❯❯ Acessar versão original

Turismo desordenado destrói praia de Pipa, RN

Turismo desordenado destrói a praia de Pipa no Rio Grande do Norte

A praia de Pipa, no litoral sul do Rio Grande do Norte, era apenas mais uma vila de pescadores artesanais pacata e tranquila até que os surfistas ‘a descobriram’ nos anos 80. Turismo desordenado é o tema de hoje.

De acordo com matéria publicada pela Folha de S. Paulo, caderno Turismo, em fevereiro de 2017, “em 15 anos o lugar atravessou seu quarto ciclo de colonização estrangeira. No começo de 2000, com a prosperidade da União Europeia, vieram os portugueses e logo depois os espanhóis. Em seguida ela seria descoberta pelos escandinavos que chegavam em voo charter, pousando em Natal a cerca de 80 Km de Pipa. Agora chegou a vez dos argentinos”.

O turismo também pode ser ameaça

Faça a experiência: coloque no Google “Praia de Pipa” pra ver o que acontece. As primeiras quatro páginas só mostram anúncios de hotéis ou imóveis à venda, todos sugerindo sua ida “a mais este paraíso natural do Nordeste”.

Nada sobre a riqueza da biodiversidade desta região do Rio Grande do Norte que ainda guarda um dos trechos de Mata Atlântica mais preservados do estado.

O que resta de Mata Atlântica está em cima de falésias, ao lado de Pipa.

Nada sobre o desastre causado pela carcinicultura que se alojou na região destruindo manguezais, poluindo rios, e introduzindo uma espécie exótica, o camarão Litopenaeus Vannamei desde 1981. Saiba quais são as dramáticas consequências da introdução de espécies exóticas.

A famigerada carcinicultura, que destrói manguezais, na barra do Rio Cunhaú, próximo a Pipa.

Só a partir da página cinco do Google, depois de anúncios do tipo, “30 melhores hotéis em Pipa”, ou “98 hotéis perto de Pipa”, chegamos a um diferente, Pipa-Projeto Tamar, que  lembra que a região também foi escolhida por tartarugas- marinhas para desovar.

Mesmo assim, o aviso do Tamar em Pipa é o único a mencionar a biodiversidade do local. Ele está cercado por outros induzindo ao turismo na região.

Como é possível ignorar os problemas provocados?

É curioso. De repente um lugar entra na moda e explode como uma bomba atômica. Em pouquíssimo tempo uma comunidade é destruída justamente por sua beleza natural, a mesma que atraiu o turismo que, por seu turno, desfigura  o local.

Era para ser o contrário. Se a região é bonita o suficiente para atrair a atividade, o turismo deveria preservá-la de modo que mantivesse suas características naturais. Ou não?

Turismo desordenado: pesquisando mais os problemas começam a aparecer

Mudei o foco da pesquisa e logo vieram os problemas. O Núcleo Ecológico da Pipa criou um abaixo-assinado em nome da Baía dos Golfinhos, situada no distrito de Pipa, no município de Tibau do Sul. E assim ficamos sabendo que o local também foi escolhido pelos mamíferos marinhos. Os organizadores do manifesto dizem que

infelizmente a praia foi invadida, com a conivência do poder público local, por vendedores que lá se instalaram irregularmente, sem alguma autorização, por meio de instalações improvisadas, com dezenas de cadeiras de praias, guarda-sóis, caiaques etc. que ficam permanentemente no local. A ameaça da iminente construção de barracas fixas na praia está evidente

Se você quiser ajudar, entre no site do Núcleo e assine o manifesto. Infelizmente, esta parece ser a única opção: protestar. Tito Rosenberg, surfista radicado em Pipa, e presidente do Núcleo explica o que aconteceu:

Pipa sempre foi conhecida por sua beleza natural e pela deliciosa vida que seus moradores têm, desde sempre. Com a chegada do turismo há uns 20 anos, junto veio a ganância e o desrespeito pelas leis, que no papel são geniais, mas na vida real deixam muito a desejar.  Várias administrações da prefeitura deixaram de exigir que a lei fosse cumprida e danos quase irreversíveis acontecessem. A pressão dos investidores, dos especuladores imobiliários  são difíceis de administrar. Construções na beira da falésia, ocupação das praias por quiosques irregulares, passeios de barco e esgoto jogado na rede de águas pluviais são sempre atividades que saem do controle.

O Mar Sem Fim esteve em Pipa e constatou os estragos provocados pelo turismo desordenado

Foi em 2005 que estivemos por lá. E a situação já era crítica. Na ocasião entrevistamos o promotor  Márcio Luis Diógenes. Ele explicou que,

o Estado incentiva o turismo pelas divisas que traz, mas, neste caso, o Estado não tem preocupações ambientais

A especulação destruiu a vila de pescadores transformando totalmente o local. Paraíso, onde?

Relendo o diário desta viagem copiamos este comentário sobre Pipa:

Num espaço bem pequeno, espremido por falésias e um promontório, onde antes havia uma pequena vila de pescadores surgiu nos últimos dez anos uma cidade com dezenas de pousadas, restaurantes, casas de comércio, etc. As ruas são muito estreitas e ficam ainda mais apertadas com a grande quantidade de carros, ônibus de turismo, bugues, motos. Um local caótico, uma espécie de cortiço da classe média alta…

Pesquisando um pouco mais descobrimos que o promotor Márcio Luis Diógenes não está sozinho. João Batista Machado Barbosa, promotor de Justiça do Meio Ambiente ajuizou Ação Civil contra o próprio IDEMA, órgão de Meio Ambiente do Estado, por ter concedido licença para construção e desmatamento em local proibido.

A falta de infraestrutura, problema crônico no litoral

O grande problema, além da desfiguração física, é a falta de infraestrutura. Pipa fica no município de Tibau do Sul. De acordo com dados do IBGE o município tem uma  população de 11.385 pessoas divididas em 3.221 domicílios.

Destes, apenas 437 têm rede coletora de esgoto. Pra onde você acha que vai parar o resto?

Turismo desordenado no litoral do Brasil: alguns exemplos

Como se vê, o poder público como sempre tem enorme parcela de culpa. Turismo desordenado e omissão resultam em Pipa, que não é exceção. Ali próximo,  no Ceará, fica outra aberração do litoral nordestino, o Parque Nacional Marinho de Jericoacoara, que está sendo devastado pela especulação, mesmo sendo um Parque Nacional Marinho.

Duas chagas que arrebentam o litoral: turismo desordenado, e especulação imobiliária

Sair da versão mobile