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Área de Relevante Interesse Ecológico e Área de Proteção Ambiental do Mamanguape

Área de Relevante Interesse Ecológico e Área de Proteção Ambiental do Mamanguape

Área de Relevante Interesse Ecológico e Área de Proteção Ambiental do Mamanguape:   De acordo com a definição do ICMBio Áreas de Relevante Interesse Ecológico ou ‘ARIEs’ são “áreas em geral de pequena extensão, com pouca ou nenhuma ocupação humana, com características naturais singulares ou mesmo que abrigam exemplares raros da biota regional. Sua criação visa a manter esses ecossistemas naturais de importância regional ou local, bem como regular o uso admissível destas áreas, compatibilizando-o com os objetivos da conservação da natureza.”

CARACTERÍSTICAS:

BIOMA: Marinho Costeiro
Município: Rio Tinto, Paraíba
ÁREA: 5.769,54 hectares
DIPLOMA LEGAL DE CRIAÇÃO: nº 91.890 de 05 de novembro de 1985
Tipo: Uso Sustentável.
Plano de Manejo: A UC tem plano de manejo desde 2014

“Área de Proteção Ambiental”, ou APA, é a mais permissiva em termos de Unidades de Conservação dentre os 12 tipos existentes no Brasil. Área em geral extensa, com certo grau de ocupação humana, com atributos bióticos, abióticos, estéticos ou culturais importantes para a qualidade de vida e o bem-estar das populações humanas. As APAs têm como objetivo proteger a diversidade biológica, disciplinar o processo de ocupação e assegurar a sustentabilidade do uso dos recursos naturais. Cabe ao Instituto Chico Mendes estabelecer as condições para pesquisa e visitação pelo público.

CARACTERÍSTICAS:

BIOMA: Marinho Costeiro
Municípios: Rio Tino e Lucena, Baia da Traição, e Marcação, Paraíba
ÁREA: 14.640 hectares
DIPLOMA LEGAL DE CRIAÇÃO: nº 924 de 10 de setembro de 1993
Tipo: Uso Sustentável.
Plano de Manejo: A UC tem plano de manejo desde 2014

A história da Área de Relevante Interesse Ecológico e Área de Proteção Ambiental do Mamanguape

Em 1980 aqui foi estabelecida a primeira base do Projeto Peixe-Boi. O local foi cuidadosamente escolhido. Na Paraíba havia os maiores grupos destes animais.

ARIE e APA do Mamanguape. Peixe-boi fotografado na primeira viagem, 2005- 2007, quando a base ainda funcionava no rio Mamanguape.

Cinco anos depois foi decretada a ARIE do Mamanguape, para proteger os 5.700 hectares de mangue, habitat do Peixe-boi. Finalmente, em 1993, chegou a vez da APA.

As duas UCs procuram garantir a integridade de variados ecossistemas que se misturam nesse pequeno espaço, entre praias, mata atlântica, restinga, lagoas de praia, estuário, recifes de arenito e falésias.

Aspectos da mata atlântica.

Oito comunidades estão dentro da Área de Relevante Interesse Ecológico e Área de Proteção Ambiental do Mamanguape

Oito comunidades estão dentro da APA que, de acordo com a subchefe da UC, Thalma Grisi, tem como ameaças (à integridade das UCs) a cana-de-açúcar, muito próxima, inclusive com usinas que já despejaram vinhoto nos rios causando mortandade de peixes, e a carcinicultura, como tenho chamado, a ‘famigerada’ criação de camarões em cativeiro.

Na Paraíba ainda existem áreas relativamente grandes com Mata Atlântica

Importante ressaltar que, ao contrário de Alagoas e Pernambuco onde a cana domina quase cem por cento do território, chegando a encostar no que restou de mangue, na Paraíba ainda existem áreas relativamente grandes (para o Nordeste) com Mata Atlântica e restinga agindo como proteção entre a cana e o manguezal.

Impressionante a casca da árvore, uma ‘mancha’ de cerrado em plena mata atlântica

A especulação imobiliária ataca na Área de Relevante Interesse Ecológico e Área de Proteção Ambiental do Mamanguape

Mas as duas UCs, a ARIE e APA do Mamanguape, enfrentam outros perigos comuns às unidades da região. A especulação imobiliária, até pouco tempo ausente do litoral norte da Paraíba, é uma delas. Este flagelo agora conta com incentivo do Estado, interessado em fomentar o turismo.

É um direito, e até um dever do Estado, promover o crescimento de alguma região. Mas como conheço o modo rápido, e normalmente torpe, com que ele avança, ‘fomentado’ pela falta de regras claras, a dificuldade em descobrir qual instância autoriza qual tipo de ocupação, se municipal, estadual ou federal; a ignorância e o egoísmo, tenho dúvidas do resultado desta ação.

