Rio Doce, três anos depois do maior acidente ambiental do Brasil
Mais um ano se passou. Estamos no terceiro aniversário do maior acidente ambiental do Brasil (5 de novembro de 2015), quando veio abaixo a barragem do Fundão, em Mariana, Minas Gerais, matando 19 pessoas, destruindo distritos, e matando um curso d’água, o rio Doce. De lá para cá temos acompanhado os acontecimentos. Atualizamos o texto sempre que há novidades, porque sabemos da importância da sociedade cobrar com todo o rigor a punição exemplar dos culpados. É comum, nestas atualizações, surgirem todo tipo de esforços da justiça, e ou das poderosas empresas, para ‘melar o caso’. A novidade desta vez, é a …
Prescrição do direto das vítimas do acidente?
Aconteceu em Agosto de 2018. Jornais noticiaram: “Ministérios Públicos Estadual (MPE) e Federal (MPF) em Minas Gerais, a Defensoria Pública e as mineradoras Samarco, Vale e BHP Billiton assinaram nesta sexta-feira, 26, em Belo Horizonte termo de compromisso que estabelece que não haverá prescrição de direitos a vítimas do rompimento da barragem de Fundão, ocorrido em 5 de novembro de 2015, em Mariana.”
Segundo o chefe da força-tarefa do MPF, procurador José Adércio Leite Sampaio, “oportunistas” procuravam atingidos pela tragédia e lhes diziam que haveria prescrição no próximo dia 5, quando a tragédia completa três anos.
Empresas fazem acordo para garantir que pagarão indenizações
“As empresas, de maneira irretratável, afirmam que não há prescrição”, disse. “Para tirar qualquer dúvida, fizemos esse acordo”. Segundo o procurador é preciso que as pessoas não se submetam “a ‘oportunistas’ que tentam ganhar dinheiro com a tragédia”.
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Declínio do berçário da baleia-franca e alerta aos atuais locais de avistagemMunicípio de São Sebastião e o crescimento desordenadoFrota de pesca de atum gera escândalo e derruba economia de MoçambiqueRuanda, líder global na redução da poluição plásticaEsta triste novidade mostra o buraco ético em que nos metemos. Agora, pessoas comuns, que nada têm a ver com a tragédia que matou 19 pessoas e um curso d’água, tentam se aproveitar em benefício próprio. É a força dos exemplos que começam na presidência da República Lulista, atingiram o Parlamento, empresários, e agora embaçaram a visão de pessoas comuns.
Processo jurídico vai muito mal
Tudo é estranho neste processo. Não passam seis meses sem que haja alguma tentativa de ‘melar’. A última, de 2017, é descrita abaixo. Mas não é só. Os atrasos são generalizados, prejudicam ainda mais as pessoas que já perderam tudo, de parentes, até suas casas.
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Os pescadores artesanais continuam sem ter onde pescar; as indenizações ainda não foram pagas; a construção do novo povoado ainda não saiu do papel. E vai por aí. No passado já tentaram uma maracutaia na troca do responsável do Ibama.
Tanto é verdade que em fevereiro de 2021 o Ministério Público de Minas Gerais pediu a extinção da Fundação Renova que foi criada pela Vale e suas parceiras para mitigar os estragos provocados pela queda da Barragem do Fundão.
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Desde o início a Samarco pisou na bola
O pior é que é sabido que a Samarco pressionou por uma licença que sabia fora dos padrões, não alertou os moradores, e é sócia duma empresa que tem a moral abaixo duvidosa, a BHP Billiton, que adora tapear governos fracos.
Não, essa turma da Samarco e da Vale sabia exatamente onde estava se metendo. Se a sociedade não fizer sua parte, acompanhando, repelindo estas vãs tentativas de ‘deixa pra lá’, a coisa vai, sim, pro brejo.
‘Três anos depois o pesadelo continua’
O jornal Estado de Minas publicou matéria para marcar os três anos. O título diz tudo: “Três anos depois do rompimento da barragem do Fundão, o pesadelo continua. “Na Justiça criminal ou nos tribunais cíveis, a tragédia do rompimento da Barragem do Fundão permanece, três anos depois, uma questão sem resposta para as quase 500 mil pessoas atingidas entre Minas Gerais e o Espírito Santo. Nem mesmo as famílias dos 19 mortos soterrados pelo tsunami de 40 milhões de metros cúbicos (m³) de lama e rejeitos de minério de ferro receberam uma compensação financeira condizente com a sua perda.” E acrescenta o jornal: “A estimativa mais otimista dos promotores de Justiça que atuam na força-tarefa do Rio Doce é de que os ressarcimentos comecem a ser pagos em meados de 2020.
