A espiral fatal do degelo no Ártico: vítima mais visível do aquecimento, o degelo coloca a região no rumo de uma transformação sem volta
A espiral fatal do degelo no Ártico: em nenhuma região da terra os efeitos do aquecimento global são mais perceptíveis que no Ártico. A vida na vasta área de 30 milhões de quilômetros quadrados no extremo norte é regida por um ciclo natural de aumento e redução na cobertura gelada ao longo do ano. É esse mecanismo que agora dá sinais de estar desregulado. Desde que a Nasa, a agência espacial americana, começou a monitorar o Ártico com imagens feitas por satélite em 1979, o volume de gelo existente em setembro, o mês que sinaliza o fim do verão ártico, diminuiu 80%. Se considerados os últimos meses do inverno, a redução foi de 33%.
A espiral fatal do degelo no Ártico: até 2040 não haverá camada de gelo no Ártico
As mudanças no ciclo natural de congelamento e degelo são decorrência do aumento da temperatura média em todas as estações. No fim deste mês, o Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC), das Nações Unidas, publicará a primeira parte de seu quinto relatório. O capítulo sobre o Ártico, do qual se tem conhecimento por um rascunho preliminar que vazou em dezembro, contém indicações que podem levar a um prognóstico preocupante: até 2040, a camada congelada na superfície do Oceano Ártico deve desaparecer totalmente durante a primavera e o verão.
Aquecimento global afeta mais o Ártico do que o restante do planeta
O aquecimento global afeta mais o Ártico do que o restante do planeta. Enquanto a temperatura média da Terra se elevou menos de 0,5 grau desde 1980, no Círculo Polar Ártico o aumento foi de 1,6 grau.
O solo ártico tem alta concentração de metano, gás 23 vezes mais potente que o dióxido de carbono (CO2) para o efeito estufa, Sem a superfície congelada, que reflete 80% dos raios solares, o calor é absorvido pela água e pelo solo.Nas últimas três décadas, o leito marinho se aqueceu 3 graus. O efeito é multiplicador. À medida que se torna mais quente, maior é a quantidade de metano que libera.
A espiral fatal do degelo no Ártico: temporada de caça do urso se tornou muito curta
A alteração do ciclo de congelamento e descongelamento exerce enorme impacto na saúde do ecossistema da região. O urso polar, por exemplo, depende da cobertura congelada do oceano para caçar sua presa favorita, a foca. Como o congelamento está ocorrendo mais lentamente e o degelo mais rapidamente, a temporada de caça do urso se tornou muito curta, ameaçando a sobrevivência da espécie. “O derretimento tem superado o congelamento num ritmo tão acelerado que em 2040 provavelmente já não teremos gelo no verão e, em dois séculos, também não sobrará muito no inverno”, diz Wadhams.
O aquecimento no Ártico não é um fato novo
O aquecimento no Ártico não é um fato novo (mas que o Ártico agora também polvilhado por microplásticos, sim). Sabe-se que há aumento gradual da temperatura ao menos desde 1880. De lá para cá, subiu 2,8 graus. A hipótese provável é que o aumento na emissão de gases do efeito estufa, devido à atividade humana, como a agricultura e a indústria, seja responsável pelo aquecimento global.
PUBLICIDADE
A influência da humanidade na temperatura global é um fato novo. Períodos mais quentes e outros mais frios fazem parte dos ciclos naturais do planeta e se sucedem em escala geológica. No momento, sentimos os últimos resquícios de uma era do Gelo. Nos últimos 10 mil anos, o aquecimento natural permitiu o desenvolvimento da agricultura e a expansão da humanidade. O problema é que agora parece já não haver nada de natural nas mudanças climáticas.
O novo estudo do IPCC está sendo elaborado por 550 cientistas
No relatório a ser divulgado, o IPCC pela primeira vez considera a possibilidade de que a alta atividade solar, que se intensificou nas últimas décadas, esteja contribuindo para o aquecimento global. Seria o inverso do que ocorreu entre 1350 e 1850, período em que a baixa atividade solar provocou súbita queda na temperatura, a chamada Pequena era do Gelo. O novo estudo do IPCC está sendo elaborado por 550 cientistas, 100 a mais do que no anterior. “Estamos pressionados, conferindo tudo milhões de vezes”, disse a VEJA o economista americano Alec Rawls, revisor do relatório.
Leia também
Tundra do Ártico emite mais carbono do que absorveVanuatu leva falha global em emissões à HaiaO plâncton ‘não sobreviverá às mudanças do clima’A rapidez do aquecimento não dá tempo para que os animais se adaptem
A rapidez do aquecimento não dá tempo para que os animais do Ártico se adaptem. No próximo meio século se expandirá a fronteira conhecida como “linha da árvore”. Ela divide o Ártico em duas partes: a com e a sem árvores. Com o deslocamento da “linha”, parte da tundra deve se transformar em florestas boreais e os desertos gelados podem virar tundra.
Afirma o geólogo e glaciologista Jefferson Simões, um dos revisores do estudo do IPCC:
Essas alterações afetarão a teia alimentar mundial e também, diretamente, os quatro milhões de pessoas que moram no extremo norte. O derretimento da calota polar provocará a elevação do nível do mar
Podem ser necessários enormes investimentos para conter a incidência de enchentes em cidades litorâneas.
Fonte: Planeta Sustentável Abril/Planeta Urgente.