Aquecimento global de 4ºC até o final do século, impactos seriam devastadores
A cúpula do clima convocada por Joe Biden em abril deste ano reuniu 40 chefes de estado numa tentativa de maiores esforços dos governantes em suas metas de cortes de gases de efeito estufa. Mas os resultados esperados não vieram. Logo depois, os compromissos foram quantificados por uma agência da ONU sobre meio ambiente com sede em Nairóbi, Quênia, e atingiram um aumento quase 4ºC acima dos níveis pré-industriais. Será catastrófico para a humanidade se não conseguirmos melhorar. Para situar o leitor, fizemos uma curadoria na rede para saber o que acontecerá caso se confirme este aumento de temperatura média do planeta até o fim deste século. Hoje vamos ‘dar uma olhada’ em como seria o mundo com aquecimento global de 4ºC (Este post foi escrito antes da mídia divulgar o último relatório do IPCC em 10 de agosto- que confirma tudo que escrevemos).
Aquecimento global de 4ºC, impactos seriam devastadores
Antes, vamos nos lembrar que a meta do Acordo de Paris é um aumento de 1,5ºC até o fim do século. E apesar de estarmos nos primeiros 21 anos do século 21, já contabilizamos um aumento da ordem de 1,2ºC. Será quase impossível que a temperatura suba apenas 1,5ºC até o final do século.
Desde o Acordo de Paris cientistas vêm alertando que se não fizermos nada a tendência é a temperatura subir até 4ºC, ou mais. Mas, se isso acontecer…
Em 2012 um relatório encomendado pelo Banco Mundial ao Instituto Potsdam para Pesquisa de Impacto Climático (PIK) dizia que ‘o mundo caminha para um aumento de 4 graus Celsius’, e antecipou qual seria o cenário. É com estes dados que escrevemos o que segue abaixo.
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A temperatura da Terra nunca é linear. Os pesquisadores alertam que com aquecimento de algo entre 3ºC e 4ºC para 2100, embora sejam temperaturas médias globais – nos polos e sobre a terra (1/3 do planeta onde as pessoas vivem), o aumento pode ser o dobro.
Um aquecimento médio de todo o globo em 4ºC tornaria o planeta irreconhecível de qualquer coisa que os humanos já experimentaram.
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Não é a primeira vez que o mundo esquenta
Segundo matéria do The Guardian, especulando sobre um mundo 4ºC mais quente, a última vez que a temperatura esteve tão alta foi há 15 milhões de anos, durante o mioceno, quando intensas erupções vulcânicas no oeste da América do Norte emitiram grandes quantidades de CO2.
O nível do mar subiu cerca de 40 metros mais alto do que hoje e florestas exuberantes cresceram na Antártica e no Ártico. No entanto, esse aquecimento global ocorreu ao longo de muitos milhares de anos.
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Tundra do Ártico emite mais carbono do que absorveVanuatu leva falha global em emissões à HaiaO plâncton ‘não sobreviverá às mudanças do clima’Mesmo em sua forma mais rápida, o aumento nas emissões de CO2 ocorreu em uma taxa 1.000 vezes mais lenta do que a nossa desde o início da Revolução Industrial.
Isso deu tempo aos animais e plantas para se adaptarem às novas condições e, o que é crucial, os ecossistemas não foram degradados pelos humanos. As coisas parecem consideravelmente mais sombrias para o nosso mundo.
Aquecimento global de 4ºC trará impactos devastadores em 2100
Os impactos seriam devastadores. O relatório afirma que os cenários de 4°C são potencialmente devastadores. Haveria inundação de cidades costeiras; riscos crescentes para a produção de alimentos, potencialmente levando a taxas mais altas de subnutrição e desnutrição. Muitas regiões secas se tornariam mais secas, assim como regiões úmidas ficariam mais úmidas.
Ondas de calor sem precedentes em muitas regiões, especialmente nos trópicos; escassez de água substancialmente exacerbada em muitas regiões; aumento da intensidade dos ciclones tropicais; e perda irreversível de biodiversidade, incluindo sistemas de recifes de corais.
