Litoral Norte de São Paulo, especulação de novo?
Litoral norte de São Paulo. O segundo ‘round’ agora envolve empresa imobiliária de Guilherme Afif Domingos. Ele é administrador de empresas, empresário, político filiado ao PSD, e diretor-presidente do Sebrae (Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas). Afif também é proprietário da empresa Sundays Participações Ltda e KPB Empreendimento Imobiliário SPE LTDA, que pretende construir o Condomínio Praia da Baleia.
Litoral Norte de São Paulo: a área do empreendimento
A área do empreendimento está no entorno da APA (Área de Preservação Ambiental) Baleia/Sahy, onde a empresa prevê a construção de 50 unidades de alto padrão. Com dois pavimentos erguidos sob pilotis, mais de 17 mil m2 de área construída (inicialmente a planta previa 70 residências). A área total de Afif tem 128.651,43 mil m² e se localiza em terreno alagadiço e sujeito a inundações
A região tem dezenas de espécies da fauna e flora ameaçadas de extinção. Trata-se de um dos poucos locais com extenso fragmento florestal bem conservado, situado em Zona de Amortecimento do Parque Estadual da Serra do Mar.
Instituto Conservação Costeira
As obras foram embargadas numa ação civil pública movida pelo Ministério Público do Estado de São Paulo, depois de denúncia da ONG Instituto Conservação Costeira comandada pela advogada Fernanda Carbonelli. As empresas foram condenadas pelo Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, ocasião em que tiveram o licenciamento ambiental emitido pela Cetesb (Companhia Ambiental do Estado de São Paulo) e autorização concedida pelo Graprohab (Grupo de Análise e Aprovação de Projetos Habitacionais do Estado de São Paulo) anulados judicialmente.
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Suspeitas de favorecimento político. Guilherme Afif Domingos à época ocupava os cargos de vice-governador do Estado de São Paulo (2011/2014) e ministro-chefe da Secretaria da Micro e Pequena Empresa do governo Dilma Rosself (2013/2015). A ação hoje em grau de recurso, afirma que “chega a causar inquietação no espírito o tratamento diferenciado dado ao empreendimento do Sr. Guilherme Afif Domingos, numa área em que oito empreendimentos foram indeferidos”. E sem as mesmas “benesses” do caso do ex-Ministro, afirma o 13º Procurador de Justiça José Carlos de Freitas da procuradoria de Justiça de Interesses Difusos e Coletivos.
O Instituto Conservação Costeira tomou conhecimento da nova tentativa de aprovação do empreendimento em dezembro do ano passado. Fernanda Carbonelli explica:
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As empresas requereram a renovação de licenças que FORAM ANULADAS judicialmente. Não se pode renovar atos que o Poder Judiciário declarou NULOS. Eles agiram de má-fé, inovando sua saga e utilizando-se do mesmo ‘modos operandi’, pedindo a renovação do certificado perante o Graprohab, visando revalidar o certificado emitido em 2011, justamente o que havia sido anulado judicialmente”.
Agora é preciso aguardar o recurso da empresa de Guilherme Afif Domingos. E, como se verá abaixo, não será fácil. A área é cobiçada por várias imobiliárias, todas com passado suspeito. Pendenga longa. Torcemos pelo sucesso da ação de Fernanda Carbonelli.
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O empresário, político filiado ao PSD, Guilherme Afif Domingos foi contatado pelo site Mar Sem Fim e respondeu (abaixo) ao questionamento…
Sobre o empreendimento estar no entorno da área protegida:
Afif Domingos: “Parte do imóvel está inserida na área delimitada da APA Sahy – Baleia, mas o local onde serão implantadas as obras do empreendimento está totalmente fora da área da APA e não está sujeita a inundações. Isto foi atestado por um estudo hídrico de ciclos sazonais, exigido na sentença judicial e auditado pela Cetesb, e que consistiu no monitoramento do nível do lençol freático e de alagamentos relevantes em potencial durante as quatro estações do ano.
Projeto prevê casas suspensas sobre pilotis
Não obstante este estudo, que foi uma precaução adicional, o projeto prevê casas suspensas sobre pilotis para evitar a impermeabilização do solo e garantir a sobrevivência das espécies arbóreas. A implantação do condomínio preservará intacta a vegetação que cobre 80% dos 128 mil m2 de terreno, sendo que nos 20% restantes será feita a implantação das casas e do viário, que seguirá uma geometria orgânica e integrada com as árvores remanescentes, fazendo deste o empreendimento mais sustentável e com menor impacto ambiental da região.”
