Monumento Natural das Ilhas Cagarras, RJ
Monumento Natural das Ilhas Cagarras, RJ: entenda
Categoria de Unidade de Conservação que tem como objetivo básico preservar sítios naturais raros, singulares e/ou de grande beleza cênica. Pode ser constituído por propriedades particulares, desde que haja compatibilidade entre os objetivos da unidade com a utilização da terra e dos recursos naturais por parte dos proprietários. Se não houver compatibilidade, a área é desapropriada. É permitida visitação aos monumentos naturais, e a pesquisa depende de prévia autorização do Instituto Chico Mendes.
Características:
BIOMA: Marinho Costeiro
Município: Rio de Janeiro.
ÁREA: 105,93 hectares
DIPLOMA LEGAL DE CRIAÇÃO: Lei Nº 12.229, de 13 de abril de 2010
Tipo: Proteção integral.
Plano de manejo: publicado
Monumento Natural das Ilhas Cagarras, RJ: caderno de anotações
Para os navegadores esportivos, não cariocas, este arquipélago só existe na carta náutica. Localizado quase na entrada da baía de Guanabara, ele serve de referência. Sinaliza a hora de entrar baía adentro.
Comigo foi assim. Já estive no Rio, de barco, um sem-número de vezes mas jamais parei, ou prestei muita atenção. Apesar do nome curioso, a formação rochosa de longe não impressiona. Por isso quase sempre as ilhas ficam na esteira de quem demanda a barra.
Monumento Natural das Ilhas Cagarras, RJ, quintal dos cariocas
Para os cariocas é diferente. As Cagarras estão na porta de suas casas, a apenas cinco quilômetros de Ipanema. Um arquipélago todo só para eles.
Mergulho, pesca, exploração, escalada, passeio rápido nos finais de semana, ou apenas parte da paisagem de quem vai à praia, passa na avenida, ou mora nos apartamentos da orla.
Assista ao documentário que produzimos durante a visita ao Monumento Natural das Ilhas Cagarras.
A pesca profissional e esportiva
Quem mais frequentava o arquipélago eram pescadores profissionais. Eles não davam sossego com suas redes. Quando não eram os profissionais, vinham os pescadores submarinos, ou os esportivos munidos de varas. Às vezes os dois grupos atuavam ao mesmo tempo.
Era esta a impressão que eu tinha da rotina de usos destas ilhas, até que sua transformação em UC, em 2010, a levou a frequentar as páginas dos jornais.
A lembrança que tenho era de reclamações, especialmente por parte de mergulhadores.
Mona – categoria restritiva, prós e contras
“Mona”, ou ” Monumento Natural” é uma categoria de proteção integral, restritiva, do Sistema de Nacional das Unidades de Conservação, o ” SNUC“.
Ao redor de cada ilha há um espaço proibido para a pesca de dez metros (como se fosse fácil determinar quando estamos dentro, ou fora deste limite…). Aproveito para mais uma vez chamar a atenção para a quantidade de tipos de UCs no Brasil: são 12 categorias, muitas delas equivocadas, como a Mona, que propõe estes “dez metros de proteção”. Quem vai medir? Quem vai fiscalizar?
O pior é que, se conseguirem a façanha, a próxima pergunta que se impõe encerra o assunto: de que adianta proteger 10 metros? Quem vai dizer aos peixes para que se mantenham nesta faixa de segurança?
Seis categorias de UCs já seria de bom tamanho. Mais que isto é confusão, burocracia.
Observações sobre o MONA
Quanto ao Mona, tenho algumas observações. Como lado negativo vejo esta questão dos “dez” metros como erro principal. O lado positivo é que navegar e fundear na UC não está proibido.
Portanto, a liberdade de todos os cidadãos usufruírem da beleza da área está garantida. Já a vida marinha continua sem proteção, o que considero o segundo erro.
A importância maior de uma Unidade de Conservação, com as características das Cagarras, é proibir totalmente a pesca em seu entorno. Único modo que vejo para garantir que nossos mares não se tornem um deserto de vida inanimada.
A nossa visita ao Monumento Natural das Ilhas Cagarras, RJ
Finalmente estive no arquipélago. E me arrependi por ter demorado tanto. É lindo. Formado por quatro grandes ilhas, Cagarras, Palmas, Comprida e Redonda, e duas ilhotas, Filhote da Cagarras, e Filhote da Redonda.
