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Esgoto humano e seus impactos nos oceanos

Esgoto humano e seus impactos nos oceanos

Uma análise de mapeamento de alta resolução inédita estima as quantidades de nitrogênio e patógenos liberados nos ecossistemas costeiros a partir de fontes humanas de águas residuais em todo o mundo, leia-se esgoto não tratado. O Dr.Cascade Tuholske (afiliado à Columbia Climate School) e colegas da Universidade da Califórnia, Santa Bárbara, apresentam esta pesquisa na revista de acesso aberto PLOS ONE em novembro de 2021. Esgoto humano e seus impactos nos Oceanos é o tema  de hoje.

infográfico esgoto humano nos oceanos
Dá pra ver que a contribuição do Brasil é grande, varia entre os mais altos níveis da tabela, entre 9 e 12 conforme a tabela. Ilustração,

Esgoto humano e seus impactos nos Oceanos

O esgoto humano pode introduzir patógenos causadores de doenças e nitrogênio no oceano, impactando potencialmente a saúde humana, os ecossistemas costeiros, e as comunidades que dependem deles para fins como a pesca. No entanto, a maioria das pesquisas sobre o impacto dos seres humanos nos ecossistemas costeiros se concentrou no escoamento agrícola, enquanto as investigações sobre o esgoto humano foram limitadas.

Para melhor demonstrar o impacto do esgoto nos ecossistemas costeiros, Tuholske e colegas conduziram uma nova análise na qual estimaram e mapearam as entradas de nitrogênio e patógenos no oceano a partir de esgoto para cerca de 135.000 bacias hidrográficas em todo o mundo com uma resolução de 1 quilômetro.

A análise

A análise sugere que as águas residuais do esgoto humano introduzem 6,2 teragramas de nitrogênio nos ecossistemas costeiros por ano – para comparação, isso representa cerca de 40% dos insumos estimados da agricultura. Sessenta e três por cento do nitrogênio é de sistemas de esgoto, 5 por cento de sistemas sépticos e 32 por cento de entrada direta não tratada.

É uma quantidade enorme e pode levar à eutrofização e zonas mortas, entre outros problemas. A segunda grande descoberta é que a entrada de águas residuais nas águas costeiras é altamente variável. Quase metade de toda a entrada vem de cinco países e cerca de 10 grandes bacias hidrográficas diferentes.

Índia, Coréia e China

Das bacias hidrográficas que parecem liberar mais nitrogênio do esgoto, a maioria está localizada na Índia, Coréia e China, com o rio Chang Jiang (Yangtze) contribuindo com 11% do total global.

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Os pesquisadores também identificaram pontos críticos para exposição de recifes de corais ao nitrogênio na China, Quênia, Haiti, Índia e Iêmen. Pontos de exposição de ervas marinhas foram encontrados em Gana, Kuwait, Índia, Nigéria e China. Os rios Chang Jiang e Brahmaputra têm a maior entrada de patógenos.

O Brasil neste contexto

Apesar do trabalho não citar o Brasil explicitamente, apenas nos gráficos, vale a pena situar o leitor. E não estamos nada bem. Apesar de ser um direito assegurado pela Constituição, metade dos brasileiros ainda não contam com saneamento básico. E somos hoje uma população de 210 milhões de brasileiros.

De acordo com o site referência no assunto, Trata Brasil, ‘apenas “46% dos esgotos do País são tratados. Em 2017 o Brasil lançou aproximadamente 5.622 piscinas olímpicas de esgoto não tratado na natureza. E, dos mais de cinco mil municípios, somente 21, nas 100 maiores cidades, tratam mais de 80% dos esgotos’.

Só isso já justifica o estado calamitoso dos rios brasileiros, quase todos na UTI. Mas apesar dos péssimos dados de saneamento, eles não são os únicos que justificam o estado de nossos rios, por exemplo. A questão do lixo é outro problemaço do Brasil, já abordado pelo Mar Sem Fim.

Em razão desta vergonha nacional, e do custo astronômico para universalizar o serviço, em 24 de junho de 2020  foi aprovado o novo marco regulatório do saneamento básico, que prevê a entrada da inciativa privada no serviço.