Tréplica da advogada Fernanda Carbonelli:
Não é verdade, o laudo do ministério público, do ICC e a certidão da prefeitura mostram que o empreendimento toma 57 porcento da área da apa. Talvez o empreendedor não saiba mas a apa foi ampliada para 4 milhões de m2 em dezembro de 2016, por meio da lei municipal 2474/2016.
Sobre espécies da fauna e flora ameaçadas
Resposta de Afif Domingos: “Há espécies ameaçadas catalogadas na região, mas nenhuma na área de construção do empreendimento.”
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Tréplica de Fernanda:
Não é verdade, o empreendimento adentra na apa e ameaça diversas espécies, está cristalino no laudo..
Sobre o embargo das obras…
Resposta de Afif: “Como as obras não foram iniciadas, não se pode falar em embargo das obras. O Ministério Público questionou o licenciamento do empreendimento por meio de Ação Civil Pública. A ação foi julgada, teve sentença publicada em 2015 e decretou o cancelamento das licenças devido à falta de estudos hídricos por parte das empresas, mas deu a elas o direito de apresentar tais estudos e de revalidar as licenças (depois de comprovada a viabilidade técnica).”
Tréplica de Fernanda Carbonelli:
O empreendedor ainda não foi intimado do novo procedimento, e refere-se apenas a ação judicial que hoje está no STJ.
Sobre favorecimento político…
Afif: “A alegação de possível favorecimento político não fez parte da Ação Civil Pública que cancelou as licenças. Isso foi explorado pelo Ministério Público a fim de abrir nova Ação Civil Pública, que não foi aceita pelo Judiciário. Nos últimos dez anos, dezenas de empreendimentos foram licenciados e implantados na região, incluindo na Praia da Baleia.”
Tréplica de Fernanda Carbonelli:
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Sim os empreendimentos que eram viáveis, com Licença ambiental, mas nenhum deles aprovou nada na área da apa como este caso específico.
Sobre a renovação de licenças que FORAM ANULADAS judicialmente…
Afif: “Não existe má-fé por parte das empreendedoras, pois elas estão cumprindo fielmente a sentença judicial na apresentação de estudos complementares. A revalidação das licenças não está sendo feita por meio de recursos e sim de complementação de estudos técnicos, conforme definido em sentença judicial.”
Tréplica:
Está sendo revalidada licença que foi anulada judicialmente.
O julgamento do leitor sobre o Litoral Norte de São Paulo
Bem, nossa parte (do site) foi feita. Ouvimos os dois lados. Agora é preciso que os interessados se informem e tomem posição. A seguir o texto original da matéria, e o primeiro round…
Zoneamento Ecológico-Econômico do Litoral Norte de SP
A seguir, a matéria original explica como foi o primeiro ‘round’ desta batalha.
O ZEE (Zoneamento Ecológico-Econômico) do litoral Norte de São Paulo foi votado pelo CONSEMA – Conselho Estadual do Meio Ambiente, em dezembro de 2016. Em seguida foi publicado no Diário Oficial. E aguardou a sanção do governador até novembro de 2017. Foram seis anos de muito trabalho, discussões, e audiências públicas, visando garantir o desenvolvimento sustentável. Até que duas imobiliárias reagiram…
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ALEMOA e MAFISAN, de passado nebuloso, entram com recurso
Ambas empresas, além da Aldeia Empreendimentos Imobiliários Ltda., proprietárias na Barra do Una e praia do Engenho, litoral Norte de São Paulo, ingressaram com ações judiciais (11/11/2016) que visam modificar o zoneamento restritivo de suas propriedades, de Zona Terrestre 02, para Zona Z4- OD. Em consequência, pediram a anulação do processo de votação, paralisando o Zoneamento Ecológico Econômico do Litoral Norte (até que Alckmin o assinasse).
Em 21/12/2016 as empresas conseguiram uma concessão da tutela, suspendendo a reunião do CONSEMA, para que fossem supridas as supostas falhas apontadas no procedimento. Esta liminar foi cassada pelo Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo na mesma data, após recurso da Fazenda Pública. O Ministério Público se manifestou, e determinou o indeferimento do pedido liminar das imobiliárias.
Histórico da Alemoa, acusada de criar búfalos no entorno da Serra do Mar
A Alemoa S.A. Imóveis e Participações é de Santos tem passado nebuloso. Entre os negócios em que atua está a locação e negociação de imóveis em condomínios no Litoral Norte de SP, com destaque para a região da Barra do Una e Praia do Engenho. Seus proprietários são o brasileiro João Maria P. D ‘Orey, e o português João José M. Meixa Santos.
