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Laje de Santos, Alcatrazes e ESEC Tupinambás

Laje de Santos, Alcatrazes e ESEC Tupinambás

Desde que me propus a fazer a nova série de documentários mostrando as Unidades de Conservação federais da zona costeira pensei em incluir nos programas algumas áreas que não têm esta chancela mas, por um motivo ou outro, merecem ser mostradas ao público. Algumas porque deveriam há muito ser transformadas em UCs federais dada sua extrema biodiversidade. Um deles é a laje de Santos, um parque estadual marinho.

Laje de Santos, Alcatrazes e ESEC de Tupinambás
Calhaus e, ao fundo, a Laje de Santos.

Laje de Santos, Alcatrazes e ESEC Tupinambás: Laje de Santos

Agora gravando em São Paulo chegou a vez de duas outras: a Laje de Santos, um Parque Estadual Marinho, portanto uma UC estadual, e  o arquipélago dos Alcatrazes, transformado em UC federal em 2016 por Michel Temer. São casos distintos. O que me inspirou a mostrar a Laje de Santos é o sucesso que este parque conseguiu atraindo milhares de mergulhadores de observação ao mesmo tempo em que a pesca foi proibida.

Parque Estadual da Laje de Santos.

Mergulho autônomo na Laje de Santos

Os mergulhadores que vão para a Laje quase todos os fins de semana (de 4 a 5 mil por ano) pagam uma taxa que é revertida para a ajuda da manutenção da própria UC estadual.  Assista aqui ao documentário que gravamos na Laje de Santos.

Outro ângulo da Laje de Santos.

Mais uma visão da Laje

As ondas na laje de Santos

Alcatrazes e sua sina

A visita à Laje de Santos serve como contraponto. Já Alcatrazes teve pior sina: o arquipélago, um dos mais bonitos e ricos em biodiversidade da costa brasileira, foi escolhido pela Marinha do Brasil, nos anos 80, como alvo para os canhões de seus navios. A situação, entretanto, mudou em 2016 no governo Temer.

Não foi a única: Jorge Greco, Queimada Grande e Laje de Santos (há pouco tempo foi encontrada uma bomba) também receberam este castigo no passado.

Espetacular vista de Alcatrazes.

Ambientalistas lutam por Alcatrazes

Há mais de 20 anos ambientalistas lutam para acabar com este massacre. Entre eles cito o biólogo Fausto Pires de Campos, da Fundação Florestal de São Paulo.

Ele não está sozinho na batalha. Felizmente há dezenas de outros, como Kelen Luciana Leite Ferreira (responsável pela UC Estação Ecológica Tupinambás), e até analistas ambientais do ICMBio.

Laje de Santos, Alcatrazes e ESEC Tupinambás. Biodiversidade, plantas e animais endêmicos, viraram pó depois do incêndio provocado pelo bombardeio.

Incêndio provocado pela Marinha do Brasil

Veja como ficou o Saco do Funil depois de incêndio provocado por tiros de canhão em novembro de 2004 (houve outros em 1990, 1998 e 2007).

Bomba no saco do Funil.
Prejuízo quase total no Saco do Funil.
Laje de Santos, Alcatrazes e ESEC Tupinambás. Mais uma…
Laje de Santos, Alcatrazes e ESEC Tupinambás. O Saco do Funil, hoje regenerado.

Histórico da luta ambientalista por Alcatrazes

Valeu a pena a insistência. Em 1991 os defensores de Alcatrazes, entre eles Judith Cortesão, médica e bióloga, que faleceu em 2007, e que está na origem do Projeto Alcatrazes; Priscila Siqueira que fez a primeira denúncia dos bombardeios em 1986 no Estadão; Antonio Carlos d’Ávila fotógrafo e veterano da Antártica, falecido em 1997, Roberto Bandeira e Wilson Langeani Filho, atual presidente da SDLB, entre outros.

O bote do ICMBio chegando na Ilha Paredão.
Laje de Santos, Alcatrazes e ESEC Tupinambás. Geraldo saltando para o Paredão.

Todos contra o bombardeio em Alcatrazes

Por este motivo escolhi Alcatrazes como o primeiro programa da série anterior, Mar Sem Fim, no ar entre 2005 e 2007. Minha intenção foi chamar a atenção para este absurdo bombardeio.

