IPHAN, avacalhado, acaba com a última Canoa de Tolda
Ao escrever este post, lembrei-me de um episódio da infância que me custou 15 dias de castigo. Aconteceu quando usei, não sei por qual motivo, o termo ‘avacalhado’ na mesa de jantar. Meu pai ficou horrorizado, consequentemente, fiquei de castigo. Eu devia ter uns 10, 12 anos. Enfim, um termo pesado, reconheço. Peço desculpas aos leitores. Mas não encontrei outro para me referir ao IPHAN aparelhado por Jair Bolsonaro. Avacalhado é pouco para descrever que o órgão que tombou a última canoa de tolda do São Francisco, a Luzitânia, ao mesmo tempo acabou por enterrar este bem cultural da história náutica do País. Definitivamente, não dá pra entender.
‘A carcaça da canoa foi vendida’
Assim disse-me Carlos Eduardo Ribeiro, que salvou a Luzitânia em 1999, a restaurou, fundou uma ONG, e dedicou sua vida a fazer da última relíquia naval do Velho Chico um barco vivo que navegava garbosamente até janeiro de 2022 quando uma enchente a fez naufragar.
Por que agiu assim? Simplesmente porque é a mais bela e rica canoa do País, e a derradeira canoa de tolda do País. Ou seja, uma relíquia naval.
Desde janeiro, escrevi um par de posts sobre o problema. O primeiro foi IPHAN nega ajuda à relíquia naval tombada logo depois de saber do naufrágio, e da negativa do órgão que a tombou anos atrás.
Quando custaria para reparar a Luzitânia?
Segundo Carlos Eduardo, algo em torno de 200 mil reais, uma merreca.
Mas o IPHAN do governo Bolsonaro foi aparelhado pelo que de pior havia em suas hordas, como o foram os órgãos de Cultura, da Educação, da Saúde, e do Meio Ambiente.
E só agiu depois que Carlos entrou na Justiça e venceu. Ainda era o tempo em que a canoa estava tombada numa margem do rio e o órgão se negava a retirá-la.
Briga na Justiça
Mas, às vezes o bom senso impera. Por decisão do Juiz Edmilson da Silva Pimenta, em Ação Civil Pública ajuizada pela Sociedade Socioambiental do Baixo São Francisco, Canoa de Tolda, tendo como réu o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, IPHAN, o órgão foi condenado a:
“Efetuar em caráter de urgência, até o dia 31/01 através de pessoal qualificado e medidas seguras, a remoção da Canoa de Tolda Luzitânia para local seguro (inclusive de saques de terceiros), para que permaneça em total segurança para o processo de secagem até que ocorram as indispensáveis ações de conservação…”
Mas, apesar disto, o IPHAN demorou a tomar uma decisão. Só em março a Canoa Luzitânia foi retirada do local do alagamento.
O IPHAN resistiu….Retirou a canoa mas não garantiu seu restauro
Por fim, o órgão recorreu da decisão. No post escrevemos: “A partir de decisão da Justiça Federal, o IPHAN – Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional contratou empresa que realizou a manobra de resgate e condução da canoa Luzitânia para local onde será retirada da água para as ações de reparo e conservação.”
A partir daí, tudo foi mistério.
Canoa de tolda Luzitânia, do baixo São Francisco, uma preciosidade naval em perigo
Este é o título de outro post publicado em 25 de janeiro, quando comentamos que o Brasil tem um dos mais ricos acervos de embarcações típicas ainda em atividade.
Um bem cultural que a vasta maioria das pessoas sequer sabe da existência; mas que existem, navegam, e valorizadas pelo IPHAN que as transformou em bens culturais de um País que mal conhece sua história.
O órgão não só tombou algumas embarcações, entre elas a Luzitânia, bem como lançou o Projeto Barcos do Brasil em 2008, com o objetivo de conscientizar o público, preservar e conservar o Patrimônio Naval brasileiro.