‘Bomba relógio’ com metais pesados
Jornal da USP, 2018:”Uma “bomba-relógio” com metais pesados continua ameaçando o estuário do Rio Doce, mesmo após dois anos e meio do vazamento de 50 milhões de metros cúbicos (m3) de rejeitos de mineração do reservatório da Samarco, localizado no distrito de Bento Rodrigues, em Mariana (Minas Gerais). Essa conclusão é resultado de um estudo desenvolvido em parceria por pesquisadores da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (Esalq) da USP, em Piracicaba, da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes), da Universidade de Santiago de Compostela (Espanha) e da Universidade Federal da Bahia (UFBA).”
Segundo o estudo, o rejeito continua chegando ao estuário e o material está associado a metais pesados, que correm o risco de serem liberados no ambiente.
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Rio Doce e o pouco que foi feito até agora
“A Fundação Renova contabiliza um pagamento de R$ 1,2 bilhão a título de auxílios e compensações, dos quais apenas R$ 314 milhões indenizaram 7.527 pessoas por danos diversos após o rompimento. Uma média de R$ 42 mil para cada atingido. Atualmente, 10.777 famílias recebem um auxílio mensal de um salário mínimo, acrescido de 20% por dependente e do equivalente a uma cesta básica.”
“São 25.123 pessoas atingidas. Outros R$ 256 milhões foram gastos para indenizar pessoas que ficaram sem abastecimento de água devido à poluição do Rio Doce, como em Governador Valadares, maior município da bacia, com 280 mil habitantes. Ao todo, 254.288 pessoas foram indenizadas por danos decorrentes da suspensão temporária no abastecimento de água, uma média de R$ 1.006. “
Novos distritos
As obras para o novo distrito de Bento Rodrigues começaram em agosto. Devem terminar no fim de 2020. O projeto urbanístico de Paracatu de Baixo foi aprovado em setembro. Em Gesteira, o local escolhido fica a dois quilômetros das casas destruídas pela passagem da lama. Nos três anos dessa tragédia, a Renova contabilizou cerca de mil obras de recuperação de infraestruturas danificadas após o rompimento, como casas, propriedades rurais e escolas.
Trabalhos como reconstrução de pontes, cercas, currais, poços artesianos e pinguelas, contenções de taludes e encostas. Ao todo, 141,6 quilômetros de acessos foram reformados ou passaram por manutenção. E refeitos 205 quilômetros de cercamentos em propriedades rurais. Foram 101 residências e propriedades rurais reformadas, além de 26 comércios e 186 quintais e lotes.
Dezenove mortes e nenhum condenado, mais uma vergonha nacional?
“Laudo da empresa contratada para levantar quais as causas e a dinâmica de rompimento da Barragem do Fundão (veja mapa), a Cleary Gottlieb Steen & Hamilton LLP (CGSH) deixa claro que houve erros no processo construtivo do reservatório, mas que tais problemas foram atropelados por tentativas infrutíferas de contornar os problemas.”
Depende de cada um de nós. E agora, vamos à novidade do ano passado, uma tentativa de…
Acordo com a União para absolver a Samarco?
A Folha de S. Paulo de Outubro de 2017 diz que ” a mineradora Samarco defende que medidas reparatórias que tomou após sua lama de rejeitos destruir 650 Km de ecossistemas justificam a absolvição da empresa por parte dos crimes ambientais aos quais responde em ação penal.”
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Dois anos depois do rompimento da barragem obras de urgência ainda não terminaram
Prossegue a Folha: “o mar de Linhares continua proibido para pesca, e famílias lutam para serem incluídas em programa de indenização.” E mais: “previstos para estarem prontos em março de 2019, novos povoados ainda não começaram a ser construídos.”
Processo parado desde Julho, 2017
Ainda, segundo a Folha, ” o processo está parado para investigar a possibilidade de a Polícia Federal ter ultrapassado o período autorizado para escutas telefônicas de executivos da empresa…” E conclui: ” advogados da empresa tentam evitar que Samarco seja levada ao tribunal do júri, conforme requisitado pelos procuradores.”
“Rompimento da barragem foi acidente”
Os advogados da empresa dizem que…”a Samarco tomou providências que a eximam da acusação de crimes de administração ambiental, e que o rompimento da barragem foi acidente.” Isso não é verdade porque, segundo o Estadão…
A Samarco pressionou por licença
A empresa não tem desculpa. Desde o início demonstrou sua irresponsabilidade. Matéria do Estadão, de Janeiro de 2016 diz que “a mineradora pressionou o projetista da barragem de Fundão, Joaquim Pimenta de Ávila, a emitir um documento fora das especificações na etapa inicial da construção da represa, que ruiu em Mariana.”