Repito a dose na segunda temporada, Mar Sem Fim – Revisitando a Costa Brasileira, com a mesma intenção: dar mais esta pequena contribuição à causa.

Finalmente, em agosto de 2016 Alcatrazes se torna Revis. Temer assina o decreto. Termina em sucesso a luta dos ambientalistas.

Começa a escalada…

Em agosto, e início de setembro, visitei a Laje de Santos e Alcatrazes. Na viagem para a Laje estavam a bordo o Chefe da UC, José Edmilson Mello Jr, mais conhecido como Junior, acompanhado pelo biólogo Felipe Augusto, ambos funcionários da Fundação Florestal de São Paulo.

Infelizmente não foi o dia ideal. O mar estava agitado em razão de recente frente fria. Em vez dos habituais 25 metros de visibilidade encontrei apenas seis, sete, metros. Mesmo assim no mergulho que fiz na Laje de Santos, e filmei, foi possível mostrar tartarugas, cobras marinhas, e vários tipos de peixes entre eles o badejo, o peixe-anjo, peixe-palhaço, e dezenas de outros.

Laje de Santos, Alcatrazes e ESEC Tupinambás. Com muito esforço, e ajuda de um cabo, o cinegrafista João Nunes inicia a subida.

Semana passada estive em Alcatrazes com Fausto Pires de Campos, novamente Felipe Augusto, e ainda nos encontramos com o pessoal do ICMBio, Geraldo Ottoni Neto e Thais Farias Rodrigues, ambos analistas ambientais da ESEC Tupinambás. Esta é mais uma UC Federal que estava na lista dos programas desde o início.

O analista ambiental da ESEC, Geraldo, recolhe dados da estação meteorológica.

ESEC Tupinambás

A Estação Ecológica de Tupinambás é formada pelas outras ilhas do arquipélago entre elas a Ilha do Paredão, a Laje de mesmo nome, a Ilha da Sapata e a do Oratório, o Parcel de Nordeste (ou do Alagado), e ainda mais duas Lajes: a do Pescador, e a da Gaivota, infelizmente também chamados pela Marinha do Brasil como “alvos oito, e nove”. Você adivinhou: a Marinha também bombardeia estas duas ilhotas.

Laje de Santos, Alcatrazes e ESEC Tupinambás. Atobá-måe, preocupada, vigia o ninho…

Mamãe atobá preocupada…

Lá embaixo seu filhote estava desprotegido…

Ilha do Paredão, parte da ESEC Tupinambás

No primeiro dia eu e o cinegrafista João Nunes subimos na ilha do Paredão acompanhados por Geraldo e um de seus ajudantes. Eles iriam colher dados da estação meteorológica recém instalada no topo da ilha.

Não foi fácil. Tivemos que escalar um imenso paredão com inclinação alucinante que quase nos mata pelo esforço e também, porque não, pelo medo de escorregarmos e nos esborracharmos no mar. Deu frio na barriga mas valeu a pena. A vista de cima é a mais bonita que já vi no litoral do Brasil.

Laje de Santos, Alcatrazes e ESEC Tupinambás. A volta foi menos difícil…

Na volta, já tarde, escolhemos um ponto no Portinho onde fundeamos o Mar Sem Fim. Estávamos com lotação esgotada a bordo. Além do cinegrafista, do Fausto e do Felipe, também dormiram a bordo os quatro funcionários da ESEC Tupinambás que foram nos encontrar num bote do ICMBio. Junto com os marinheiros do Mar Sem Fim formamos um grupo de 10 pessoas.

Laje de Santos, Alcatrazes e ESEC Tupinambás. Mar Sem Fim III. Logo mais começaria o perrengue.

O dia já ia embora. Preparei um belo jantar, conversamos sobre o programa do dia seguinte, descer em Alcatrazes com Fausto, e fomos dormir tranquilos. O tempo estava bom. Estava…

Tempo feio de madrugada

Às 03h30 da manhã fui acordado por uma onda que entrou pela vigia do banheiro. Fazia calor na cabine. Deixei a vigia aberta…De repente ouvi uma pancada no costado seguida pelo tradicional “chuuuááá”.

A pancada era parte da onda que bateu no costado, e o “chuá”, respingos da onda comprimida pela pequena abertura da vigia. Eles atingiram minha cama com incrível pressão. Levantei de um salto e quase caí. O Mar Sem Fim jogava de um lado para o outro com tremenda força. Era difícil ficar em pé.

