Reserva Extrativista de Cururupu: cerca de quatro mil pessoas dependem dela no Maranhão
Reserva Extrativista de Cururupu: ENTENDA
Área utilizada por populações extrativistas tradicionais, cuja subsistência baseia-se no extrativismo e, complementarmente, na agricultura de subsistência e na criação de animais de pequeno porte. Sua criação visa a proteger os meios de vida e a cultura dessas populações, assegurando o uso sustentável dos recursos naturais da unidade. As populações que vivem nessas unidades possuem contrato de concessão de direito real de uso, tendo em vista que a área é de domínio público. A visitação pública é permitida.
CARACTERÍSTICAS
BIOMA: Marinho Costeiro
ÁREA: 186.053,87 hectares
LOCALIZAÇÃO: Municípios de Cururupu e Serrano do Maranhão, Maranhão
DIPLOMA LEGAL DE CRIAÇÃO: Dec s/nº de 02 de junho de 2004
Tipo: uso sustentável
Plano de manejo: a UC não tem Plano de Manejo
Dificuldades na organização da viagem à Reserva Extrativista de Cururupu
Durante mais de um mês negociamos nossa visita com o chefe da Unidade. Dezenas de correios foram enviados através de nossa produtora, Regina Dalva Faria. Muitos ficaram sem resposta por bom tempo. Regina, então, recorreu ao Coordenador Regional, quando finalmente o diálogo foi estabelecido. Uma hora o chefe não podia nos receber, noutra, as datas oferecidas eram distantes demais. Finalmente conseguimos marcar mas, pela primeira vez nesta série, o chefe não estaria presente. Alegando tarefas mais importantes, e inadiáveis, Eduardo Castro Menezes designou uma conselheira para nos acompanhar, Mary Jane, secretária de meio ambiente do município de Cururupu, e conselheira da Resex. A esta altura já estávamos terminando as gravações no estado do Pará mas, como eu não queria deixar de visitar todas as Unidades de Conservação federais, voltamos para trás, alugamos um barco, e passamos uma semana no Maranhão explorando mais esta UC.
Reserva Extrativista de Cururupu: uma das maiores UCs da costa brasileira
Esta é uma das maiores Reservas Extrativistas do litoral brasileiro, com quase 190 mil hectares. É difícil conhecê-la por inteiro, não só pelo tamanho, mas também pela grande distância da costa de parte de suas áreas. Em seus domínios estão diversos rios e ilhas, entre elas a dos Lençóis, por exemplo, onde existe a maior concentração de pessoas albinas do mundo. Seria preciso dormir nestas ilhas, levando comida para a equipe do Mar Sem Fim e acompanhantes, além de muito combustível para o barco que alugamos. Ou seja, para conhecer toda a área teríamos que organizar uma complexa viagem, envolvendo custos altos e demandando muito tempo.
Para não atrasar demais a veiculação dos programas pela Cultura, decidi visitar apenas a porção mais próxima de Cururupu. Em viagem anterior já estive na bela e curiosa ilha dos Lençóis (parte do arquipélago de Maiaú), e nas comunidades de Guajerutiua, Bate Vento e Valha-me Deus, que fazem parte da Resex. Desta vez eu conheceria outras, onde nunca estive antes.
Cururupu – um dos mais importantes centros de construção de barcos tradicionais
Apesar de estarem com os dias contados, o Brasil é recordista em embarcações tradicionais ainda em uso. Há vários centros de construção espalhados pelo litoral mas, talvez, o mais importante seja o do município de Cururupu.
Sempre quis conhecer. Sou tão fã destes barcos que escrevi um livro sobre eles. Faltava a oportunidade que surgiu com esta série de documentários. Como a Reserva Extrativista de Cururupu não tem barcos, alugamos um bote proa-de-risco, um dos muitos modelos de embarcações típicas do Maranhão. Nele ficamos por três dias, tempo que durou nossa rápida exploração.
Comunidades visitadas na Reserva Extrativista de Cururupu
Estivemos na ilha de Mangunça (uma das 13 ilhas que fazem parte da Resex), onde mora a comunidade de mesmo nome, visitamos Peru, a menor de todas, e São Lucas, uma das três maiores. Finalmente, estivemos na comunidade de Caçacoeira, em seguida retornamos para Cururupu.
Pesca na Reserva Extrativista de Cururupu
Apesar de ter um manguezal espetacular (dos 187 mil hectares da unidade, 107 mil são formados pelo mangue), os inscritos na Resex são basicamente pescadores de peixes e camarão. Em Cururupu não há a tradicional catação de caranguejos, em compensação o município é o maior produtor de pescado do estado.
Essa talvez seja a maior diferença entre esta, e as Resex do Pará. Aparentemente o pescado continua farto em Cururupu, muito provavelmente em razão da grande extensão do manguezal. De acordo com dados do ICMBio, “a UC possui dentro de seus limites, a maior área de manguezais preservados dentro das unidades de uso sustentável do Brasil”.
Reserva Extrativista de Cururupu – problemas
Já os problemas apontados são os mesmos de sempre: falta fiscalização, óbvio, como fiscalizar a imensa área sem barcos, e com apenas um funcionário na resex, o próprio gestor?