Projeto Barcos do Brasil, do IPHAN, atenção à página 13, aparece quem? A Luzitânia que a xucra Larissa Peixoto, atual presidente do órgão enterrou para sempre
Em seguida ao alagamento…
Afinal, conversamos com Carlos Eduardo que se mostrava desanimado. Entre outras lembrou que ‘não se importam com a cultura do País, não por outro motivo o Museu Nacional pegou fogo (2018) e foi destruído em razão do péssimo estado de conservação’.
Um tesouro da cultura popular brasileira
Enquanto isto, o especialista responsável pelo tombamento da Luzitânia, Dalmo Vieira Filho, ex-Superintendente do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) em Santa Catarina, e professor concursado do Departamento de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), declarava:
Esta embarcação é um verdadeiro tesouro da cultura popular brasileira. A Luzitânia é a última destas canoas que ainda resistem no São Francisco, (vale dizer) no mundo. Ela é um dicionário de soluções técnicas, de maneiras de construir barcos, e de navegar sobre um rio como o São Francisco. É de um valor inestimável.
O post também repercutiu as palavras de outro amante das embarcações típicas, o navegador Amyr Klink.
Com o desaparecimento da Luzitânia a gente sente uma espécie de amputação cultural
Para salvá-la, Carlos Eduardo ainda lançou uma campanha para angariar fundos, mas não obteve respaldo da opinião pública, infelizmente.
Saiba mais sobre o patrimônio Cultural Naval, por certo desconhecido pela senhora Larissa Peixoto, atual presidente do avacalhado IPHAN
Você também encontra mais informações no livro Embarcações Típicas da Costa Brasileira.
IPHAN não dá satisfações
Enquanto isto, o somítico IPHAN não dava satisfações. Desse modo, apenas levou a Luzitânia para um sítio abaixo de onde naufragou e a largou por lá. Nada de repará-la.
Então, dias atrás mandei uma mensagem para o site Canoa de Tolda, perguntando como estavam as coisas.
Eis a resposta de Carlos Eduardo: “Estamos há dois meses sem qualquer notícia da Luzitânia, não sabemos como e quando foi retirada da água, como foi a operação, se está conservada após dois meses sob a água.”
“Pelo que podemos imaginar, não vemos qualquer sinal de intenção de restauro, o que valida perfeitamente tua matéria. Retiraram a canoa daqui unicamente por força judicial. Porém, recorreram da decisão do Juiz Pimenta (que estabelecia os reparos e o retorno à água), o que deixa bem claro as intenções.”
“Logo, sem perspectiva.”
Esta tem sido a postura AVACALHADA do órgão aparelhado pelo boçal, mais que ignorante inquilino do Alvorada. O frouxo, inseguro, e morbígeno que incita seu povo à guerra.
Como resultado, não há palavras fortes o suficiente para qualificar a mesquinhez do IPHAN que negou algo em torno de 200 mil reais para a manutenção de um bem cultural por ele mesmo tombado.
Larissa Peixoto, presidente do IPHAN
Se você também se revolta, mande um e-mail de protesto para: gabinete@iphan.gov.br.
No Instagram
Você também pode se manifestar no Instagram. O endereço é @IphanGovBr.
Afinal, saiba quem é Larissa Peixoto, presidente do IPHAN
Em 2021 Larissa foi afastada do IPHAN por ordem da Justiça Federal, depois de Bolsonaro (PL) demitir funcionários para favorecer o homem que usa ternos verde amarelos. O dono das lojas Havan.
Contudo, pelo entendimento do desembargador, a retirada da gestora causaria ‘inegáveis prejuízos a atividades administrativas e às políticas públicas de competência da autarquia’. E Larissa voltou ao posto.
Acima de tudo, prejuízos inegáveis é o que ela faz equilibrando-se no cargo. Segundo o jornal O Globo, ‘Larissa Rodrigues Peixoto Dutra foi nomeada presidente do Iphan em 2020, após cinco meses em que o Instituto ficou sem titular.
Por fim, desistir jamais. Persistimos na luta.
Assista ao vídeo e saiba o que especialistas acham da Luzitânia
Imagem de abertura: canoadetolda.org.br.
Fonte: https://oglobo.globo.com/cultura/entenda-polemica-arqueologica-que-acabou-levando-ao-afastamento-da-presidente-do-iphan-25325466.