Mas, voltemos à pesquisa publicada na PLOS ONE.

As maiores Bacias Hidrográficas

O site Our Shared Seas entrevistou o Dr. Ben Halpern, um dos coautores do estudo. E perguntou: Onde a poluição por esgoto no oceano parece ser mais grave e por quê?

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Ben Halpern:  “A bacia hidrográfica do rio Mississippi é algo como metade de todo o território continental dos Estados Unidos. Todos os insumos dessa área (Obs. do MSF: vindos da agricultura praticada ao logo do vale do rio) são agregados e entram no oceano em um ponto de escoamento na costa da Louisiana (Obs do MSF: Não por outro motivo, uma das maiores zonas mortas do mundo fica no Golfo do México). Como você tem muito volume, ele se espalha ao longo da costa e afeta uma grande área. A China tem duas ou três grandes bacias hidrográficas como essa, incluindo o rio YangtzeNa Europa, é a bacia do rio Danúbio.”

“O que acho menos óbvio é o trabalho que fizemos para entender onde os recifes de coral estão sendo expostos ao esgoto. Os recifes de coral ocorrem apenas em águas tropicais e subtropicais dentro desta faixa tropical ao redor do equador. Nessa parte do mundo, as bacias hidrográficas geralmente são menores, então você não obtém esse enorme efeito de bacia hidrográfica.”

Qual é o próximo passo para a pesquisa de sua equipe sobre este tópico?

Ben Halpern: “A razão pela qual entrei na pesquisa de águas residuais foi porque é uma das muitas coisas que afetam as águas costeiras e os oceanos em geral. Estamos realmente empolgados em dobrar esta pesquisa de volta a esforços ainda mais amplos, onde tentamos entender o efeito cumulativo de toda a atividade humana nas águas costeiras. Poderíamos então avaliar, por exemplo, a contribuição do impacto das águas residuais em relação à pesca e às mudanças climáticas, ou a quaisquer outras ameaças.”

Esgoto nos mares austrais

Pode parecer incrível, e de fato é mesmo, mas até nos mares austrais foram encontradas evidências de  aumento de substâncias químicas relacionadas a uma maior atividade humana no continente, seja para turismo ou pesquisa, e ao aquecimento da superfície marinha.

Cientistas do Centro de Estudos do Mar da UFPR, Universidade Federal do Paraná,  revelam o impacto da atividade humana na região da Baía do Almirantado (onde o Brasil e mais alguns países têm suas bases), uma das mais movimentadas do continente antártico.

‘A consequência do aumento dessa interferência tem sido a ocorrência de elementos e substâncias associadas ao uso do petróleo e do descarte de esgoto’.

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‘A partir de amostras de sedimento marinho, coletadas pelos pesquisadores entre os anos 2000 e 2020, que refletem a variabilidade ambiental ao longo dos últimos 60 anos, os pesquisadores utilizaram três diferentes classes de biomarcadores químicos para evidenciar as possíveis mudanças ambientais que ocorreram naquele ambiente durante aquela escala de tempo. Os materiais foram estudados pela equipe do Laboratório de Geoquímica Orgânica e Poluição Marinha (LaGPoM), vinculado ao Programa de Pós-Graduação em Sistemas Costeiros Oceânicos da UFPR’.

‘Um dos elementos analisados foi o fósforo. O fósforo tem origem natural no ambiente antártico, estando relacionado às alterações físicas das rochas e aos solos — abundantes em material orgânico produzido por aves —, mas também está presente no esgoto. Quando há atividade humana, há descarte de esgoto no ambiente e, consequentemente, os níveis de fósforo devem ser maiores do que os encontrados em períodos mais antigos, anteriores à presença frequente do homem na Antártica.

Os resultados foram publicados nas revistas científicas Marine Chemistry, Science of The Total Environment e Organic Geochemistry

A matéria completa da UFPR pode ser lida neste link.

Imagem de abertura: https://etica-ambiental.com.br/ 

Fonte: https://oursharedseas.com/wastewaterimpacts/; https://journals.plos.org/plosone/article?id=10.1371/journal.pone.0258898.

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