COP29, no Azerbaijão, ‘cheira à gasolina’
Ao ler o New York Times de 12 de novembro, em matéria de David Gelles, achei o jornalista brilhante ao sintetizar o que esperar da COP29 no Azerbaijão que, como ele diz, ‘tem a difícil tarefa de afastar o mundo dos combustíveis fósseis, numa altura em que o mundo queima quantidades recordes de petróleo, gás e carvão’. ‘A COP cheira à gasolina’, disse ele. Concordo. E não tenho nenhuma expectativa positiva, especialmente depois da eleição de Donald Trump. O mais provável é que o segundo maior emissor de gases de efeito estufa, e país mais rico do mundo, se retire uma vez mais do Acordo de Paris.
E ainda sofreremos a ‘onda Trump’, que mal começou e já temos um Javier Milei ordenando a retirada da delegação argentina da cúpula da ONU.
Enquanto isso o secretário-geral da ONU Antonio Guterrez, espécie de ermitão entre os mandatários, adverte que ‘o tempo não está do nosso lado. É quase certo que 2024 será o ano mais quente já registrado e uma aula magistral de destruição do clima’.
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“Estamos devastados por ver uma segunda presidência Trump”
A frase entre aspas é da matéria do Times, e refere-se ao que disse o ativista Jacob Johns. Lembre-se, pela força que exerce no mundo, tudo o que os Estados Unidos fazem tem repercussão mundial.
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O autor adianta o que podemos esperar: ‘Para além de se retirar dos tratados existentes, espera-se que a administração Trump expanda a produção de combustíveis fósseis, revogue os regulamentos que limitam a poluição e reduza os incentivos à energia limpa’.
‘Azerbaijão quer melhorar sua imagem sem abrir mão do petróleo’
Mudando para a Europa, o título agora é do Le Monde (11/11). ‘Ao sediar a COP29 de 11 a 22 de novembro, o Azerbaijão se prepara para um teste de sinceridade perante um júri internacional, que permanece cético. Apesar de enfrentar riscos climáticos graves, a nação de 10 milhões de pessoas confiou nos dois pilares do petróleo e do gás do Mar Cáspio, desde sua independência em 1991. Os hidrocarbonetos são responsáveis por 92% de suas exportações’.
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Tundra do Ártico emite mais carbono do que absorveVanuatu leva falha global em emissões à HaiaO plâncton ‘não sobreviverá às mudanças do clima’Le Monde lembra que o Azerbaijão também se notabilizou pela monopolização do poder pela família do ‘presidente’, Ilham Aliyev, há 31 anos. ‘A restauração contundente de sua integridade territorial em 2020’, diz, ‘veio à custa de um banho de sangue em 2020. E culminou em 2023 com o êxodo brutal de 100 mil armênios de Nagorno-Karabakh’.
O jornal ressaltou uma declaração de Ahmad Alili, diretor do Centro de Análise de Políticas do Cáucaso, um think-tank baseado em Baku: Para o Azerbaijão, a COP29 também é uma oportunidade para fazer negócios. Esta iniciativa (organização da COP) terá, naturalmente, desdobramentos econômicos. Baku está mais do que feliz em apresentar oportunidades regionais’.
A agência de notícias Reuters abre sua matéria explorando o objetivo da COP29, ‘a principal tarefa para quase 200 países na cúpula da ONU é mediar um acordo que garanta até trilhões de dólares em financiamento para projetos em todo o mundo’.
Países ricos contribuirão com US$ 100 bilhões de dólares?
A agência citou o objetivo de 2009, quando os países ricos se comprometeram com US$ 100 bilhões de dólares para ajudar as nações em desenvolvimento durante a transição para energia limpa e a se adaptar às condições de um mundo em aquecimento.
Segundo a Reuters, os EUA forneceram quase US$ 10 bilhões em financiamento climático internacional no ano passado. Mas isso é menos do que a contribuição de US$ 31 bilhões da União Europeia, completou.
Resumindo o humor mundial, a vitória de Trump ofuscou as negociações da COP29 por ele não acreditar no aquecimento, e provavelmente interromperá as contribuições financeiras dos EUA.
Mesmo sem a vitória de Trump já seria difícil conseguir um consenso. Nas reuniões preparatórias desta COP não houve nem sombra de acordo. As partes discordam sobre quem deve pagar, quanto deve ser pago, quais formas o financiamento deve ter e como os fundos devem ser acessados. Em outras palavras, só toparam se reunir em Baku.
O tom sombrio da cobertura é generalizado. Poderia ser diferente? Não creio. Agora, como a COP29, a segunda das três COPs, destina-se a colocar as contribuições na mesa para permitir uma resposta à altura do desafio, seu fracasso quase certo pode eclipsar a próxima, a COP30, em Belém, no ano que vem.
COP30 em Belém tem tudo para ser um vexame internacional
Melhor que seja assim do que passarmos vexame. Se a COP30 tiver a importância das demais, espera-se que entre 50, a 80 mil pessoas, se desloquem para Belém, entre delegações, empresas, ONGs, jornalistas, ativistas, etc.
Entretanto, a cidade, apesar de ter um lindo patrimônio histórico, reflete o abandono da Amazônia desde sempre pelo Estado. Assim, a primeira edição da conferência em uma cidade no “coração da Amazônia”, como alardeou Lula, tem tudo para ser um vexame internacional. Ideia de Jerico, sugerir Belém…
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O índice de saneamento básico do município é um dos 20 piores do Brasil, segundo o IBGE. Belém não tem hotéis para receber este mundo de gente, não tem transporte público, a coleta de lixo é precária. Na realidade, existe uma falta generalizada de prestação de serviços de qualidade para atender entre 50 até 80 mil estrangeiros.
Quando estive em Belém em 2005, duas coisas me incomodaram profundamente. Uma delas foi testemunhar meninas de 12, 13 anos no máximo, se oferecendo para turistas; outra, com todo respeito ao povo do município, foi o cheiro forte de urina nas praças públicas. Lembro especialmente de sentir náuseas quando visitei o lindíssimo Teatro da Paz, herança do período da borracha.
O papel do Brasil na COP29
Por falar em Brasil, encerramos este breve relato repercutindo as críticas depois de apresentado o novo plano do clima. Marina Silva oficializou a contribuição nacional para a redução dos gases estufa, NDC. O País se comprometeu a diminuir as emissões entre 59% e 67% em relação a 2005, além da promessa anterior de desmatamento zero em 2030.
Internamente, a nova meta foi muito criticada por não estar em linha com o 1,5ºC a mais de temperatura até o fim do século, meta estabelecida pelo acordo de Paris.
Também não se sabe como o Brasil atingirá este resultado. Explicar os detalhes, o passo a passo da proposta, será tarefa do vice Geraldo Alckmin que lidera a comitiva brasileira.