Depois que ela arromba a porteira, se dissemina, e é difícil brecar a especulação num país em que há cidadãos de primeira, e segunda classe: uns têm mais direitos que outros.

Dunas fixas do litoral norte da Paraíba. Inútil tentativa de brecar a erosão, e avanço do mar, na praia de Campina
As dunas fixas do litoral norte da Paraíba

A sina dos nativos da costa

Mas o que mais me agride, assunto pouco explorado na mídia, é a sina dos nativos da costa, os maiores credores da sociedade. Para eles quase não existem políticas públicas. Por gerações as mesmas famílias vivem em determinado lugar. De repente, por qualquer motivo, o local entra na moda.

Em poucos anos toda comunidade é expulsa, perdendo o aceso ao mar, sua cultura e modo de vida. No máximo vendem queijo assado na praia, ou se transformam em caseiros daqueles que compraram suas posses. Vale a pena?

A distância de João Pessoa é um dos atrativos, são menos de 80 km. O que ainda atrapalha são os 36 da estrada de terra, que começa na saída da BR e segue até Barra do Mamanguape.

Já há loteamentos de antes da criação da Área de Relevante Interesse Ecológico e Área de Proteção Ambiental do Mamanguape

Apesar da estrada de ‘chão’, ruim, já há loteamentos de antes da criação da APA, como o da praia de Campina, cujas construções foram erguidas em cima da área de dunas, e não tem licenciamento ambiental.

O resultado não se fez esperar. Muitos imóveis estão ameaçados, propriedade de veranistas preocupados que tentam atrasar o prazo fatal de desmoronamento, provocado pela erosão, construindo inúteis muros de arrimo.

Não há como impedir a erosão costeira ao se ocupar dunas

Com, ou sem muros, elas têm prazo certo para cair. Não há como impedir a erosão costeira ao se ocupar dunas. Elas agem como repositório da areia tragada pelas ressacas.

Ao não depositar sedimentos na água, trazidos de volta via ondas que reequilibram a dinâmica da sensível área de transição, é apenas uma questão de tempo para que o mar avance arrastando o que estiver no seu caminho.

Falésias  se erguem como muralhas ao longo da praia do Oiteiro

De Campina, muito próximo da base da unidade, seguimos para as falésias que se erguem como muralhas ao longo da praia do Oiteiro.

O roteiro é curto e maravilhoso. Num espaço pequeno, com menos de 4 quilômetros, passamos por dunas, atravessamos restingas e chegamos à altura desconcertante das falésias de onde se vê a foz do Miriri, divisa sul da APA do Mamanguape.

De um lado, o mar, do outro, a mata atlântica em tamanho impressionante para a proximidade da costa. E lindas praias ainda desocupadas.

Falésias, mata atlântica, e a linda e desocupada praia do Oiteiro. A foz do rio Miriri, limite sul da APA

A Paraíba joga um papel importante na proteção de sua paisagem litorânea

Dos 17 estados costeiros foi o único que soube aproveitar e preservar a beleza cênica impedindo espigões nas primeiras ruas da praia.

Descobri, surpreso, na primeira viagem pela costa brasileira (2005-2007) e, desde então, não deixo de comentar a cada pretexto. Bons exemplos merecem cópias.

Se ao menos um estado conseguiu, os outros 16 também poderiam faze-lo. Basta vontade política, bom senso, e menos egoísmo cara-pálida que multiplica a destruição pelo capricho de ‘ter-vista- para-o-mar’.

Árie e APA de Mamanguape. Falésias, mata atlântica, e a linda e desocupada praia do Oiteiro

Não dá mais. Somos 200 milhões. Sete bi no planeta, 60% dos quais vivendo na zona costeira. Ou paramos agora, ou não vai sobrar o que preservar.

O modelo de ocupação, de segunda residência, não garante a biodiversidade

O modelo de ocupação, de segunda residência, não garante a biodiversidade, destrói a própria essência do turismo, a beleza natural; e poucas vezes gera, ou distribui, riqueza ente os miseráveis que moram nos locais ainda virgens, os ‘confins’ do litoral, aqueles que estão na ‘mira do lobo’, os últimos, e talvez mais bonitos da costa brasileira.

Nosso modelo é falido

Não ordenou a ocupação, foi vencido por ela. E ainda não descobriu que poderia ter a visão do mar, indo e vindo eternamente, ouvindo o hipnotizante barulho das ondas quebrando, sem necessariamente apequenar algo que levou milhares de anos para se formar e que, pela beleza e localização estratégica, são considerados ‘terrenos públicos’, ou terrenos de marinha’, que pertencem a todos, merecendo menção na Constituição:

A Zona Costeira é considerada como Patrimônio Ambiental Brasileiro.

