Núcleo União Pró Tietê completa 25 anos
Núcleo União Pró Tietê: a ONU confirma diagnóstico do artigo abaixo, em relatório publicado pelo Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA) que destacou os avanços na despoluição do Tietê, em São Paulo, nas últimas décadas, mas afirmou que o rio “continua altamente poluído” e que sua recuperação requer investimentos de longo prazo.
Artigo de João Lara Mesquita, publicado em agosto de 2016, na página dois, do Estadão.
Núcleo União Pró Tietê comemora 25 anos em agosto
A história que vou contar é abusada de bons exemplos. Um súbito espaço de grandeza envolvendo milhares de pessoas. Grandes empresarios, politicos, estudantes, artistas, gente pobre e humilde deram-se as mãos.
Aconteceu em São Paulo, e resultou em extraordinária vitória da opinião pública ou, como preferem publicitários, “um case”, como dizem polidamente em ingles. Eu, na época diretor da Eldorado, tive o privilégio de viver os bastidores deste raro acontecimento.
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Foi assim: estávamos lançando a Nova Eldorado AM, eu acabava de contratar um chefe de redação, Marco Antônio Gomes. Pedi que evitasse pautas repetitivas. ‘Minha rádio’ não seria mais uma a ‘requentar notícia de jornal’. Pouco depois, uma lista de reportagens foi apresentada. Uma, sobressaiu pela ousadia. A ideia era demonstrar, de forma criativa, a importância de praticar cidadania. Estávamos havia cinco anos da redemocratização. Era 1990, nossa democracia engatinhava. De lambuja, o programa tinha uma pegada ecológica que atiçaria o brio de São Paulo.
BBC, Eldorado; Tâmisa e Tietê
“Encontro de rios” foi ao ar em agosto de 1990, com distintos objetivos: reforçar o credo que a sociedade tem o direito de pressionar seus governantes; e lembrar o público, então encantado com a novidade do movimento ambiental, que debaixo de nossos narizes havia uma vergonha.
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Foi um programa bem pensado. Uma equipe da BBC, com quem tínhamos parceria, navegaria pelo Tâmisa, enquanto uma dupla de repórteres da Eldorado faria o mesmo no Tietê. E trocariam informações.
Durante as três horas de transmissão, o reporter da BBC contou de protestos dos londrinos que, desde o século 19, apelidaram o Tâmisa de ‘ O Grande Fedor’. E relembrou seguidos protestos, até o governo inglês começar o longo trabalho de despoluição.
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Enquanto isso, desviando de ilhas de lixo do Tietê, os repórteres Rosely Tardelli e Antônio Sabino descreviam cenas macabras: animais mortos bioando, o cheiro fétido que emanava do rio; o aspecto gelatinoso da água, de tão pegajoso, dificultava o avanço do barco. E o improvável aconteceu. O recado, subliminar, foi amplamente assimilado: dependeria de nós.
Começa a insana reação
Nas semanas seguintes eu passava os dias, atônito, atendendo ouvintes que “queriam participar da campanha”. Ligavam, mandavam faxes, iam pessoalmente à emissora. O movimento, que tinha tudo para murchar, inflou. Em 23 de Setembro o Estadão deu em manchete: “ Campanha por rio ganha a cidade”. Em qualquer lugar o assunto era um só: como fomos capazes de tamanha degradação.
SOS Mata Atlântica abraça a causa do Tietê
Senti a força que pairava no ar, e corri a pedir ajuda. A mais respeitada ONG, a SOS Mata Atlântica, era presidida por meu irmão, Rodrigo Lara Mesquita. Procurei-o. Eu não entendia de despoluição, mas não podia perder aquele momento mágico, de união por uma causa justa. Rodrigo convocou João Paulo Capobianco, que ouviu meu relato e pediu tempo.
US 350.000,00 mil dólares para o Núcleo União Pró Tietê- na época, maior doação já feita à causa ambiental
Dias depois ele apresentou o plano: criariam um núcleo, com equipe própria para cuidar do rio. Mas eu tinha que arranjar o dinheiro que o financiasse por três anos até que, com vida própria, alcançasse capacidade de sobrevivência. Demorou. Mas um ano depois consegui U$ 350 mil dólares, do Unibanco, que quitavam a conta. Foi a maior doação para a causa ambiental até então. À esta altura, o sonho dos ouvintes se tornara de todos.
Capobianco chamou um biólogo para chefiar o Núcleo,“um craque em mobilização”. Seu nome, Mário Mantovani. O Núcleo União Pro- Tietê foi apresentado em Agosto de 1991, agitando. Reuniões em praça pública, palestras, shows musicais em benefício da causa, projetos de educação ambiental. A campanha pegava fogo. A garotada da redação, em primeiro emprego, se extasiava com a repercussão.
Convocando a população
Um abaixo assinado começou a correr, ideia de Mantovani, e surpreendeu outra vez. Empresas, entidades de classe, funcionários públicos, escolas, passavam as listas entre seus pares. Em 1993, com um milhão e duzentas mil assinaturas, e 124 volumes, ele foi entregue ao governador do estado, Antônio Fleury.
Fleury cria o Projeto Tietê, e tenta se aproveitar do movimento
O governo respondeu criando o Projeto Tietê, e iniciando reformas na estação de tratamento de esgotos de Barueri. Para aproveitar, Fleury dizia que o rio ficaria limpo em seu governo, o que era desmentido pelo Núcleo. Obra desta magnitude não se presta à demagogia. Exige tempo, e muito investimento.
Mário Covas, eleito, “assume” o Projeto Tietê
Em 1995 Mário Covas foi eleito. E o recado da opinião pública, respeitado; assim, pela primeira vez na história uma obra iniciada em governo anterior teve continuidade. Covas revisou o projeto, criou três fases. A primeira, para a construção e manutenção de estações de tratamento. Na segunda, seriam feitos gigantescos interceptores para levar o esgoto até as estações; e coletores troncos para levar o esgoto dos bairros aos interceptores. Na terceira, interligariam as casas aos coletores troncos. E investiu pesadamente. Covas deixou o governo em razão de um câncer em 2001. Assumiu o vice, Geraldo Alkmin, e mais uma vez a obra prosseguiu.
Núcleo União Pró Tietê, 25 anos de serviços prestados
Passados 25 anos, o Núcleo está vivo, praticando cidadania; fiscalizando, cobrando o governo.
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Mais de US 3,5 bilhões de dólares, na maior obra de saneamento já feita no Brasil, 19 mi de pessoas atingidas
Mais de US 3,5 bilhões de dólares foram investidos, na maior obra de saneamento já feita no país. A mancha de poluição recuou 160 Km. Chegava em Barra Bonita, a 260 Km de São Paulo. Está em Salto, a 100 Km da capital. E a região metropolitana atingiu 90% de coleta de esgotos, melhorando a vida de 19 milhões de pessoas.
Núcleo União Pró Tietê: falta muito ainda
Ainda há muito a fazer. A Sabesp calcula outros 25 anos de trabalho. E aponta o lixo jogado nas ruas, ligações clandestinas, poluição, fezes de cachorros, e bitucas atiradas nas ruas, como problemas a serem eliminados. Ainda nos falta educação.
Rádio Eldorado, ‘a rádio Cidadã
Mas o programa da Eldorado gerou a maior obra de saneamento jamais feita no Brasil. E uma competente ONG, o Núcleo União Pró Tietê.
Parabéns, pelos 25 anos, Núcleo União Pró Tietê; e viva! aos ouvintes da Nova Eldorado AM.
Que o sonho que vivemos siga inspirando.