Beluga imita voz humana e engana mergulhadores
Desde os anos 1960, os Estados Unidos iniciaram um programa secreto de treinamento com mamíferos marinhos. A ideia era usá-los em operações militares: recuperar torpedos, detectar minas e patrulhar zonas de risco. Mais tarde, ao trabalhar com belugas, os cientistas fizeram uma descoberta surpreendente. Vale lembrar que o uso de animais em guerras vem de longe. Na Antiguidade, o general cartaginês Aníbal já empregava elefantes em batalhas. Nos tempos modernos, golfinhos foram treinados para atuar na Guerra da Ucrânia.
A Guerra Fria no Ártico
Em meados dos anos 1970, a Guerra Fria se deslocou para o Ártico. Os submarinos soviéticos começaram a usar a calota de gelo como esconderijo, dificultando a vigilância ocidental.
Mas o ambiente era hostil — até mesmo para mamíferos marinhos treinados, como golfinhos e focas do Navy Marine Mammal Program (NMMP), da Marinha dos Estados Unidos.
Foi então que o Pentágono chegou a uma conclusão: precisava de animais acostumados ao frio extremo, dotados de sonar natural e capazes de localizar e recuperar torpedos nas águas geladas e turvas do norte.
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Ilhabela em último lugar no ranking de turismo 2025Garopaba destrói vegetação de restinga na cara duraCores do Lagamar, um espectro de esperançaEm agosto de 1977, com autorização do governo canadense, o veterinário texano Sam Ridgway — cofundador do NMMP — liderou uma equipe até a costa do norte de Manitoba. Ali, começaram a capturar as primeiras belugas para dar início a uma nova e ambiciosa fase do programa.
Seis belugas capturadas no Ártico
Assim, entre 1977 e 1980 a Marinha dos EUA capturou seis belugas no Ártico para o programa militar. Entre elas estava um filhote de apenas dois anos, que recebeu o nome de NOC.
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O mais jovem dos recrutas, NOC passaria praticamente toda a vida em cativeiro trabalhando lado a lado com treinadores no Navy’s Space and Naval Warfare Systems Center, em Point Loma, Califórnia.
Parte dos treinamentos acontecia ali mesmo, nas instalações da base. Mas também havia sessões em mar aberto — e, ainda assim, os animais sempre retornavam ao navio de apoio, mostrando um vínculo impressionante com os humanos.
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De tanto ouvir humanos, belugas começaram a imitá-los
O veterinário Sam Ridgway trabalhava em um escritório próximo ao tanque onde os animais viviam em cativeiro. Por isso, as belugas estavam constantemente expostas às vozes humanas.
Certa vez, dois mergulhadores faziam reparos subaquáticos em Point Loma. Durante o trabalho, conversavam com a equipe de apoio na superfície por um aparelho chamado wet phone. De repente, um deles emergiu confuso e perguntou:
— Quem mandou a gente parar?
Ninguém havia dito nada. Mas a voz — estranhamente humana — viera do fundo do tanque. Foi nesse momento que Ridgway suspeitou: alguma beluga estava imitando a fala humana.
Intrigado, ele passou a gravar as vocalizações. O resultado foi surpreendente: NOC, a jovem beluga, imitava padrões de fala com sílabas e entonações semelhantes às humanas — embora usando um mecanismo completamente diferente, por meio do trato nasal.
O caso chamou atenção da comunidade científica. Em 23 de outubro de 2012, a revista Current Biology publicou o estudo “Spontaneous Human Speech Mimicry by a Cetacean“, assinado por Ridgway. Poucos dias depois, a voz de NOC — a primeira de uma beluga registrada imitando um humano — já circulava pela internet.
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Aqui você pode ouvir os sons produzidos por belugas.
(Foto de abertura: WWF)
Fontes: http://www.public.navy.mil/spawar/Pacific/71500/Pages/default.aspx; https://www.researchgate.net/publication/232704283_Spontaneous_human_speech_mimicry_by_a_cetacean.