 Sua ocupação deve se dar de modo autossustentável.

A Paraíba domou os espigões

Mas só a Paraíba, e sua Constituição Estadual, conseguiram impor um rigoroso gabarito que exclui prédios próximos ao mar. Primeiro há casas de um andar, nas ruas de trás é permitido dois andares, depois, três, só então começam os prédios, e assim mesmo, baixos.

Os espigões ficam para depois desta barreira, garantindo uma boa ventilação, insolação, e visão, para os quarteirões mais afastados. Ordenar a ocupação é criar normas que atendam a maioria da população, não apenas os interesses da elite econômica. O conceito paraibano de escala em altura, mais democrático, contempla a premissa: todos têm vista bonita, sol, e vento constantes.

Simples, não? Pena não ter sido imitado ao adotar a norma que doma, em parte, a indústria da construção civil, impede seus excessos, a especulação, e garante a várias gerações ainda por vir, que aproveitem aquilo que anos atrás todos aproveitávamos: a beleza do litoral brasileiro.

A pegada de nossa geração é pesada demais

É impressionante a pegada que deixamos em tão pouco tempo. Até os anos 50 do século passado nosso litoral era semi-virgem. Em menos de 70 anos, um átimo na história do planeta, conseguimos destrui-lo quase por completo. E para sempre. Depois que uma construção na orla é terminada, mesmo em local irregular, raramente há força capaz de derrubá-la.

Arie e APA de Mamanguape. Uma das muitas lagoas cercadas por mata atlântica

A elite econômica brasileira tem dado provas de seu egoísmo ao privatizar praias, ocupar e modificar ilhas, construir em dunas ou costões rochosos, aterrar manguezais para fazer condomínios, a lista é grande.

Ou não é ela, a parte rica da sociedade, que tem posses para ter uma segunda propriedade, ou um empreendimento, na zona costeira?

Dois terços da costa percorridos

A esta altura já percorremos cerca de dois terços da costa brasileira. Desde o Chuí até à Paraíba o que mais me entristece, além da fraqueza das UCs federais, é a banalização da zona costeira.

Uma paisagem de exceção, como batizou-a o geógrafo Aziz Ab’Saber, que herdamos limpa das gerações passadas. Um lindo presente desenhado com capricho por eras de erosão, avanços e recuos do mar, coberto por generosa porção da mata mais biodiversa do planeta, entrecortado por serras que atravessam o litoral de cinco estados, e que ainda esbanja uma infinidade de recortes, e tipos diferentes de praias. Por sua singularidade, um Éden.

Não há outro lugar no mundo com tamanha diversidade paisagística.

Sem nos darmos conta, trabalhamos para transformar este tesouro numa Miami caipira, com seus arrogantes espigões, campos de golfe à beira mar, resorts onde turistas se entrincheiram atrás de muralhas de concreto, condomínios sem personalidade, todos à vista, mostrando suas feiuras num improvável torneio de feridas, grande parte construídos em locais impróprios (até em cima de falésias!). Para aproveitar a beleza natural não precisava ser assim.

A Paraíba está aí para provar.

A carcinicultura na Área de Relevante Interesse Ecológico e Área de Proteção Ambiental do Mamanguape

Em Mamanguape a fazenda de camarões foi instalada na Ilha das Moças, no meio deste que é o mais importante estuário do litoral norte do Estado: o rio Mamanguape.

Tanques de criação ao lado do estuário

Pertence aos índios Potiguar, comandados pelo “cacique Elias” , entre parêntesis porque de índio não tem nada. Sua fisionomia é a do mais puro “branco”. São 128 tanques de criação que produzem até três safras anuais, de 50 a 60 toneladas cada uma!

Carcinicultura: o mangue foi extirpado

O mangue, importante berçário de vida marinha, foi extirpado para dar lugar às piscinas de criação. E mais uma vez uma espécie exótica, introduzida, o paneus vannamei, originário do Pacífico.

Perguntei ao “cacique” quantas pessoas vivem do camarão na aldeia. A resposta dá pistas do que aconteceu: no começo, diz ele, eram poucas, cerca de 25 pessoas. Mais tarde, com o sucesso, outras foram chegando, declarando-se índios, imagino. Hoje são 80 pessoas.

Tanque em produção. As chefes das UCs e o ‘cacique’ Elias

No momento eles procuram licenciar a criação para expandi-la com financiamento do Banco do Nordeste.

