Plástico 100% biodegradável, realidade cada vez mais próxima
Cena comum no Brasil: um cidadão comprando pão na padaria. O atendente coloca o pão dentro de um saco de papel. Não bastasse essa proteção para o transporte, coloca o saco de papel dentro de uma sacola. De plástico, claro. A dupla embalagem é necessária? Não. Mas a humanidade está na era do consumo exagerado. Consumir plástico sem necessidade é um desastre para o meio ambiente. Descartá-lo inadequadamente é ainda pior. Enquanto isso, vai poluindo a terra. Afogando rios e oceanos. Matando peixes. E o ser humano está comendo plástico sem saber. Por tudo isso o plástico 100% biodegradável é mais que bem-vindo.
A busca pelo plástico 100% biodegradável
Felizmente, há muitos cientistas nas universidades em busca do plástico 100% biodegradável. E estudantes secundaristas também. Há ainda pesquisas sendo desenvolvidas em empresas engajadas com a economia circular. O Laboratório de Engenharia de Alimentos (LEA) da Escola Politécnica (Poli) da Universidade de São Paulo (USP) é um deles. Há mais de dez anos, pesquisadoras do LEA se dedicam a encontrar alternativas biodegradáveis para substituir o plástico convencional de embalagens e filmes. As principais linhas estão focadas no desenvolvimento de matérias-primas de origem vegetal e de resíduos agroindustriais. Algumas dessas pesquisas estão em estágio bem avançado.
Filme maleável produzido à base de mandioca
Entre as apostas do LEA, está um filme maleável produzido a partir de amido de mandioca. “Um dos nossos principais desafios era desenvolver um filme biodegradável resistente e maleável para embalagens, que pudesse ser produzido em larga escala e por um preço competitivo em comparação ao plástico derivado do petróleo”, disse a professora da Poli, Carmen Cecilia Tadini, ao Jornal da USP. Ela coordena o LEA. Também é diretora de Transferência de Tecnologia do Centro de Pesquisa em Alimentos (Food Research Center – FoRC), que colabora no financiamento dos estudos.
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O principal desafio para a industrialização já foi superado. O biopolímero à base de amido de mandioca venceu as altas temperaturas necessárias ao processo de extrusão: não se degradou. “Estamos muito perto de resolver toda a equação. Falta agora estabilizar a função da antocianina no processo e fazer os testes de biodegradabilidade. Trata-se de uma inovação disruptiva, ainda não existem tecnologias que resultem em um filme maleável, 100% biodegradável, e comercialmente viável.”
Plástico híbrido feito de amido de resíduos agroindustriais
Já a química Bianca Chieregato Maniglia, pesquisadora do FoRC e da Poli, desenvolveu um filme plástico híbrido. A fórmula mistura polipropileno, derivado do petróleo, com amido presente em resíduos agroindustriais de babaçu, urucum e cúrcuma. “O objetivo é manter as propriedades do polipropileno e deixar esse material parcialmente biodegradável, reduzindo em 30%, 40% o lixo descartado. O material feito com as proporções de 70% de polipropileno e 30% de biopolímero já mostrou que tem condições de competir com o plástico convencional”, afirma.
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Vantagens do plástico híbrido
O plástico híbrido agrega outras vantagens, diz a pesquisadora. Recicla resíduos agroindustriais, que hoje são descartados. Babaçu, urucum e cúrcuma podem ser cultivados em várias regiões. É produzido em parte por fontes renováveis – o petróleo não é. A matéria-prima é barata. Não compete com o setor alimentício, uma vez que o produto é feito a partir de resíduos. “E ainda contém composição interessante com a presença de ativos antioxidantes.”
Biopolímeros da USP são embalagens ativas e inteligentes
Esses biopolímeros em desenvolvimento na USP carregam outras inovações. São, na verdade, embalagens ativas e inteligentes. Podem prolongar a vida dos alimentos e detectar “processos de deterioração, oscilações de temperatura sofridas no armazenamento ou até indicar, pela mudança da cor, se uma fruta está madura para o consumo”. “No processo de deterioração, esses alimentos liberam amônia e o pH do meio fica mais básico. Ao reagir à mudança de pH, a antocianina muda de cor”, explica a aluna de mestrado em engenheira de Alimentos Thaís Dale Vedove.
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No México, a pesquisadora Sandra Pascoe, da Universidade Atemajac Valley, em Guadalajara, segue no mesmo rumo das cientistas brasileiras. Ela está desenvolvendo um plástico biodegradável à base de nopal. É uma espécie de cacto, típico da região. Ele é tão abundante no México que foi transformado em símbolo do país. Está no escudo mexicano. E, em breve, poderá estar nas sacolinhas e canudinhos. A cientista explica que o biopolímero é uma mistura do suco da polpa do nopal com aditivos não tóxicos.
México endurece regras para uso de plásticos
A ideia é utilizar a matéria-prima para fabricar alguns tipos de plásticos descartáveis e de uso único. O México tem endurecido as regras para uso de plásticos (você saiba que a África lidera o banimento de plástico?). Os de uso único não biodegradáveis serão proibidos a partir de janeiro de 2020. As malfadadas sacolinhas estão entre eles. Canudinhos também. Sandra espera patentear o produto ainda neste ano. E busca interessados na fabricação em escala. O que poderá envolver a transferência da tecnologia que está criando, afirma.
