santa Isabel existe outro sério problema, também comum a todas as outras UCs federais marinhas: a falta de regularização fundiária.
Desde que a UC foi decretada, e a área desapropriada, antigos proprietários não foram indenizados. Como resultado dentro da área ‘protegida’ há plantações de coco, e gado pastando.
Mais uma descoberta da péssima atuação do ICMBio
Ao longo de minhas viagens, e conversas com os gestores das unidades, aos poucos descubro aspectos assustadores sobre a atuação do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade. Chegou a hora de contar mais um, que tem a ver com os gestores das unidades.
Não há uma regra quanto à escolha de um gestor
Pelo que depurei, e essa é uma opinião pessoal, não há uma regra quanto à escolha de um gestor para determinada unidade.
A decisão tanto pode vir do ICMBio, como a escolha pode ser do próprio funcionário quando percebe uma vaga. Também não há um período mínimo, ou máximo para um gestor continuar no cargo na mesma UC. Até aí, nada demais em se tratando de Brasil.
Nenhum gestor tem metas a cumprir
O mais espantoso, entretanto, é que, ao que me parece, nenhum gestor tem metas a cumprir. Se a pessoa for boa ou ruim, se trabalha ou não trabalha, se traz resultado ou não, tanto faz. Ele não é cobrado por metas, algo inimaginável em qualquer situação.
É possível imaginar uma situação dessas na iniciativa privada? Óbvio que não. Desde crianças somos cobrados e temos metas a cumprir. Ou isso, ou não avançamos, não passamos de ano.
Mas, no ICMBio, é isso que acontece nas Unidades de Conservação federais brasileiras. Se o gestor for bom, sorte nossa. Se passar o dia no computador jogando paciência, mesmo que seja por 20 anos seguidos, continua lá, recebendo o mesmo salário.
É possível um absurdo desses?
Talvez seja exatamente por isso que muitas UCs federais marinhas estão paradas no tempo desde sua criação. Repito que essa é uma impressão pessoal, fruto das conversas até agora mantidas com as chefias, mas que pode mudar já que ainda faltam cerca de 30 UCs a serem visitadas.
Apesar de minha impressão, Paulo Faiad ressalta que “temos metas a cumprir sim, inclusive temos um sistema moderno, premiado, de acompanhamento de metas, o que falta são os meios para atingi-las. E muitos gestores, brilhantemente conseguem contornar essa falta de meios e atingir as metas, indo atrás de parcerias. Um exemplo são os gestores que conseguem fazer parceria com as universidades para que elas façam os levantamentos para a elaboração do Plano de Manejo, ao invés de esperar por recursos para contratar uma consultoria… recursos que podem nunca chegar.”
Mudanças no ICMBio
Dia 12 de maio mudou a presidência do ICMBio. Já não era sem tempo. O que saiu, Roberto Vizentin, no cargo desde 2012, não deixará saudades.
Ao assumir, em julho de 2013, Roberto respondeu a três perguntas feitas pelo jornal O Globo. Elas são emblemáticas e dizem respeito a questões que tenho levantado sistematicamente.
Primeiro: maior visibilidade, ou seja, divulgação, dos Parques Nacionais.
Segundo: a falta de estrutura dos Parques Nacionais (e eu acrescentaria, de todas as Unidades de Conservação em geral).
Terceiro: ampliar a associação com a iniciativa privada (como venho defendendo, seja através da facilitação e indução da criação de novas RPPNs, ou ainda através das PPPs).
As respostas foram todas positivas mas, o que se viu, foi apenas o discurso. Em outra reportagem, feita à época em que assumiu o cargo, Vicentin disse que a prioridade seria a regularização fundiária, a criação de novas UCs marinhas, e maior acesso aos parques nacionais. Três anos depois percebe-se que tudo não passou de blá-blá-blá…
Em seu lugar assumiu Cláudio Carrera Maretti.
Esperamos que o novo presidente mude radicalmente o órgão. E, do discurso banal e repetitivo, passe efetivamente para a ação.
Do jeito que está o ICMBio não nos serve.
SERVIÇOS
Como foi dito, uma Rebio não pode ser visitada pelo público comum.
Ainda assim é possível conhecê-la. Basta ir até Pirambu, escolher uma pousada e, com um carro, fazer a viagem que fiz até Ponta dos Mangues.Vale a pena!
Mais informações sobre a UC:
COORDENAÇÃO REGIONAL / VINCULAÇÃO: CR6 -Cabedelo
ENDEREÇO / CIDADE / UF / CEP: Reserva Biológica Sta Isabel, s/n Pirambu/SE – CEP: 49.190-000
TELEFONE: (79) 3276-1799 / (79) 9895-2802
E-MAIL: rebio.santaisabel@icmbio.gov.br
Assista ao documentário que produzimos durante a visita à Rebio de Santa Isabel