Querida Luana Piovani, o litoral agradece a polêmica com Neymar
Querida Luana: fiquei encantado e surpreso ao ver você jogando luz sobre a maior ameaça à zona costeira. Sua atitude, Luana, é um exemplo para outras pessoas com a mesma projeção. Há tempos escrevo sobre os malefícios da especulação imobiliária. Ela ignora a legislação ambiental, ocupa topos e encostas de morros onde antes havia mata atlântica. Dunas, falésias, restingas, manguezais e até costões, todos protegidos e muitos deles berçários, são extirpados ou deformados para sempre. Com a especulação, chega uma multidão de peões da construção civil que não têm onde morar se não nas periferias das praias, muitas vezes em locais de risco. Sem infraestrutura adequada e com saneamento básico precário, a poluição dos rios e do mar se intensifica. Finalmente, a beleza cênica, protegida por todas as Constituições desde 1937, que levou eras para se formar é obliterada, ‘cancelada’; em seu lugar, o venenoso concreto armado. 
Página do Instagram de Luana Piovani.
Saiba o que é a PEC 39/2011
O deputado federal Arnaldo Jordy, natural do Pará e membro do PPS em 2011, é o autor desta PEC cujo relator na Câmara dos Deputados foi Alceu Moreira (MDB-RS). Guarde bem este nome. Em breve você saberá o motivo. Atualmente, Jordy atua como deputado federal pelo Cidadania. Em fevereiro de 2022, sua emenda passou na Câmara dos Deputados, quase despercebida pelo grande público.
Em seguida, a emenda seguiu para o Senado. O relator foi Flávio Bolsonaro (PL), e a PEC ficou conhecida como ‘PEC das praias’. A proposta, caso passe, transfere para os Estados e municípios a propriedade, sem ônus, dos terrenos de marinha que hoje pertencem à União.
Os terrenos de marinha são de propriedade da União que, entretanto, permite o uso privado mediante o pagamento de taxas. Estes terrenos são importantíssimos para proteger o vulnerável litoral justamente agora quando a zona costeira é ainda mais fustigada pelos eventos extremos, o aumento do nível do mar, e a incompetência da maioria dos prefeitos de municípios costeiros em enfrentar o aquecimento global. Se o Senado deixar passar esta matéria, ou ‘boiada’, será um crime de lesa-pátria.
O governo estima que existam entre 500 a 600 mil imóveis no País classificados como terrenos de marinha. Contudo, segundo a Folha de S. Paulo, ‘a partir do Censo de 2022, a Secretaria de Patrimônio da União estima estima que 2,9 milhões de imóveis estejam em terrenos de marinha, mas apenas 565 mil deles estão cadastrados’. Caso a proposta passe, o governo federal terá dois anos para efetivar as transferências. Permanecem sob controle da União os locais não ocupados, as Unidades de Conservação – que são poucas – as concessões portuárias e de patrimônio histórico.
Projeto de lei que regulariza os jogos de azar prevê que a União deverá transferir os terrenos de marinha
Quando a PEC dos terrenos de marinha foi enviada ao Congresso havia outro projeto de lei para regularizar os jogos de azar no Brasil. Quem é o autor deste projeto? Ninguém menos que o deputado federal Alceu Moreira (MDB-RS), o mesmo que relatou a PEC das praias.
Alceu Moreira cuidou de prever, no texto da proposta que regulariza os jogos de azar, que a União deverá transferir o domínio pleno desses terrenos de forma gratuita para estados, municípios ou habitantes de baixa renda (como vilas de pescadores). Moreira afirmou que as duas propostas não têm nenhuma relação.
Cassinos, hotéis, condomínios, e os famigerados resorts
O pessoal dos hotéis, condomínios, e os famigerados resorts, adorou. A Associação Brasileira dos Resorts declarou que ‘a proposta vai beneficiar a todos’.
Ou seja, quem está por trás da PEC é setor dos jogos de azar, seu poderoso lobby, e os políticos favoráveis a esta atividade. A ideia deste grupo seria aproveitar a beleza do litoral brasileiro para enchê-lo de cassinos, e assim atrair ainda mais público. Imagine, também, o quanto ganhariam as indústrias da construção civil e do turismo.
Felizmente, há pessoas de bom senso no Congresso Nacional que não concordam com a PEC porque sabem que ela vai impulsionar a especulação. Além disso, a PEC vai premiar quem ocupou irregularmente áreas de preservação, como bem disse o deputado Nilo Tatto (PT/SP).
A privatização definitiva do litoral do País
Segundo o g1, ‘O ministro da Economia, Paulo Guedes, afirmou em 19 de outubro (2022) que não tem intenção de vender praias brasileiras. O objetivo seria transferir ao setor privado apenas terrenos da marinha no litoral brasileiro.’
Apenas…? E o que dizer do parecer da SPU na época da aprovação na Câmara, que alertava para ‘os efeitos deletérios da PEC sobre o patrimônio da União já que o valor das áreas envolvidas poderia chegar a R$ 1 trilhão’, como mostra a Folha?
Outra questão no mínimo ‘estranha’ também é apontada pelo jornal. ‘O texto prevê a cessão onerosa das áreas, ou seja, os ocupantes serão obrigados a comprar a parcela da União no terreno de marinha. Na prática, porém, a PEC não prevê sanções ou condutas em caso de não pagamento —em outras palavras, o governo pode levar um calote sem ter meios para cobrar os valores devidos’.
Neymar, com seus 28 empreendimentos planejados, trouxe o tema de volta ao debate.
O jogador anunciou, em parceria com a incorporadora DUE e outros sócios, um mega projeto no litoral nordestino: a Rota DUE Caribe Brasileiro. O investimento, estimado em R$ 7,5 bilhões, pretende transformar praias paradisíacas de Pernambuco e Alagoas em destino de luxo, com empreendimentos de alto padrão voltados para o mercado de segunda residência.
Em maio de 2024, Luana Piovani criticou Neymar por apoiar a PEC das praias, que propõe transferir terrenos de marinha para pessoas físicas e jurídicas, e por seu envolvimento no projeto imobiliário ‘Rota DUE Caribe Brasileiro’, na costa do Nordeste, associado à proposta. As críticas resultaram em um embate público: Neymar respondeu às acusações, enquanto a atriz o chamou de ‘mau caráter’ e ‘péssimo cidadão
Abaixo-assinado nas redes sociais
Saiba que há um abaixo-assinado contra a PEC das praias circulando nas redes sociais. Caso você queira participar, clique aqui.
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