Caiçara do Norte, RN, mais um município tragado pelo mar
As consequências do aquecimento global são terríveis e variadas no Brasil. Enquanto o Centro-Oeste, Sudeste, e Sul enfrentam uma das secas mais fortes dos últimos anos, alguns municípios costeiros são tragados pelo mar. E enquanto isso acontece no Brasil desgovernado, sem planos para combater ou mitigar o aquecimento, os prejuízos aumentam. A prova do descaso é o fato de que apenas cinco Estados brasileiros têm metas de redução de emissões de gases de efeito estufa. A pergunta a se fazer é: esperam o quê? A subida do nível do mar, e o aumento da frequência e intensidade dos eventos extremos é uma realidade. Mas não aqui, a julgar pela omissão do poder público. Caiçara do Norte, no Rio Grande do Norte, é a nova vítima.
Caiçara do Norte, RN, mais um município tragado pelo mar
Caiçara do Norte fica no litoral norte do Estado, com uma população estimada em 6 mil habitantes (IBGE, 2010), e uma economia incipiente baseada na pesca artesanal, a produção agropecuária de subsistência e, mais recentemente, a expansão do turismo, exploração de petróleo e gás, e as famigeradas fazendas de criação de camarão.
Não é de hoje que Caiçara do Norte sofre os efeitos das ressacas. Estudo da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, de 2002, já alertava que ‘este trecho da costa norte-riograndense é fortemente vulnerável a processos erosivos’.
Como quase sempre acontece, o estudo não serviu para muito mais que a construção de alguns gabiões, espécie de muro de contenção, feito com pedras e arame.
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Pior. A região é fustigada for fortes ventos e correntes, o que contribui para a formação de grandes ondas para deleite dos surfistas, mas fortes o suficiente para ameaçar a zona costeira e as cidades ali construídas.
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Além disso, as dunas que existem em Caiçara do Norte foram significativamente alteradas pela mão humana, resultado como sempre de ocupação desordenada, não planejada, como sói acontecer.
E dunas são extremamente importantes. Apenas uma de suas funções é a proteção da costa, e a reposição da areia das praias perdida durante as ressacas. Alterar as dunas pela mão humana significa dar uma força extra para a natural erosão do litoral.
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A ocupação desordenada, as mudanças do clima, e a inação governamental cobraram o preço que, mais uma vez, todos nós vamos pagar. Já em 2018 ruas e avenidas foram invadidas durante a maré alta, preocupando a população. Mas o pior estava por vir…
Um ano depois, em julho de 2019, o Ministério Público do Rio Grande do Norte, MPRN, recomendou ao prefeito de Caiçara do Norte que ‘adote providências para a promoção do adequado ordenamento territorial, através de um Projeto de Lei (PL) a ser enviado para a Câmara Municipal’.
O motivo principal do MPRN não foi a erosão, mas a falta absoluta de saneamento básico que gerou a abertura de fossas sépticas no passeio público. Seja como for, o ordenamento territorial contempla igualmente as construções irregulares próximas ao mar.
Situação de calamidade em fevereiro de 2021
Nesse mês houve ressaca, e com ela, a destruição que obrigou a prefeitura a declarar estado de calamidade. A Defesa Civil teve que interditar prédios da orla em razão de risco de desabamento.
Assista ao vídeo e veja o que aconteceu em fevereiro de 2021
Setembro de 2021, a ameaça se concretiza
Mesmo na época do ano em que os ventos são mais fracos, e ainda sem a ajuda de uma ressaca, o mar novamente invadiu o bairro das Rocas em setembro de 2021 pondo no chão dez imóveis.
O que ocorre em Caiçara do Norte já aconteceu no Sul, em Balneário do Hermenegildo, ou Florianópolis; no Sudeste, em vários pontos, com destaque para Atafona no norte fluminense ou Nova Almeida, ES; no Nordeste a erosão ataca no Ceará, Rio Grande do Norte, e também na Bahia, etc; e na região Norte, em especial na praia de Ajureteua, entre muitas outras.
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Mas, como um aluno teimoso que se recusa a aprender com os próprios erros, seguimos sem dar pelota ao litoral ou o que nele se passa. Enquanto continuarmos apáticos com o desgoverno os problemas irão se avolumar, e os prejuízos dos eventos extremos no litoral, aumentarão ainda mais.
As pessoas, e os gestores públicos, têm que compreender que a erosão acontece quando determinada praia perde mais sedimentos do que recebe.
Por isso é proibido ocupar dunas, construir sobre a areia da praia, ou mesmo muito próximo dela. Mas as leis, no que dizem respeito ao litoral, são solenemente ignoradas. O resultado é o que temos mostrado.
Imagem de abertura:
Fontes: https://core.ac.uk/download/pdf/71373789.pdf; http://www.tribunadonorte.com.br/noticia/mara-alta-invade-ruas-e-ima-veis-no-munica-pio-de-caia-ara-do-norte/406541; http://simariomorais.blogspot.com/; https://g1.globo.com/rn/rio-grande-do-norte/noticia/2021/09/09/mar-avanca-e-atinge-dez-imoveis-em-caicara-do-norte-no-rn-veja-video.ghtml.