Se a toponímia não mostra grande imaginação, a conformação do conjunto, sua posição no pequeno espaço marítimo, o perfeito formato esférico de uma delas, a gigantesca quantidade de aves marinhas que aqui nidificam, fazem do todo um local espetacular. A área não é muito grande, são 87 hectares, incluindo a parte emersa e o raio de dez metros ao redor de cada ilha.
Estrutura da equipe do Monumento Natural das Ilhas Cagarras, RJ
A UC não tem barco. A equipe, como sempre, mínima. Em minha visita não pude encontrar o chefe que estava em um evento fora do Rio. Assim não tive como conversar com Henrique Zaluar sobre a estrutura ideal, ou os prejuízos de uma UC num arquipélago sem que a unidade tenha alguns barcos. Mais uma vez, fico chocado com esta demonstração de pobreza.
Felizmente, o pessoal que cuida da UC se aproximou da ONG Instituto Mar Adentro, que criou o Projeto Ilhas do Rio, com apoio da Petrobras. E eles têm feito um belo trabalho em conjunto!
Já disse em outros textos de minha frustração quanto ao trabalho efetivo das equipes que cuidam das UCs federais. A minha impressão, reforçada pelas recentes visitas, é que aquelas que têm plano de manejo facilitam o trabalho das chefias sobre o discurso a fazer durante entrevistas.
Normalmente mostram segurança sobre a melhor rotina para a fiscalização, como priorizar os variados problemas, mediar os conflitos, etc. Sinto isto em quase todas as visitas: conversa, muita conversa.
Há respostas para cada problema apontado, mas ação mesmo, não vi. Ou vi muito poucas. Algumas vezes percebi que a chefia estava finalmente conhecendo a área de sua unidade devido às filmagens e aos passeios que exijo fazer (importante ressalvar que, em dois casos, chegamos para gravar dois meses depois das novas chefias assumirem).
Ao contrário do que imaginava, grande parte dos chefes das UCs passam mais tempo em seus gabinetes, atrás de computadores, que no mato ou ao largo, checando as condições, fiscalizando o entorno, conhecendo seus segredos.
O trabalho da equipe do Monumento Natural das Ilhas Cagarras, RJ
Nas Cagarras, unidade de conservação com apenas quatro anos, fui testemunha das várias ações da equipe. Acompanhado pela coordenadora do projeto Ilhas do Rio, Aline Aguiar, conheci o trabalho em diferentes frentes. Também nos acompanhou o oceanógrafo Athila Bertoncini, da ONG Mar Adentro.
Sítio arqueológico no topo da ilha Redonda
O Projeto Ilhas do Rio descobriu até mesmo um sítio arqueológico no topo da ilha Redonda. Coisa raríssima de acontecer em ilhas. Atualmente refinam os dados da pesquisa feita numa primeira fase, onde houve um levantamento das espécies de peixes (618) e cetáceos que frequentam o local (golfinho fliper).
A avifauna e a flora também estão sendo catalogadas. Prosseguem os estudos arqueológicos, e o levantamento do embarque pesqueiro (não está proibida a pesca, desde que respeitada a distância de dez metros de cada ilha…).
Finalmente, a equipe desenvolve um trabalho que visa controlar e monitorar o capim colonião, espécie exótica que ameaça tomar o lugar dos remanescentes de mata atlântica, cobertura vegetal original das ilhas.
Desembarquei para ver de perto como funciona esta ação. Numa determinada área onde predominava, esta gramínea foi arrancada e o local demarcado com cabos, uma espécie de canteiro. No interior foram plantadas mudas tiradas das próprias ilhas, depois de germinadas no Jardim Botânico. A ideia é acompanhar a reação das plantas para, no momento certo, substituir de vez o colonião.
Pode parecer pouco, mas não é. Passei por diversas ilhas onde os chefes apontam as espécies exóticas sem desenvolver qualquer plano ou trabalho para erradicá-las. Esta é a primeira vez que vejo um trabalho efetivo, ainda que em início.
Esgoto da Zona Sul, sem tratamento, é ameaça à vida marinha para o Monumento Natural das Ilhas Cagarras, RJ
Outra das ameaças às Cagarras é o emissário submarino de Ipanema cuja ponta final está muito próxima da ilha de Palmas. Este emissário não passa por estação de tratamento. É esgoto da Zona Sul jogado in natura no mar .
Já foi detectado que as águas próximas ao emissário “impactam e comprometem a qualidade química e sanitárias do mar da região.”