Outros problemas são a falta de regularização fundiária, o esgoto não tratado despejado nos rios, e a falta de coleta de lixo, normalmente queimado ou enterrado (veja conclusão sobre os problemas apontados por estudo da SBPC).
A avifauna da Resex de Cururupu
Tão espetacular como o manguezal que forma a UC são os diversos tipos de aves, nativas ou migratórias, que frequentam a área. Entre as nativas, além de várias espécies de gaviões, há as garças, bem-te-vis, martim-pescadores, socós, mas, sobretudo, os lindos Guarás.
Apesar de já terem sido dizimados por pescadores, para se tornarem iscas de peixes, atualmente parece que são deixados em paz. Foi nesta UC que vi a maior quantidade de guarás em toda a costa brasileira. A cada milha surgia um ponto vermelho: um guará voando à frente do barco. Depois de cada curva, nas margens, uma árvore vermelha, coberta destas aves, nos lembrava as árvores de Natal.
Entre as aves migratórias o destaque foram os maçaricos que voam desde o Alasca, até os confins da América do Sul, sempre parando na área da UC para se alimentarem. Observamos diversas “nuvens” de maçaricos “dançando” de um lado para o outro. Foi maravilhoso. Só vi coisa parecida no Parque Nacional da Lagoa do Peixe, no litoral do Rio Grande do Sul.
As drogas entrando nas Unidades de Conservação do país
Este talvez seja o mais novo problema de muitas UCs do litoral: as drogas, com a mais potente delas, o crack, entrando com facilidade nas comunidades nativas e atingindo, não só adultos mas, especialmente, jovens e crianças.
Durante esta série de documentários ouvi relatos dos problemas causados pelo crack em diversas Unidades de Conservação, desde o Rio Grande do Sul, até o Maranhão por enquanto (ainda falta visitarmos as últimas UCs federais marinhas, no Amapá).
A explicação para o fenômeno seria a ausência da polícia nestes lugares ermos, e a vida extremamente difícil e dura dos pescadores artesanais . Não é fácil enfrentar os humores do tempo em pequenos e rústicos barcos; além disso há a fome, o frio, a umidade, e a falta de políticas públicas. Simultaneamente, a informação chega todos os dias via a televisão.
Por menores e mais pobres que sejam as comunidades, em todas existe a televisão. Mais de um gestor, e diversos líderes comunitários, relataram os problemas causados pela TV com suas programações apelando para o consumo, os modismos, “as facilidades” e a “sofisticação” dos brasileiros que moram nos grandes centros.
Esta enxurrada de informações, em pleno sertão, mexe com a cabeça das pessoas. E faz mal. Provoca revolta, inveja, desejos que antes sequer eram imaginados. A fuga para a situação seria a droga barata e mortal: o crack.
A paisagem e os barcos típicos
Não sei que adjetivos usar para descrever o cenário. A paisagem é fenomenal. As árvores do mangue são imensas, algumas com 30 metros de altura. Suas copas gigantescas têm um colorido vivo, rude, e abrigam uma quantidade, parece que infinita, de aves. Não se vê todas elas, mas ouve-se claramente seus piados. O conjunto passa a sensação de que você é o primeiro a chegar…Um espetáculo que dificilmente vou esquecer.
Quando se encontra o ser humano, nova surpresa. Os moradores destes furos manejam apetrechos de pesca, pesados e toscos, como se fossem brinquedos. Outros governam embarcações que parecem saídas dos relatos de viajantes dos séculos 18 e 19. Valeu a pena ter esperado tanto para conhecer Cururupu e seus arredores. O único problema foi a falta do gestor. Sem ele por perto, perguntas e dúvidas ficaram sem resposta.
“Trabalho escravo”, problema comum em algumas Resex da região Norte
Coloquei entre aspas porque não é exatamente a “escravidão” no sentido da servidão eterna, mas uma profunda e injusta dependência dos atravessadores. Assim como no Pará, os pescadores da resex de Cururupu não vendem o pescado diretamente ao consumidor, dependem de atravessadores. São eles que determinam o preço do pescado, transportam e vendem nos grandes centros. Quando os pescadores precisam dinheiro vivo para compras, emprestam dos atravessadores que emitem ‘vales’, a exemplo do que faziam os ‘barões da borracha’, tornando-os dependentes, com dívidas difíceis de serem quitadas. Em resumo, eles se tornam reféns.
Já abordei o assunto no texto sobre a Resex Gurupi Piriá, provocado pela própria gestora, Cláudia Alves, que mencionou a expressão durante uma entrevista. Até então eu não atinava sobre o problema.
Mas, tanto é verdade, que o gestor da Resex Tracuateua, Paulo Henrique de Oliveira, promove feiras com certa constância, de modo que os usuários da Resex que ele comanda possam vender diretamente aos clientes, evitando o problema.
SERVIÇOS
Não há restrições para visitar as Resex. Mais informações: COORDENAÇÃO REGIONAL / VINCULAÇÃO: CR4 – Belém
ENDEREÇO / CIDADE / UF / CEP: Rua das Hortas nº 223, Centro – São Luís/MA Cep: 65.020-270
TELEFONE: (98) 3221-4167
Assista ao documentário que produzimos durante a visita à Reserva Extrativista Cururupu