Olhando em volta o pandemônio

Corri para o comando onde já estava Alonso (imediato) olhando em volta o pandemônio. Segundos depois, um a um, os outros tripulantes e convidados acordaram e vieram ver o que acontecia. Aliás não dava pra ver nada.

Escuridão total. Alonso explicou que um Sudoeste havia entrado com muita força, seguido imediatamente depois por um tremendo Nordeste que nos pegava de lado, daí o jogo insistente do barco. Nas rajadas o Nordeste deve ter batido nos 35, 40 nós…

Em segundos os dois marinheiros da lancha do ICMBio, extremamente safos, saltaram para o barquinho amarrado a contrabordo do Mar Sem  Fim.

Enquanto isto, eu no comando pedia ao Manoel (marinheiro) que fosse à proa puxar o ferro. Não valia a pena ficar naquele lugar perigosamente perto do costão de Alcatrazes. Nestes casos o melhor a fazer é se afastar de qualquer obstáculo e capear mar afora até que a situação volte ao normal.

Começamos a faina

Nosso ferro pesa 120 quilos e a corrente tem a grossura do meu braço. Pesada à beça! Com os dois radares ligados eu não tirava os olhos da tela para saber a distância que estávamos do costão já que não enxergava um palmo adiante.

Até porque, no meio daquela algazarra, alguém havia ligado as luzes da cabine, da proa, e dos corredores laterais do barco o que impedia qualquer visão.

Tudo que eu fazia era acelerar devagar para fora

Tudo que eu fazia era acelerar devagar para fora, mesmo com o ferro ainda n’água, enquanto pedia aos outros para desligarem todas as luzes.

O barco é novo, ainda não temos decorados onde ficam os interruptores. Todos tentavam ajudar apertando botões em vão: as luzes continuavam acesas.

Nesta hora o guincho para de funcionar

Desgraça! Justo agora? Será que travou? Foram alguns segundos de tensão até que sugeri ao Alonso checar a chave geral. Ela poderia ter caído com o esforço.

Foi isto! Alonso ligou a chave e o guincho voltou a funcionar. Ainda com o barco jogando de um lado pro outro sobe  Thais, assustada, e pergunta ao amigo: “Ei, Geraldo, fala sério, nós vamos morrer hoje?”

Ela não tinha experiência prévia em barcos… estava muito nervosa. Foi cômico. Momentos depois o ferro estava em cima. Naveguei para mar aberto onde ficamos capeando até às seis da manhã.

Foi o primeiro perrengue no novo barco

Mas não será o único, tenho certeza. A tensão se foi. Lá fora, com ondas de 2 a 3 metros de altura, o Mar Sem Fim enfiava a cara n’água, mas navegava com total segurança. O barco é marinheiro. Um espetáculo!

Acordei por volta das 10 horas da manhã. Subi para a sala. Vários companheiros já estavam acordados limpando a bagunça. Pena, pensei, com o mar mexido o mergulho que pretendia fazer estava condenado.

A visibilidade, normalmente estupenda em Alcatrazes, estaria comprometida. Mesmo assim ainda tentamos continuar as gravações.

Laje de Santos, Alcatrazes e ESEC Tupinambás. O Sudoeste aperta…

Mas não seria desta vez. Logo depois voltou o Sudoeste. Mudamos para o Saco do Funil que protege as embarcações contra este vento.

Se o Sudoeste diminuísse ainda seria possível desembarcar. Mas, ao contrário, ele aumentou. Fomos obrigados a suspender as gravações. Navegamos para Ilhabela com vento a favor. O Mar Sem Fim surfava a 10, 11 nós, quando sua velocidade de cruzeiro é de apenas 9 nós.

A ponta sul de Alcatrazes.

Não foi desta vez que conseguimos encerrar estes programas. Voltaremos em breve. Enquanto isto parto ainda esta semana, de carro, para gravar mais dois programas.

Laje de Santos, Alcatrazes e ESEC Tupinambás. Se prevalecer o bom senso em breve esta beleza será mais um Parque Nacional Marinho.

Na volta, com o barco pronto, sigo para o Rio de Janeiro. No caminho paro em Alcatrazes para terminar estes programas.

Parque Nacional do Cabo Orange, divisa Norte do Brasil

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