Em estudo recente eles recolheram e analisaram amostras de água, da superfície e do fundo, na entrada da Baía de Guanabara, na Redonda, e na ilha das Palmas. O resultado não poderia ser outro: “em algumas amostras de água do fundo foram observados valores de oxigênio inferiores ao valor mínimo de oxigenação previsto pela Resolução 357 do CONAMA para águas destinadas a recreação, proteção das comunidades aquáticas, a aquicultura ou a pesca.”
Coliformes fecais: nível é 460 vezes maior que os níveis sanitários permitidos
A mesma contaminação foi verificada com relação aos coliformes fecais cujo nível é 460 vezes maior que os níveis sanitários permitidos.
Além da coleta de água a equipe também analisa a concentração de poluentes nos costões rochosos, e ovos de aves marinhas das Cagarras. Foram observados “alto índice de assimilação e acumulação de metais pesados nas aves, e índices preocupantes de hidrocarbonetos nos mexilhões.”
A área onde deságua o emissário também foi medida. Como não poderia deixar de ser estava 67% acima do permitido para águas de superfície, e 83% de amostras acima do permitido, em águas do fundo.
Finalmente, na Ilha de Palmas, mais próxima da boca do emissário, os índices estavam superiores ao da Redonda, mais distante.
Descobrir todos estes aspectos em apenas quatro anos, a partir do decreto de criação de uma Unidade de Conservação, é algo inédito para mim. E merece ser destacado.
Finalmente chego à uma UC no auge do entusiasmo, no frenesi das descobertas, e o início dos trabalhos de regeneração.
O resumo das amostras indica que “apesar da qualidade das águas dentro da Mona Cagarras serem consideravelmente melhores que as de seu entorno, é nítida a influência dessas fontes de poluentes na região protegida”.
Monumento Natural das Ilhas Cagarras, RJ: animais exóticos na ilha Comprida
Outra descoberta infeliz foi saber que existem cerca de 20 a 30 coelhos na ilha Comprida. Como foram parar lá, ninguém sabe. Provavelmente obra de algum turista, ou morador de Ipanema se desfazendo do bicho de estimação. Urge tira-los de lá. Coelhos se proliferam de modo rapidíssimo e destroem a vegetação já frágil da ilha.
Para esta ação ainda não há planos, só a certeza de retirá-los. Já para a questão do esgoto há um caminho árduo, e provavelmente demorado, mas cedo ou tarde será feito.
Instalar uma estação de tratamento em Ipanema. Pronto, problema resolvido.
A dúvida dos autores do estudo é saber se os moradores do bairro aceitariam o “benefício” que poderia desvalorizar seus imóveis, ou afetar a paisagem da praia. A solução seria uma estação hipermoderna subterrânea, provavelmente mais cara, mas ainda assim, obrigação básica de qualquer governo.
Mais uma boa notícia: a equipe Mar Adentro faz as mesmas pesquisas na Ilha Rasa, na Maricás e nas Tijucas. O objetivo é “ampliar o conhecimento sobre a biodiversidade do litoral do Rio de Janeiro, e possibilitar a comparação entre as ilhas Cagarras e as do entorno, o que possibilitaria a demonstração dos efeitos dos limites do Mona na proteção do ecossistema.
Parabéns ao pessoal da Mar Adentro, e sorte e sucesso ao pessoal da UC. Aparentemente as Cagarras estão em mãos muito boas, e comprometidas.
Só isso já merece nossa torcida e aplauso. Não por outro motivo, em 2021 O Mission Blue, uma aliança internacional para a conservação marinha, confirmou a impressão do Mar Sem Fim e declarou as Ilhas Cagarras como mais um Ponto de Esperança, ao lado de Galápagos, no Equador, ou da Grande Barreira de Corais, na Austrália.
SERVIÇOS
Não há restrições para a visitação ao arquipélago das ilhas Cagarras. Apenas a pesca não é permitida no limite de dez metros de cada ilha.
De acordo com o site do ICMBio ” A beleza do Monumento Natural das Ilhas Cagarras pode ser contemplada através de passeios náuticos, snorkeling e mergulho autônomo, sempre seguindo as normas de mínimo impacto. O local também é utilizado por esportistas da canoagem e escalada, porém o desembarque nas ilhas atualmente é condicionado à autorização da administração da unidade.”
Para mais informações consulte a direção da Unidade de Conservação: chefe da UC> Henrique Zaluar – henrique.zaluar@icmbio.gov.br – Tel. (21)
2484-7802 Cel. (21) 99608 1654