Samarco não alertou moradores
Apesar dos indícios de que a empresa não alertou os moradores (sobre o rompimento da barragem); de que ‘a empresa só instalou alarmes sonoros depois da tragédia’; agora a empresa diz que o rompimento de Fundão teria sido um ‘acidente’ !?
Plano de Emergência das Mineradoras
Uma das portarias do DNPM (Departamento Nacional de Produção Mineral) que define o plano de emergência para barragens diz que “cabe ao empreendedor alertar a população potencialmente afetada”.
Mineração: legislação frouxa no Brasil
A morte do Rio Doce aconteceu em razão de uma legislação frouxa, e da inexistência de fiscalização. Além da Samarco, de propriedade da Vale S.A, e da empresa anglo-australiana BHP Billiton, o Governo Federal também deveria ser punido, afinal a responsabilidade é dele. O Código de Mineração, em seu capítulo primeiro, Artigo 1º estabelece que
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compete à União administrar os recursos minerais, a indústria de produção mineral, e a distribuição, o comércio e consumo de produtos minerais
No artigo 3º, intitulado “Este Código regula” o item III é claro:
a fiscalização pelo Governo Federal, da pesquisa, da lavra, e de outros aspectos da indústria mineral
A seguir, a matéria original.
Reconstituição
O dia era 5 de Novembro de 2015. Um dia para ficar na memória. A barragem de Fundão em Mariana, MG, obra da mineradora Samarco, controlada por duas das maiores empresas do mundo, a Vale S. A, e a anglo-australiana BHP Billiton, rompeu-se espalhando lama, rejeitos de mineração e morte: 19 pessoas morreram soterradas. O estouro da barragem do Fundão é considerado o pior acidente ambiental do Brasil. Destruiu o distrito de Bento Rodrigues, a vegetação nativa, e provocou a morte do Rio Doce.
BHP Billiton e o relatório Dirty Energy
A BHP Billiton é tão famosa por sua conduta predatória que gerou um relatório alternativo, BHP Billiton Dirty Energy informando sobre a destruição de comunidades na Colômbia, Indonésia, Austrália, Papua Nova Guiné, entre outros países. Acrescente-se agora, a morte do Rio Doce.
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Conclusão do inquérito da Samarco: MPF denuncia 21 gestores da empresa
Em Outubro de 2016, quase um ano depois da tragédia, finalmente o inquérito chegou ao seu final. O “MPF denunciou 21 gestores e conselheiros, e quatro empresas pela tragédia de Mariana”
A represa vinha apresentando problemas de infiltração desde que entrou em funcionamento, em 2008. Um recuo construído na ombreira esquerda da estrutura para tentar amenizar os problemas acabou contribuindo para o desastre.
O massacre de inocentes
Com a tragédia de Mariana, pela primeira vez o Brasil assistiu, praticamente ao vivo, e completamente atônito, o simultâneo massacre de inocentes, e o fim de um corpo d’água que serpenteava por 853 quilômetros, desde Minas Gerais, até despejar suas águas no Atlântico, no Espirito Santo. Não é fácil matar um corpo d’água como o Rio Doce. A Samarco conseguiu.
55 milhões de metros cúbicos de lama: enxurrada mortal provocada pela Samarco
Se antes o rio semeava a vida por onde a geografia fê-lo passar, agora, depois do avanço da enxurrada de 55 milhões de metros cúbicos de lama, deixou a morte.
Ibama não aceitou plano de recuperação Ambiental
Uma das obrigações da Samarco, depois da tragédia, foi apresentar um plano de recuperação ambiental para todo o vale do Rio Doce. Mas ela mostrou plano tão ruim que não foi aceito. Segundo o Ibama, o que a Samarco apresentou era..
…de caráter genérico e superficial, sem considerar o imenso volume de informações produzidas e disponíveis até o momento, além de apresentar pouca fundamentação metodológica e científica…
Desastre de Mariana, o maior acidente com barragens do mundo
De acordo com estudo da Bowker Associates, “Collapsed dam the largest accident of the kind in 100 years,” o desastre de Mariana “é o maior desastre do gênero, da história mundial nos últimos 100 anos”. A empresa norte-americana orçou os custos do desastre em US$ 5,2 bilhões.
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Mais uma baixaria, em dezembro de 2017
Foi a troca do Superintendente do IBAMA/MG, um cargo técnico cujo titular vinha fazendo um bom trabalho. Por ingerência política ele foi trocado, o que gerou uma carta de repúdio que o pessoal do Ibama encaminhou ao site Mar Sem Fim.
O vídeo reconstitui a baixaria desde o nascimento:
(foto de abertura: You Tube)