Fazenda de camarões foi aberta no tempo do Ibama na Área de Relevante Interesse Ecológico e Área de Proteção Ambiental do Mamanguape

A chefe da UC explica que a fazenda foi aberta ainda no tempo do Ibama mas, como está dentro da ARIE, o projeto foi embargado. Tempos depois a AGU, Funai, Ibama e ICMBio iniciaram uma “câmara de conciliação” (CAAF- Câmara de Conciliação da Administração Federal) que ainda não terminou mas já tomou  decisões, entre elas o ‘licenciamento corretivo da carcinicultura’.

Existem outras questões sendo estudadas como  fechar alguns tanques, transferir outros, e proibir a criação do camarão exótico, já que numa ARIE não pode haver fauna que não seja nativa.

Estuário de Mamanguape. Tanque em produção

Para mim não restou dúvidas de que há gente de fora fomentando a criação, até por saberem que os “índios” contam com uma legislação paternalista, equivocada, que permite tudo, ou quase tudo.

Ao serem contrariados vestem seus cocares, pintam os corpos, têm o cuidado de se municiarem com jurássicos arcos e flechas, e partem para o confronto sabendo que do outro lado nada se pode fazer.

Estruturas da Área de Relevante Interesse Ecológico e Área de Proteção Ambiental do Mamanguape

Neste ponto não há novidades. A ARIE, chefiada pela bióloga Renata Vargas, tem apenas ela mesma como equipe.

A APA teve mais sorte: conta com dois analistas ambientais, e três técnicos que trabalham na sede (serviços administrativos em geral).

As duas UCs têm dois carros, e dois barcos com os motores quebrados, sem verba nem perspectiva de conserto.

É mais um desperdício dos dinheiros públicos. As poucas vezes em que o ICMBio providencia barcos para as unidades marinhas não consegue garantir um padrão mínimo de manutenção e consertos. Já disse que a quantidade de barcos que vi, apodrecendo ao lado das sedes da UCs, não é desprezível.

As duas chefes entrevistadas, Renata, pela ARIE, e Thalma Grisi, pela APA, consideram que a equipe mínima necessária para cumprirem suas funções deveria ter mais três ou quatro analistas para cada UC.

Área de Relevante Interesse Ecológico e Área de Proteção Ambiental do Mamanguape: transferência do Projeto Peixe-Boi

Estuário de Mamanguape. Peixes-boi fotografados na primeira viagem pela costa brasileira

Na década de 80 o governo da Paraíba não se interessou em investir no projeto que precisava urgentes reformas e compra de terras para ampliação.

No mesmo momento Pernambuco ofereceu os recursos. Desde então a sede foi transferida para a ilha de Itamaracá, onde está até hoje.

A última reintrodução de peixes-boi, em Mamanguape, aconteceu em 2012.

Praia do estuário de Mamanguape

Área de Relevante Interesse Ecológico e Área de Proteção Ambiental do Mamanguape recebem cerca de dois mil turistas

Ainda assim, para verem estes simpáticos e dóceis mamíferos marinhos soltos no estuário, todos os anos Mamanguape recebe cerca de dois mil turistas.

Eis aí mais uma oportunidade perdida.

O turismo de observação, se bem explorado, gera milhões de dólares mundo afora, empregos e renda, por turistas enfastiados com o dia-a-dia das grandes cidades, encantados com a possibilidade de se aproximar dos poucos seres marinhos que aceitam sua presença, normalmente os mamíferos.

ARIE e APA do Mamanguape, Recifes de arenito fecham o estuário criando as condições ideais para os peixes-boi

O Brasil poderia, com a beleza de seu litoral e, especialmente, a pobreza secular dos nativos, aproveitar esta oportunidade como fazem países tão próximos como a Argentina, para onde vão todos os anos mais de 150 mil turistas pagando, consumindo, gerando renda e emprego, simplesmente para observar baleias (península Valdés).

Não é tão difícil. Até eles conseguiram…

Cenários nós temos de sobra. Falta mudar o modelo.

Um dos que mais cresce no mundo é o turismo de observação. Não é preciso muito. Basta capacitar os nativos, incentivar financiamento de projetos que gerem renda, diminuindo a pobreza e criando empregos. Um mínimo de infraestrutura e, depois, divulgar. O resto vem atrás.

O Brasil poderia…ou continuaremos repetindo o verbo eternamente no futuro do pretérito?

SERVIÇOS

Não há restrição para a visitação pública das duas UCs.

Recomendo a todos que visitem o litoral da Paraíba. Temos muito a aprender com ele.

Maiores informações sobre as UCs:

COORDENAÇÃO REGIONAL / VINCULAÇÃO: CR6 -Cabedelo

ENDEREÇO / CIDADE / UF / CEP: Rua do Patrício s/n centro – Rio Tinto/PB – CEP: 58.297-000

TELEFONE: (83)3291-1070

Assista ao documentário que produzimos durante a visita à Arie e APA do Mamanguape

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