O pior como sempre é que países pobres ou em desenvolvimento, aqueles que menos contribuíram para o aquecimento do planeta, serão os mais devastados pelas consequências, uma vez que têm menos capacidade econômica, científica e técnica para enfrentar o aquecimento e se adaptar.
Mas nem por isso os países ricos deixariam de ter problemas. Como destaca o relatório, ‘os eventos extremos recentes em todo o mundo continuam a destacar a vulnerabilidade não só do mundo em desenvolvimento, mas também dos países industrializados ricos’.
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Um mundo com mais de 4ºC sobre os níveis pré-industriais…
O trabalho feito para o Banco Mundial é perturbador. As principais descobertas incluem:
Ondas extremas de calor, que sem o aquecimento global seriam esperadas uma vez em várias centenas de anos, serão experimentadas durante quase todos os meses de verão em muitas regiões.
Aumentos de 6°C ou mais nas temperaturas médias mensais do verão seriam esperados no Mediterrâneo, Norte da África, Oriente Médio e partes dos Estados Unidos.
O aumento do nível do mar em 0,5 a 1 metro até 2100 é provável, com níveis mais altos também possíveis. Algumas das cidades mais vulneráveis estão localizadas em Moçambique, Madagascar, México, Venezuela, Índia, Bangladesh, Indonésia, Filipinas e Vietnã.
Trópicos e subtrópicos
As regiões mais vulneráveis estão nos trópicos, subtrópicos e em direção aos polos, onde é provável que vários impactos ocorram juntos.
É provável que a agricultura, os recursos hídricos, a saúde humana, a biodiversidade e os serviços ecossistêmicos sejam severamente afetados.
Isso poderia levar ao deslocamento em grande escala de populações e consequências para a segurança humana e os sistemas econômicos e comerciais.
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E, finalmente, alerta o relatório, muitas pequenas ilhas podem não ser capazes de sustentar suas populações. Foi a partir deste trabalho, e suas tenebrosas consequências, que o mundo passou a lutar por um aquecimento não superior a 1,5ºC.
Este relatório assustou o mundo acadêmico. Ao ser publicado em 2012, com prefácio alarmante do presidente do Banco Mundial, houve enorme repercussão.
Foi a partir desta simulação que começou a luta, ainda que tímida, para que o aquecimento não ultrapasse 1,5ºC, posição que nos encontramos neste momento, quando a comunidade científica já sabe que este aumento acontecerá até 2040, de acordo com o último relatório do IPCC.
Na época da publicação foram estas as palavras de Jim Yong Kim presidente do Banco Mundial:
“A falta de ação sobre as mudanças climáticas ameaça fazer com que o mundo que nossos filhos herdarão seja totalmente diferente do que vivemos hoje. A mudança climática é um dos maiores desafios que o desenvolvimento humano poderia enfrentar. Precisamos assumir a responsabilidade moral de agir em nome das gerações futuras, especialmente as mais pobres.”
Aquecimento global de 4ºC por região do planeta
A matéria do Guardian, que repercute com cientistas a possibilidade de vida em 2100 com mais 4ºC de temperatura, alerta para o fato de que a catástrofe será diferente em cada lugar do planeta. Mas nenhuma escapará da hecatombe.
‘Cidades afogadas; mares estagnados; ondas de calor intoleráveis; nações inteiras inabitáveis … e mais de 11 bilhões de humanos. Um mundo quatro graus mais quente é o material de pesadelos e, ainda assim, é para onde estamos indo em apenas décadas’.
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Nos oceanos morte em massa
‘Na última década, os cientistas foram capazes de produzir uma imagem muito mais matizada de como o aumento da temperatura afeta as complexidades da cobertura de nuvens e os padrões de circulação atmosférica e oceânica e a ecologia’.