Filme feito de cascas de sobras de frutos do mar
No Reino Unido, a empresa escocesa da área de biotecnologia CuanTec está desenvolvendo um filme para embalagens de alimentos. Biodegradável também. A pesquisa está centrada em cascas de sobras de processamento de frutos do mar, especialmente lagostim. Batizado de Chitin, o biopolímero é resultado da extração da quitina, um derivado de açúcar encontrado no esqueleto externo duro de crustáceos. O processo de extração é a fermentação. O mesmo da cerveja, por exemplo. A quitina depois é transformada em quitosana, produto mais solúvel e com múltiplas aplicações.
Biodegradável aumenta a vida útil dos alimentos
“A CuanTec é a primeira empresa a obter extração biológica de quitina a partir de casca em escala industrial e esse processo suave fornece quitina e quitosana de alta qualidade que apresentam alta eficácia contra uma ampla variedade de bactérias que deterioram alimentos. O uso da nossa quitosana aumenta a vida útil dos alimentos embalados”, informa o site da companhia. A CuanTec já apresenta no site também alguns patrocinadores, como o Scottish Investment Bank.
O exemplo secundarista que vem de Juína: fralda biodegradável
De volta ao Brasil, cinco alunos do ensino médio criaram uma fralda biodegradável com plástico feito de amido de mandioca, como na USP. Eles agora estão no último ano dos cursos técnicos de Meio Ambiente, Comércio e Agropecuária do Instituto Federal do Mato Grosso. A escola fica em Juína, distante cerca de 700 quilômetros da capital, Cuiabá. O projeto nasceu quando cursavam o primeiro ano. E veio de um desafio proposto pelo professor de história da turma, Aluísio Farias. O pai dele tem Alzheimer e precisa usar fraldas descartáveis.
Aposta na mandioca para salvar o planeta do plástico
Isso despertou no professor um incômodo em relação ao impacto ambiental de milhões de fraldas sendo jogadas no lixo diariamente mundo afora. A manta absorvente, o hidrogel e o algodão da fralda se decompõem facilmente no meio ambiente. O plástico, não. Em 2017, estimulou os alunos a desenvolver uma solução para o problema, a ser apresentada na Maratona de Células Empreendedoras. Desafio aceito, o projeto foi desenvolvido em menos de quatro meses. Eles escolheram substituir o plástico por uma solução à base de amido de mandioca, que se decompõe em seis meses no meio ambiente. A região onde vivem é rica em mandioca, daí a escolha.
Fralda com função social, ambiental e econômica
O projeto ficou em segundo lugar na Maratona. Mas não parou por aí. Os alunos Wagner Leandro Júnior, Marcos Araújo, Anderson de Brito Almeida, Mariana Sacht Nunes e Wanderson Perondi Lopes criaram então a startup Toper Bio para aperfeiçoar a invenção. “A fralda está sendo melhorada, para que cumpra com sua função social, ambiental e econômica da maneira mais eficiente possível. Estamos fazendo alguns testes para comprovar cada vez mais a viabilidade do nosso produto. Alguns pequenos ajustes para melhorar conforto, comodidade e absorção, por exemplo. Para que possamos incluir a fralda no mercado o mais rápido possível”, diz Lopes.
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Bioplástico já está sendo patenteado
Estão aprendendo cada vez mais sobre empreendedorismo também. Recebem o apoio da instituição onde estudam. São acompanhados ainda pelos professores Farias, doutor em história, e Ansselmo Ferreira dos Santos, doutor em agronomia. O produto, afirma Lopes, está em processo de patenteamento. Não há uma data para a conclusão. “No momento, existe um número grande de interessados em investir no projeto”, diz. Mas os estudantes aguardam o registro da patente para fechar uma parceria mais concreta.
Plástico 100% biodegradável, fontes: https://jornal.usp.br/ciencias/ciencias-ambientais/cientistas-brasileiras-desenvolvem-embalagens-biodegradaveis-ativas-e-inteligentes/; https://jornal.usp.br/ciencias/ciencias-ambientais/usp-produz-plastico-100-biodegradavel-com-residuos-da-agroindustria/; https://oglobo.globo.com/sociedade/mexicana-cria-plastico-biodegradavel-feito-de-cacto-para-substituir-sacolas-23860869;https://oglobo.globo.com/sociedade/mexicana-cria-plastico-biodegradavel-feito-de-cacto-para-substituir-sacolas-23860869; https://www.hypeness.com.br/2019/07/empresa-cria-embalagens-biodegradaveis-feitas-a-partir-de-cascas-de-mariscos-descartadas/; https://www.talkingretail.com/news/industry-news/waitrose-works-packaging-made-langoustine-shells-09-04-2019/; https://www.cuantec.com/;http://conexaoplaneta.com.br/blog/estudantes-do-mato-grosso-criam-fralda-biodegradavel-com-amido-de-mandioca/; https://www.facebook.com/toperbio/.