O nome da empresa está sujo. Ela foi denunciada por danos ambientais em uma área no interior da Terra Indígena Guarani Ribeirão Silveira, em São Sebastião. Acusada por manter uma criação irregular de búfalos com o objetivo de impedir a regeneração da mata e, com isso, viabilizar a implementação de empreendimento imobiliário. A área está situada nas imediações do Parque Estadual da Serra do Mar, classificada como zona de amortecimento, destinada à atenuação dos efeitos de fatores externos à unidade de conservação. Funai, Fundação Florestal e a Companhia Ambiental do Estado de São Paulo (Cetesb) emitiram pareceres pela imediata remoção dos búfalos.
Histórico da Mafisan, cujo dono também é acusado pelos búfalos no Litoral Norte de São Paulo
A Mafisan Empreendimentos Imobiliários também é uma das fortes de Santos, de propriedade do português radicado naquela cidade, João Frederico F.M.M. Santos. Fundada em 2007, sua atividade principal é incorporação de empreendimentos imobiliários.
João Frederico Feijão Monteiro Mexia Santos também é sócio da
Zona Terrestre 02, saiba o que é
Nestas áreas há a incidência de APPs (Áreas de Proteção Permanente), e vegetação em estado de regeneração avançado. A meta mínima de conservação é de 80 a 90% das zonas com cobertura ambiental nativa, garantindo a diversidade biológica das espécies.
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Zona Z4- OD, saiba o que é
Áreas que permitem condomínios, desde que não tenham incidência de vegetação nem APPs (Áreas de Preservação Permanente). Uso de no máximo 30% da área, com preservação ambiental de 70%.
Laudo do Gerco (Gerenciamento Costeiro) indica que além da flora típica há mais de 327 espécies de aves, algumas ameaçadas de extinção; e de animais que correm mesmo risco.
Consequências da paralisação do ZEE
A ação bloqueia temas importantes como regularização fundiária, ocupação e organização do espaço territorial e marítimo do litoral, práticas com relação à agricultura e pesca. E pior, contribui para a especulação imobiliária, chaga de todo o litoral brasileiro.
O Litoral norte de São Paulo já tem problemas demais. Poluição de condomínios e mansões de ricos que não ligam seus encanamentos à rede coletora é uma delas. Não precisava mais um…
A reação
O Instituto Conservação Costeira, titular de um assento nas discussões do Grupo Setorial, e responsável pela interposição de diversas medidas em prol do meio ambiente e da conservação do litoral, ingressou em setembro de 2016 com pedido para ser habilitado como “Amicus curiae” (amigo da corte), trazendo novas provas que podem mudar o rumo da decisão judicial que bloqueia o Gerenciamento Costeiro. Segundo documento do ICC, a advogada Fernanda Carbonelli afirma que
o procedimento que as empreendedoras pretendem ver anulados seguiu o rito legal, e o resultado foi um processo participativo, que envolveu reuniões públicas com distintos segmentos sociais, assim como a vinculação do Gerenciamento Costeiro com os princípios e diretrizes estabelecidas pela legislação federal e estadual. Não havendo, portanto, nulidades que possam paralisar um processo que cuidará do futuro do Litoral Norte
Contra-reação: primeiro round é nosso
Deu certo. O Juiz de direito Marcelo Sérgio, da segunda Vara da Fazenda Pública disse em seu despacho que “as Autoras (as três empresas acima citadas) ajuizaram a presente medida cautelar, objetivando, provisoriamente, suspender apenas pelo prazo de três meses os trâmites do processo administrativo (PA no 5051/2010) e a promulgação do decreto revisor, para que seja possível a realização e a conclusão da perícia judicial.”
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Empresas perdem primeira batalha na Justiça
E finaliza o Juiz de Direito Marcelo Sérgio: “…com estes fundamentos, julgo improcedente a pretensão cautelar e condeno as Autoras ao pagamento das custas e despesas processuais bem como honorários advocatícios em 10% do valor atualizado atribuído à causa.”
Novidades sobre estes dois processos
As empresas recorreram ao TJ em um dos processos. No outro as empresas além de quererem a mudança de toda área como Z4; atacam, denigrem e pediram, contra o Instituto Conservação Costeira, o valor de 400 mil reais.
Este é o preço que uma entidade tem que pagar por denunciar e exigir o cumprimento da lei. Lamentável, isso inibe cada vez mais a fortificação da sociedade civil.
A batalha pela preservação do Litoral Norte de São Paulo ainda não terminou
Ganharam, no primeiro ‘round’, aqueles que pretendem preservar o litoral Norte. É preciso que a mobilização continue até que o processo seja finalizado. Vale a pena lutar por nossos direitos.
FONTES: http://waves.terra.com.br; http://www.icc.eco.br/. oeco.org.br; infoplex.com.br; novaimprensa.com/; consultasocio.com; jusbrasil.com.br.