‘Estamos observando vastas zonas mortas nos oceanos, à medida que os nutrientes do escoamento de fertilizantes se combinam com as águas mais quentes para produzir uma explosão de algas que deixam a vida marinha sem oxigênio. Isso será exacerbado pela acidez do CO2 dissolvido, que causará uma morte em massa, principalmente de crustáceos, plâncton e coral’.
Nos polos não haverá gelo
‘O nível do mar estará talvez dois metros mais alto e, mais preocupante, estaremos no caminho para um mundo sem gelo, tendo ultrapassado os pontos de inflexão para a Groenlândia e mantos de gelo da Antártica’.
‘Isso porque, à medida que as camadas de gelo derretem, sua superfície cai para uma altitude mais baixa, onde é mais quente, acelerando o derretimento. Por fim, a terra escura e absorvente de calor é exposta sem a camada de gelo, acelerando ainda mais o processo de derretimento’.
Na Ásia haverá mais tempestades e inundações
‘A Ásia vai inundar com mais frequência, de acordo com a pesquisa de Richard Betts, chefe de impactos climáticos do Met Office Hadley Center, porque a atmosfera mais quente produzirá monções mais intensas, tempestades violentas e chuvas extremas’.
Zona equatorial: inabitável
Richard Betts prevê que no cinturão equatorial de alta umidade haverá estresse por calor intolerável na maior parte da Ásia tropical, África, Austrália e Américas, tornando-o inabitável durante grande parte do ano.
Aquecimento global de 4ºC: os seres humanos neste cenário
Para o Guardian, ‘a boa notícia é que os humanos não se extinguirão – a espécie pode sobreviver com apenas algumas centenas de indivíduos; a má notícia é que corremos o risco de grande perda de vidas e talvez o fim de nossas civilizações’.
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2 bilhões de refugiados até 2100
‘Muitos dos lugares onde as pessoas vivem e cultivam alimentos não serão mais adequados para nenhum dos dois. O aumento do nível do mar tornará as ilhas baixas e muitas regiões costeiras de hoje, onde quase metade da população global vive, inabitáveis, gerando cerca de 2 bilhões de refugiados até 2100’.
O Guardian encerra sua matéria com um parágrafo sinistro: ‘Na verdade, as consequências de um mundo 4ºC mais quente são tão aterrorizantes que a maioria dos cientistas prefere não contemplá-las, quanto mais elaborar uma estratégia de sobrevivência’.
Johan Rockström, diretor do Instituto Potsdam para Pesquisa de Impacto Climático na Alemanha, não foi nem um pouco otimista, não poderia: “É difícil ver como poderíamos acomodar oito bilhões de pessoas ou talvez até a metade disso”, diz ele.
“Haverá uma rica minoria de pessoas que sobreviverá com estilos de vida modernos, sem dúvida, mas será um mundo turbulento e cheio de conflitos”.
“A razão é principalmente como fazer comida suficiente, mas também teríamos perdido a biodiversidade da qual dependemos e estaríamos enfrentando um coquetel de choques negativos o tempo todo, de incêndios a secas.”
Atenção: mesmo que por milagre parássemos de emitir gases de efeito estufa de uma hora para outra (são 51 bilhões de toneladas anuais), o clima não vai melhorar, vai apenas parar de piorar. Cerca de um quinto do dióxido de carbono emitido hoje continuará no ar daqui a 10 mil anos.
É por isto que nenhum de nós escapará da descarbonização: países, estados, municípios, empresas e cada um de nós tem, necessariamente, que fazer sua parte.
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Assista ao vídeo da National Geographic
Imagem de abertura: https://diarioresponsable.com/
Fontes: https://www.worldbank.org/en/news/press-release/2012/11/18/new-report-examines-risks-of-degree-hotter-world-by-end-of-century; https://www.pik-potsdam.de/en/output/projects/all/306; https://www.greenfacts.org/en/impacts-global-warming/l-2/index.htm; https://www.worldbank.org/en/news/press-release/2012/11/18/new-report-examines-risks-of-degree-hotter-world-by-end-of-century.